Substituição de trabalhadores humanos por IA causará colapso econômico, diz vencedor do Nobel

Geoffrey Hinton, considerado um dos "padrinhos da IA", deu previsão pessimista em evento realizado em Washington

1 dez 2025 - 19h12

No dia 19 de novembro de 2025, a Universidade de Georgetown, em Washington, recebeu uma conversa pública entre o senador Bernie Sanders e o cientista da computação vencedor do prêmio Nobel Geoffrey Hinton, considerado um dos "padrinhos da IA". O evento, realizado no auditório Gaston Hall e organizado pelo Instituto de Políticas e Serviços Públicos, discutiu os efeitos sociais e econômicos da inteligência artificial e seu potencial de remodelar a força de trabalho global.

Hinton, cuja pesquisa pioneira em redes neurais lhe rendeu um Prêmio Turing em 2018, afirmou que a atual transformação tecnológica não se assemelha a revoluções anteriores. Em sua avaliação, as mudanças desta vez não abrirão novas frentes de trabalho para substituir as antigas. "As pessoas que perderem seus empregos não terão outros empregos para onde ir", disse. Em seguida, completou: "Se a IA ficar tão inteligente quanto as pessoas — ou mais inteligente — qualquer trabalho que elas possam fazer poderá ser feito pela IA".

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O cientista da computação britânico Geoffrey Hinton e o senador Bernie Sanders em evento sobre IA na Universidade de Georgetown
O cientista da computação britânico Geoffrey Hinton e o senador Bernie Sanders em evento sobre IA na Universidade de Georgetown
Foto: Divulgação/Georgetown University / Estadão

O pesquisador insistiu que grandes empresas de tecnologia já operam sob essa lógica. Como afirmou durante o debate, "esses caras estão realmente apostando que a IA vai substituir muitos trabalhadores". Ele citou serviços de atendimento ao cliente como exemplo de ocupações que, por exigirem treinamentos simples e envolverem salários baixos, são visadas como alvo inicial da automação em larga escala.

Sanders aproveitou o gancho para criticar o papel de bilionários no avanço da IA, observando que pessoas como Elon Musk estão entre os principais financiadores e entusiastas dessa corrida tecnológica. Segundo o senador, esses empresários dificilmente "passam noites em claro" preocupados com trabalhadores de baixa renda. Para ele, o ponto central do debate "não é se a IA é boa ou ruim, mas quem a controla e quem se beneficia dela".

Hinton também alertou para a fragilidade do modelo econômico que acompanha essa revolução. Ele afirmou que figuras como Elon Musk, Mark Zuckerberg e Larry Ellison "não pensaram bem" no fato de que, "se os trabalhadores não forem pagos, não há ninguém para comprar seus produtos". A crítica aponta para um paradoxo: a mesma automação que promete eficiência pode corroer a própria base de consumidores do mercado.

Uma segunda parte do evento foi dedicada a perguntas de estudantes, incluindo questões sobre desinformação e deepfakes. Hinton manteve seu ceticismo: disse não acreditar que sistemas de IA conseguirão, no longo prazo, detectar falsificações produzidas pela própria IA. Como alternativa, defendeu estratégias de prevenção contra desinformação, mostrando conteúdos falsos rotulados para educar o público antes de momentos críticos, como eleições.

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No encontro, Hinton também retomou previsões que vêm preocupando a comunidade científica desde 2023. Naquele ano, ele afirmou: "Até muito recentemente, eu achava que levaria de 20 a 50 anos para termos uma IA de uso geral. E agora eu acho que pode ser 20 anos ou menos". E foi além nas projeções atuais ao declarar que modelos recentes como o GPT-5 "já sabem milhares de vezes mais do que nós".

As implicações geopolíticas também entraram na pauta. Hinton argumentou que o uso de sistemas autônomos em guerra reduziria custos políticos para países ricos, já que a ausência de baixas militares diminuiria resistência interna. "Acho que isso vai remover uma das principais barreiras para países ricos e poderosos simplesmente invadirem países pequenos como Granada", afirmou, evocando a invasão norte-americana de 1983.

No encerramento, Sanders pediu que o público manifestasse se via a IA como força positiva em suas vidas — vários levantaram a mão. Em seguida, perguntou quem estava preocupado com seus impactos — quase todos responderam afirmativamente. Hinton concordou que ainda não é possível prever com clareza o que acontecerá na próxima década, mas insistiu que a sociedade ainda tem papel decisivo na forma como a tecnologia será usada, desde que compreenda seu funcionamento e priorize o bem-estar coletivo acima do lucro imediato.

Considerado um dos maiores nomes da história da computação, Geoffrey Hinton é um dos criadores das técnicas de deep learning que sustentam os modelos modernos de IA generativa. Em 2023, ele deixou seu cargo no Google após mais de uma década na empresa, alegando preocupação com os rumos da tecnologia e afirmando que precisava ter liberdade para criticar a indústria. Na ocasião, declarou publicamente que "lamentava" partes de sua trajetória por acreditar que as IAs estavam avançando mais rápido do que a capacidade humana de controlá-las, posição que, desde então, tem reforçado em praticamente todas as suas aparições públicas.

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