Etanol é ‘antídoto’ em casos de intoxicação por metanol; entenda o tratamento
Médico explica que tratamento deve ser feito apenas em ambiente hospitalar, e não se trata de ingerir bebidas alcoólicas
O etanol pode ser utilizado como antídoto em casos de intoxicação por metanol, competindo com ele na metabolização para evitar a formação de substâncias tóxicas, mas o tratamento deve ser realizado em ambiente hospitalar com supervisão médica.
Os recentes casos de intoxicação por metanol em São Paulo e a internação do rapper Hungria em Brasília chamaram a atenção para um tipo de tratamento que pode parecer inusitado: a aplicação controlada de etanol nos pacientes, em ambiente hospitalar. O método, que já salvou muitas vidas, é usado em situações de emergência para evitar que o metanol cause um estrago ainda maior no organismo, mas não consiste na ingestão de bebidas alcoólicas.
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Segundo o médico clínico e cirurgião geral Marcelo Bechara, especialista em medicina preventiva e hormonologia, o metanol em si não é um veneno direto. “Mas quando ele chega ao fígado, ele se transforma por uma enzima chamada álcool desidrogenase em ácido fórmico, e esse causa intoxicação grave, levando à cegueira, insuficiência renal e até morte”, explica.
“O etanol entra em cena competindo com o metanol nessa mesma enzima. Como a enzima prefere metabolizar o etanol, o metanol fica de lado e acaba sendo eliminado sem virar uma toxina perigosa”, esclarece.
O antídoto mais moderno e considerado padrão internacional é o fomepizol, uma medicação intravenosa mais segura e de fácil manejo. No entanto, como o remédio não está amplamente disponível no Brasil, o etanol ainda é o recurso mais usado por ser mais barato e igualmente eficaz. “Ele atua como um antídoto competitivo. Em vez de deixar o metanol se transformar no veneno, ocupa a via metabólica primeiro e protege o organismo”, afirma Bechara.
Tratamento deve ser feito em ambiente hospitalar
Apesar de sua eficácia, especialistas ressaltam que o procedimento deve ser realizado apenas em ambiente hospitalar, com monitoramento constante. Isso porque a dosagem precisa ser calculada de forma precisa e o etanol usado é puro, sem as impurezas presentes em bebidas alcoólicas comuns. “Não dá para a gente chegar ao paciente e dar bebida alcoólica para ele tomar para eliminar a toxidez”, alerta Bechara.
Em casos mais graves, o tratamento pode incluir também hemodiálise, para retirar rapidamente o metanol e seus metabólitos do sangue, além da administração de vitaminas como ácido fólico ou folínico, que ajudam a acelerar a eliminação do ácido fórmico. “O tratamento sempre é um conjunto de medidas: etanol ou fomepizol, correção da acidose, vitaminas e, quando indicado, diálise”, completa o médico.
Sintomas exigem atenção
O avanço da adulteração de bebidas reacendeu o alerta das autoridades de saúde. Diferente da ressaca comum, os sintomas da intoxicação por metanol costumam aparecer de 12 a 24 horas após o consumo. Entre os sinais estão visão embaçada, dor abdominal intensa, confusão mental, náuseas e, nos casos mais graves, cegueira irreversível.
Para especialistas, qualquer suspeita deve ser tratada como emergência médica. “Se após 12 horas a pessoa ainda apresentar sinais de embriaguez, alterações visuais ou confusão mental, não deve atribuir apenas à ressaca. É fundamental procurar imediatamente um pronto-socorro”, afirma o endocrinologista Ramon Marcelino, do Hospital das Clínicas da USP.
A recomendação das autoridades é reduzir ao máximo o consumo de álcool até que os casos sejam controlados. Para quem ainda assim optar por consumir, a orientação é evitar bebidas de origem duvidosa, especialmente vendidas em ruas e festas sem fiscalização, e priorizar produtos lacrados adquiridos em estabelecimentos com registro sanitário.

