Todos os anos, o centro de Franco da Rocha alaga. Não raro, áreas ocupadas enfrentam deslizamentos, como em 2022, quando fortes chuvas causaram 18 mortes. Para completar, o município tem a última área preservada de Cerrado na região metropolitana de São Paulo, um bioma onde incêndios acontecem naturalmente.
É esse cenário que a prefeita Lorena Oliveira enfrenta quando se discute resiliência climática e ações de prevenção, contou ela, durante o painel 'Cidades preparadas: adaptando-se às mudanças climáticas', parte da programação do Cidade CSC, principal evento de cidades inteligentes da América Latina.
"Nós precisamos lembrar que os riscos das mudanças climáticas não são só ambientais, são socioambientais, e há um recorte econômico, as pessoas mais pobres são as que mais correm risco", disse Lorena. No centro, contou ela, a população mais rica estabeleceu estratégias para lidar com os alagamentos. Nas encostas, não há alternativa.
Sem radares meteorológicos próprios, Franco da Rocha depende de cooperação com outros municípios para ter acesso a informações importantes, além de preparar uma licitação em consórcio com outros municípios para adquirir um equipamento próprio. Além disso, começou a instalar sirenes de alerta para avisar a população no caso de riscos. "Não é o ideal, mas nos auxilia", afirmou a prefeita.
Em Petrópolis, a situação é ainda mais delicada. A cidade concentra alguns dos piores desastres climáticos brasileiros, como os deslizamentos de 2022 que causaram 243 mortos. Desde então, o foco da administração municipal tem mudado para priorizar iniciativas de prevenção.
Na época, sem radares adequados, o tempo de aviso antes de um evento climático extremo era de dez minutos. Na expectativa de receber um radar meteorológico mais moderno, o prefeito Hingo Hammes contou que este tempo deve se expandir para quatro horas.
"Investir em prevenção é uma obrigação de qualquer ente público e nós temos tido ajuda estadual e federal nesse sentido", afirmou Higon. Ele defendeu, inclusive, que os municípios estabeleçam um orçamento vinculado para isso, algo que já é lei em Petrópolis a partir de um projeto que o próprio Higon apresentou quando era vereador.
Hoje, 2% do orçamento da cidade deve ser investido em prevenção de desastres. Para 2025, a cidade também recebeu R$70 milhões do governo federal destinado à obras de contenção de encostas.
O valor faz parte de uma nova iniciativa do Ministério das Cidades, o Periferia Via, vinculado à Secretaria Nacional de Periferias do Ministério. A partir de uma lógica de que justiça climática se faz combatendo desigualdades sociais, a Secretaria tem uma série de projetos que já resultaram no investimento de R$3.7 bilhões em contenções de encostas e R$12 bilhões em urbanizações de favela.
"Nós temos uma estratégia que envolve planos de redução de risco, adaptação climática e soluções baseadas na natureza", explicou Daniela Buosi, assessora do secretário Nacional de Periferias. Há uma iniciativa chamada Planos Municipais para Redução de Risco (PMRR), por exemplo. A expectativa é fazer 200 destes até 2027. Hoje, 30 estão em execução e outros 120 já foram planejados.
Também há os Plano Comunitário de Redução de Riscos e Adaptação Climática (PCRA), que convidam a comunidade a repensar o espaço e encontrar soluções. "São eles, afinal, que conhecem melhor aquele espaço", afirmou Daniela. O importante, diz ela, é ir além do concreto nas encostas e pensar no conforto das pessoas e em obras equilibradas com concreto e verde.
Em Franco da Rocha, há um esforço para tornar isto realidade. A prefeita Lorena Oliveira contou que em um conjunto de servidores do município fez uma pós-graduação em cidades resilientes a partir de uma parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). O projeto de conclusão de um deles foi justamente uma contenção de encostas feitas com bambu.
Já em Petrópolis, parte do Morro da Oficina, epicentro do desastre de 2022, foi reflorestada, uma estratégia tanto para aumentar a permeabilidade da região quanto para impedir a reocupação irregular de áreas críticas.
Em uma infeliz coincidência, dois exemplos que se encaixam no conceito por trás da ideia de cidades esponja, criado pelo arquiteto chinês Kongjian Yu, morto em um acidente aéreo nesta semana no Mato Grosso do Sul.