Pesquisador lança livro e explica o que é “fazer o corre” na China
Gíria das quebradas descreve perfeitamente a vida do trabalhador chinês, diz um dos maiores especialistas no país asiático
Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), da Universidade Federal Fluminense (UFF) e da Universidade de Pequim, Evandro Menezes de Carvalho está lançando China: Tradição e Modernidade na Governança do País. Obra alia pesquisa científica e vivência de cinco anos.
Um dos maiores especialistas brasileiros em China, o professor e pesquisador Evandro Menezes de Carvalho, fala ao Visão do Corre sobre um tema fundamental para a cobertura das periferias: afinal, o que significa “fazer o corre” na China?
“Quem faz o corre é a massa trabalhadora que mora nos subúrbios das grandes cidades”, responde Carvalho, que morou cinco anos lá. Ele é professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Universidade Federal Fluminense (UFF) e Universidade de Língua e Cultura de Pequim.
Para o especialista, a ideia de “fazer o corre” expressa muito bem o que aconteceu e acontece com o povão chinês em subúrbios como os de Shanghai, com 25 milhões de habitantes – mais gente do que São Paulo e toda a Região Metropolitana.
Porém, do ponto de vista do corre, da labuta diária, não faltam semelhanças entre a vida em locais chineses e brasileiros: ruas estreitas, motinhos e bicicletas passando, barulho, música, gente, barracas de comida e a fumaça temperada que defuma tudo.
Como vive o povão chinês que trabalha para sobreviver?
Na China você tem uma realidade social que não se assemelha à nossa, eles tiraram 800 milhões de pessoas da extrema pobreza em 40 anos. Porém, eu posso dizer, inspirado no nome da sua editoria, que nos subúrbios é onde o chinês está no corre.
A infraestrutura de mobilidade facilita o corre do morador dos subúrbios?
A grande chave foi a mobilidade: é metrô que chega, são pistas específicas para motinha elétrica, bicicleta, ônibus. O trabalhador pode morar no subúrbio, que é mais barato, pois a estrutura da cidade ajuda.
Existem favelas na China?
Favelas como em São Paulo e no Rio de Janeiro não vai ter. O que existem são áreas de alguns bairros com resquícios de uma China desorganizada, é a história do corre: tem lojinha, venda de comida na rua, fumaça defumando tudo, botequim, uma coisa meio bagunçada. Isso se parece com o Brasil.
Cite alguns desses subúrbios chineses.
Algumas áreas de Pequim, áreas específicas Wuhan, eu circulei muito nas grandes cidades. São bairros meio acabadinhos, com motinha passando, uma vida mais modesta, com casas bem simples. As mulheres usam vestidos simples, muito mais à vontade, as pessoas conversam, fazem barulho, tem motinha passando, bicicleta. É nesses espaços que você percebe aquela China do trabalhador no corre.
O periférico brasileiro que vem para grandes cidades traz parentes, na China também?
Até onde a vista alcança um parente, é família para o Chinês. Há uma moral muito grande de apoio mútuo, é um país que passou por guerra, fome, com uma seguridade social ainda muito falha.
Em comparação com o Brasil, é melhor ser pobre na China?
É melhor do ponto de vista das condições de vida. Não é só o pobre melhorando as condições materiais. Por exemplo: hoje eles têm um conceito de desenvolvimento verde. Eu morei em Pequim, é impressionante o que tem de praça, mas é uma ralação, a turma trabalha, é o corre.
Você conta que eles reformaram os banheiros públicos.
Decidiram e reformaram rapidamente. Rapaz, você não acredita como os banheiros públicos mudaram. E não precisa pagar. Onde é que você vai encontrar isso no Brasil?