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Na COP-28, Lula cita dados errados sobre Ministério do Meio Ambiente e produção de alimentos

5 dez 2023 - 16h41
(atualizado em 6/12/2023 às 13h10)
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) citou informações erradas sobre meio ambiente, defesa e relações internacionais em entrevistas concedidas durante sua participação na COP-28 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas).

Lula errou, por exemplo, ao afirmar que a atual gestão do Ministério do Meio Ambiente possui metade do efetivo que tinha em 2010. Em janeiro deste ano, quando ele iniciou o terceiro mandato, havia 8.532 servidores na pasta, cerca de 15% a menos do que o registrado ao fim do segundo mandato do petista. O presidente também inflou a participação de pequenas propriedades rurais na produção de alimentos no Brasil e os gastos militares com a guerra entre Rússia e Ucrânia. Veja abaixo o que checamos:

  1. É falso que Marina Silva (Rede) assumiu o Ministério do Meio Ambiente neste ano com menos da metade do número de funcionários que a pasta tinha em 2010. Além de Marina ter deixado a pasta em 2008, a queda no total de servidores desde aquela época não chega a 20%;
  2. Também não é verdade que existam, no Brasil, 4,6 milhões de pequenas propriedades que produzem quase 90% dos alimentos consumidos no país. Não há dado público sobre a participação dessas propriedades na alimentação, e o número existente, que diz respeito à agricultura familiar, não chega perto do citado pelo presidente;
  3. Lula desinformou ao tratar o total dos gastos militares de todos os países do mundo em 2022 como se o valor representasse apenas o gasto no conflito entre Rússia e Ucrânia;
  4. O presidente errou ao dizer que o Brasil era a sexta maior economia do mundo em 2010, quando ele deixou a Presidência. O país só chegou a essa posição em 2011, no primeiro ano de mandato de Dilma Rousseff (PT);
  5. Por fim, também é falso que o petista tenha participado de todas as reuniões do G7 em seus mandatos como presidente. Lula não foi convidado aos encontros de 2004 e 2010.

A fala do presidente contém dois erros, e por isso foi classificada como FALSA. Em primeiro lugar, Marina Silva não era ministra do Meio Ambiente em 2010. Ela deixou o cargo dois anos antes, em 2008. Além disso, o número de servidores da pasta não caiu pela metade entre aquela época e o início do terceiro mandato de Lula.

Em maio de 2008, Marina pediu demissão do Meio Ambiente, que comandava desde 2003. Ela alegou a falta de apoio do presidente em meio a conflitos com o então ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, em torno do plantio de soja e de cana-de-açúcar, e com a então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), por conta da pressão para a concessão de licença para grandes obras, como a hidrelétrica de Belo Monte.

Em 2007, último ano completo de Marina na gestão do Meio Ambiente, havia um total de 8.787 servidores ativos. Ao fim de 2008 — meses após ela ter sido substituída por Carlos Minc —, o número de funcionários aumentou para 9.767. Os números são, respectivamente, 2,9% e 12,6% maiores do que o total de servidores ativos no ministério ao início do terceiro mandato de Lula, em janeiro deste ano, que era de 8.532. Os dados são do PEP (Painel Estatístico de Pessoal), do Ministério do Planejamento.

A alegação do presidente não se sustenta mesmo se forem considerados os dados de dezembro de 2010, fim do seu segundo mandato, quando a ministra era Izabella Teixeira. Naquela época, havia 10.043 servidores ativos no Ministério do Meio Ambiente, número 15% maior do que o atual.

Outro lado. Contatada por Aos Fatos, a Secom (Secretaria de Comunicação Social) afirmou que o presidente se referia, na realidade, ao número de servidores do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

Em busca no painel do Ministério do Planejamento, é possível verificar que havia, em janeiro de 2023, 3.247 servidores ativos no órgão. Isso representa uma queda de 56,7% no quadro de funcionários desde 2007 (7.498 servidores ativos), de 50,8% em relação a 2008 (6.605 servidores ativos) e de 41,2% desde 2010 (5.520 servidores ativos).

Foto tirada em 2010 mostra a então candidata à Presidência pelo PV, Marina Silva, de mãos levantadas junto com o seu candidato a vice, o empresário Guilherme Leal, cofundador da Natura, em evento de campanha em que ambos são aplaudidos por correligionários
Foto tirada em 2010 mostra a então candidata à Presidência pelo PV, Marina Silva, de mãos levantadas junto com o seu candidato a vice, o empresário Guilherme Leal, cofundador da Natura, em evento de campanha em que ambos são aplaudidos por correligionários
Foto: Aos Fatos

Terceira Via. Marina Silva concorreu à Presidência da República pelo PV em 2010 ao lado do empresário Guilherme Leal, cofundador da Natura, contra Dilma Rousseff (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

Selo não é bem assim

"Agora, o que eles não sabem é que nós também temos 4,6 milhões de pequenas propriedades de até 100 hectares que produzem quase 90% do alimento que nós comemos" — entrevista em 03.dez.2023.

De acordo com o mais recente Censo Agropecuário do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de 2017, o Brasil possuía 4,52 milhões de propriedades rurais com até 100 hectares. O número é similar ao citado por Lula na declaração. Não há, no entanto, dados públicos que atestem que 90% dos alimentos consumidos pelos brasileiros sejam produzidos por esses estabelecimentos.

Aos Fatos não identificou pesquisas que estimassem o impacto da produção de pequenas propriedades no consumo interno. A maior parte dos estudos se concentra em analisar a participação da agricultura familiar na produção de alimentos. De acordo com a lei 11.326/2006, é considerada agricultura familiar:

  • aquela praticada em propriedades de até quatro módulos fiscais (medida expressa em hectares cujo valor varia por estado);
  • que tem gestão familiar e utiliza predominantemente mão-de-obra de membros da família;
  • e que tem percentual mínimo da renda originada de atividades econômicas do estabelecimento.

De acordo com o Censo Agropecuário de 2017, havia 3,89 milhões de propriedades classificadas como pertencentes à agricultura familiar.

Em artigo de 2020, pesquisadores da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa de Pesquisa Agropecuária) criaram uma lista de 65 produtos, como grãos, cana-de-açúcar, hortaliças e frutas, para estimar o impacto da agricultura familiar na produção de alimentos. Nesse conjunto, as propriedades foram responsáveis por apenas 5,7% da produção. Excluindo-se o milho, a soja, o trigo e a cana-de-açúcar, que são tradicionalmente cultivados por grandes propriedades, a participação cresce para 30% do total, em toneladas. Não há dados sobre consumo.

O número mais próximo ao citado pelo presidente foi publicado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário em outubro de 2017 e usa como base dados do Censo de 2006. A pasta atribui ao Ministério do Desenvolvimento Social a informação de que 70% da comida consumida pelo brasileiro seria produzida pela agricultura familiar. Em reportagem publicada neste ano pela Folha de S.Paulo, o ex-pesquisador da Embrapa Elisio Contini questiona o dado. Ele cita, por exemplo, que a maior parte do arroz produzido no país vem de grandes propriedades no Rio Grande do Sul.

Selo falso

"Já gastamos nesta guerra com Ucrânia e Rússia US$ 2,224 trilhões, dinheiro que poderia ter sido usado para acabar com a fome no mundo" — entrevista em 1º.dez.2023.

Ao criticar o conflito entre Israel e Hamas no Oriente Médio e defender que o dinheiro gasto em guerras deveria ser usado para resolver questões humanitárias, o presidente confundiu os dados divulgados pelo Sipri (Instituto Internacional de Estocolmo de Pesquisa sobre a Paz). Segundo a base, o mundo inteiro registrou, em 2022, US$ 2,23 trilhões em gastos militares. Esse número, no entanto, não diz respeito somente à guerra entre Rússia e Ucrânia ou sequer a gastos com conflitos bélicos em geral.

De acordo com o próprio instituto, a cifra leva em consideração:

  • Gastos com pessoal, como salários, pensões, aposentadorias e serviços sociais de militares e civis ligados às forças armadas dos países;
  • Operações de manutenção;
  • Compras em geral;
  • Pesquisa e desenvolvimento militar;
  • Gastos com infraestrutura militar;
  • E doações de recursos militares a outros países.

A base de dados permite restringir os resultados por país e, por isso, é possível verificar os gastos militares russos e ucranianos no ano passado. Em 2022, a Rússia despendeu US$ 86,3 bilhões, enquanto a Ucrânia, US$ 43,9 bilhões. Esses números, no entanto, não se referem apenas à guerra, e sim às cifras militares como um todo.

O Brasil se tornou a sexta maior economia do mundo apenas em 2011, no primeiro ano do primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT), segundo levantamento do FMI (Fundo Monetário Internacional). Já ao fim de 2022, último ano do governo de Jair Bolsonaro (PL), o país ocupava a 11ª posição entre as maiores economias globais, e não a 12ª. Por isso, a declaração foi classificada como FALSA.

No último relatório divulgado pelo FMI, em outubro, foi projetado que o Brasil pode fechar o ano de 2023 como a 9ª maior economia do mundo. A projeção é semelhante à da agência de classificação de risco Austin Rating, que apontou em setembro que o país poderá chegar neste ano à 10ª posição.

Selo falso

"Eu participo do G7 desde que ganhei a Presidência da República. Aliás, o único presidente que participou de todas as reuniões do G7" — discurso em 2.dez.2023.

Não é verdade que o presidente Lula participou de todas as cúpulas do G7 enquanto era presidente da República. Em seus dois primeiros mandatos, entre 2003 e 2010, Lula não foi convidado aos encontros de 2004 e 2010, realizados nos Estados Unidos e no Canadá, respectivamente.

Entre 1998 e fevereiro de 2014, o grupo era composto por oito membros e se chamava G8 pela participação da Rússia. Posteriormente, a Rússia foi suspensa em razão de sanções aplicadas em 2014 pelo então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, pela anexação da Criméia, e passou a se chamar G7.

Transmissão da TV Brasil mostra líderes que compareceram à Cúpula do G7 de 2023; Lula está entre eles.
Transmissão da TV Brasil mostra líderes que compareceram à Cúpula do G7 de 2023; Lula está entre eles.
Foto: Aos Fatos

Hiroshima. Lula (na primeira fileira de baixo, a quarta pessoa da direita para a esquerda) foi um dos presidentes convidados a participar da Cúpula do G7 realizada em maio deste ano (Reprodução/TV Brasil)

Vale ressaltar que Lula foi convidado a participar da reunião da cúpula do G7 neste ano. O grupo se reuniu em Hiroshima, no Japão, em maio.

Referências:

1. Folha de S.Paulo (1, 2 e 3)

2. Ministério do Meio Ambiente

3. Ministério do Planejamento

4. Estadão

5. IBGE (1 e 2)

6. Planalto

7. Embrapa

8. Ministério da Casa Civil

9. Sipri (1 e 2)

10. FMI (1 e 2)

11. Valor Econômico

12. UOL

13. G1 (1 e 2)

14. G7 Toronto

15. G7 Hiroshima

16. El País Brasil

Esta reportagem foi atualizada às 12h30 do dia 6 de dezembro de 2023 para acrescentar a resposta da Secom.

Aos Fatos
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