‘Orun’: Entenda o que diz a crença de Preta Gil sobre a vida após a morte
Cantora, que faleceu no domingo, 20, era adepta do candomblé
Preta Gil, devota do candomblé, faleceu aos 50 anos devido a um câncer no intestino; sua espiritualidade enfatizava a morte como um portal, segundo a visão iorubá, destacada em homenagens e declarações sobre o "Orun".
Preta Gil era uma grande devota de Oxum, orixá cultuada na mitologia iorubá, e de Nossa Senhora Aparecida. Em diversas entrevistas, a cantora aparecia segurando itens de pelúcia representando essas divindades e refletia sobre o quanto se apoiava em suas crenças, mesmo na reta final da luta contra o câncer no intestino.
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Após sua morte, no último domingo, 20, familiares e amigos fizeram referência à fé da artista em suas homenagens. Francisco Gil, único filho da cantora, escreveu em seu texto de despedida que eles, por serem "do axé", sabiam que "a morte não é um fim".
O babalorixá Célio D'Omolu prestou homenagem à artista, afirmando que o "Orun" ganhou uma linda estrela. “A dor me consome, mas tenho certeza de que você descansa em um bom lugar, no colo de nossa Mãe Oxum. Com todo o meu amor”, disse o sacerdote.
Em entrevista ao portal Terra, o babalorixá, professor de cultura iorubá e autor da obra Orí: A Cabeça Como Divindade, Márcio de Jagun, explicou que "Orun" é o céu na filosofia iorubá (Yorùbá).
“'Orun' é uma palavra comumente traduzida como 'céu'. No entanto, numa perspectiva mais abrangente e descolonial, propomos o entendimento do Orun como espaço sideral” explicou.
Segundo a tradição iorubá, existem cerca de nove espaços siderais, portanto, nove Orun: quatro acima e quatro abaixo da Terra, não necessariamente no seu interior. O nosso planeta também é considerado um Orun, chamado de "Aiê".
Vida e morte na visão iorubá
“O conceito de vida e morte no sistema iorubá é muito distinto do nosso. Enquanto, para nós, a morte representa falência, fim, perda [...] para os iorubás, ela é apenas um portal. Nós, espíritos — personalidades, identidades, individualidades — ocupamos espaços nesses Orun. Quando estamos aqui no Aiê, neste Orun que é o planeta Terra, temos densidade física, temos Ará, o corpo biológico. Em outros Orun, a constituição biológica não é necessária”, destacou de Jagun.
Segundo ele, o nosso Orí, entendido como identidade ou individualidade, não precisa necessariamente de um corpo físico. “A morte, para nós, é muito mais um portal. Afinal, os iorubás mantêm contato permanente com as individualidades que ocupam os diversos espaços siderais”, afirmou.
“Há essa comunicabilidade entre vivos e não-vivos, como prefiro me referir aos 'mortos', já que, para nós, nada se encerra. Esses metavivos estão em constante contato conosco: dançam conosco, celebram conosco, comem conosco, nos orientam por meio da consulta oracular. Essa convivência atemporal nos oferece uma outra dimensão sobre o pós-vida ou sobre os metavivos”, concluiu.
Preta Gil morre aos 50 anos
A morte de Preta Gil foi confirmada nas redes sociais de Gilberto Gil, na noite de domingo, 20. A cantora havia recebido o diagnóstico de câncer no intestino em janeiro de 2023, após passar mal em casa e descobrir um tumor no reto. Em entrevista a Ana Maria Braga, naquele mesmo ano, detalhou que foi ao hospital após perceber sangue escorrendo por suas pernas.
Nos Estados Unidos, iniciou um novo tratamento após esgotar as possibilidades disponíveis no Brasil. Apesar das frequentes internações, Preta sempre demonstrou otimismo. “Vou voltar curada, se Deus quiser”, afirmou antes de embarcar para o exterior.
Neste domingo, ela passou mal a caminho do aeroporto, de onde retornaria ao Brasil. Uma ambulância foi chamada, mas a cantora faleceu antes de chegar ao hospital.
Filha de Gilberto Gil com a empresária Sandra Gadelha, Preta deixa como herdeiro Francisco Gil, de 30 anos, fruto de seu relacionamento com o ator Otávio Müller. O filho integra o grupo musical Gilsons e dá continuidade ao talento artístico da família.
