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A final do BBB23 será branca?

Edição com mais pessoas negras da história do reality mostra o quanto a questão racial ainda engatinha no Brasil

18 abr 2023 - 10h42
(atualizado às 10h47)
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Fred Nicácio reuniu integrantes negros em selfie: "Big Preto Brasil"
Fred Nicácio reuniu integrantes negros em selfie: "Big Preto Brasil"
Foto: Divulgação

O BBB23 bateu recorde de pessoas negras no programa. Pela primeira vez, tivemos metade da casa composta por negros e negras. Para muitos isso é importante, e eu concordo, mas também é triste perceber que precisou de 23 edições para que o mínimo fosse feito. Essa quantidade igualitária não foi suficiente para que participantes negros e brancos tivessem julgamentos similares dentro da casa. O que foi visto foram dois pesos e duas medidas e muitos desses pesos equivocados aconteciam quando um “brother” era negro e o outro não.

O racismo estrutural organiza as pessoas e as relações de um ponto de hierarquia, onde o indivíduo branco tem mais valor social do que o negro. Logo, a esse individuo branco é dada a possibilidade de errar, o acolhimento após o erro e a chance de se reestabelecer dentro desse ambiente. Já as pessoas negras não gozam em plenitude dessa possibilidade. Elas não podem errar, não são afagadas após erro, além de carregar o rótulo do equívoco por um longo período de tempo. Um exemplo rápido disso é como Gabriel Fop foi acolhido de imediato pelos participantes que, após intervenção do apresentador sobre seu comportamento com a Bruna, correram para falar que ele era um menino bom, de coração puro e dizer que ele não se resumia a um erro. Aqui fora seu acolhimento não foi diferente. Ele, inclusive, teve uma porcentagem menor na eliminação do que a Sarah Aline, que para muitos era a mais sensata da edição. Já participantes como Fred, Alface e Cezar foram cobrados o tempo todo pelos seus erros e foram chamados de maldosos, agressivos e coisa ainda pior.

Um dos pilares de sociedades racistas é como pessoas brancas se organizam para dar continuidade aos seus privilégios. Muitas vezes isso ocorre de maneira inconsciente. Nem eles percebem o que estão fazendo. Então, acolhem seus semelhantes, tentam invalidar a fala de uma pessoa negra por algum detalhe, se não é por algum detalhe, pela forma que determinada coisa foi dita, ou seja, mitigam os erros dos seus, enquanto buscam invalidar a dor da pessoa negra baseada no seu senso de empatia que só chega nos seus pares de raça.

Essa empatia seletiva - e orgânica - faz com que brancos e brancas se organizem sem demonstrar ao público que aquela união tem um viés racial. Não à toa, em determinado momento do programa, um quarto tinha só pessoas negras e no outro só pessoas brancas e Aline. Diferente de pessoas negras, eles não precisam verbalizar que estão se organizando, pois esse movimento  já é natural, vem do âmago. Com pessoas negras as coisas são bem diferentes. Somos socializados para acreditar no mito da democracia racial, com fascínio pela brancura e, por vezes, estamos nos subalternizando para sermos aceitos nessa redoma branca para nos sentirmos especiais.

Por toda essa complexidade que envolve pessoas negras no Brasil, a organização, muitas vezes, não é tão fluída, já que nem todas as pessoas negras têm o tal letramento racial. Aí, quando Fred Nicácio volta falando, ainda mais, sobre ter um pódio apenas com negros, faz foto mostrando os diferentes tons de negro e trazendo a pauta racial de forma mais contundente, o que a sociedade racista faz? Condena! E a resposta a esse empoderamento é a saída sistemática de pessoas negras nas últimas eliminações do programa.

Caso a Domilita saia hoje, essa possibilidade se agrava, já que Alface é o anti-herói da história e só é acolhido quando corresponde à expectativa de determinada torcida. A Aline é a que, aparentemente, tem menos torcida entre as mulheres do Quarto Deserto, o que, caso não haja liderança ou imunidade para eles, aumenta muito a chance da final ser entre Amanda, Bruna e Larissa. Pessoas que inclusive poderiam ser citadas nominalmente em vários exemplos de privilégio racial dentro do programa.

Por exemplo, Larissa, que saiu com rejeição altíssima e precisou de 4 dias para ser perdoada pelo público, Bruna, que tem um comportamento extremamente agressivo, e que é potencializado quando são homens, principalmente negros, seus alvos e Amanda, que para muitos é uma planta e que na primeira semana distorceu uma frase do Fred, o colocou como agressivo e ainda disse que a frase ia de encontro ao que ele pregava, tentando colocá-lo enquanto falso militante.

Fica muito perceptível como de nada adianta colocar pretos nos produtos da indústria cultural se não tiver um trabalho de consciência na sociedade. Um trabalho que envolve letramento racial para todos, mas também envolve coisas mais materialistas, como distribuição de renda, reforma agrária, cotas RACIAIS, taxação de grandes fortunas e etc. Não desmerecendo os meios de massa, até porque sou um dos que acredita que programas como BBB, falando sobre questões sociais, ajudam a discussão a chegar em locais que a internet não chega. Mas a verdade é que enquanto a mudança não for estrutural, ter representatividade em reality não mudará a realidade da maioria da população negra no Brasil, pelo contrário, veremos nossas dores em rede nacional serem fonte de audiência.

Fonte: Redação Nós
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