O marechal Philippe Pétain assumiu em 1940 a liderança do governo francês, o chamado regime de Vichy, que colaborou com os nazistas. Em 1945, ele foi condenado à morte e declarado indigno da nação. A pena foi comutada depois para prisão perpétua e ele morreu detido em 1951.
A missa em homenagem a Pétain, realizada igreja de Verdun, no leste do país, no sábado (15), foi organizada pela Associação para Defender a Memória do Marechal Pétain (ADMP). O presidente da ADMP, Jacques Boncompain, declarou à imprensa no final da cerimônia que Pétain teria sido "o primeiro resistente da França.
Em vídeo publicado pelo jornal L'Est Républicain, Boncompain chega a chamar o chefe do regime colaboracionista de Vichy de "o maior servidor da França no século XX". Ele afirma ainda que o marechal "salvou [...] ao menos 700 mil judeus".
Tese sem fundamento
A tese de que Pétain teria "protegido os judeus franceses" é considerada sem fundamento por historiadores. Ela é desmentida por fatos como a captura de crianças francesas na detenção em massa, conhecida com Rafle do Vel d'Hiv, em 1942, ou do sistema de segregação imposto pelo regime de Vichy desde 1940, que atingiu especialmente os judeus franceses.
Em comunicado à AFP, a procuradora de Verdun, Delphine Moncuit, informou ter aberto investigação contra Boncompain "e outros" por "contestação pública da existência de crimes contra a humanidade cometidos durante a Segunda Guerra Mundial".
O inquérito também vai apurar a "realização de reunião política em local destinado ao culto" e envolve o padre que celebrou a missa, Gautier Luquin, 31 anos. O religioso é acusado de "provocação".
O secretário de segurança pública da região de Meuse, Xavier Delarue, já havia anunciado que faria uma denúncia ao Ministério Público após declarações "claramente revisionistas" feitas no evento.
A prefeitura de Verdun acrescentou que um dos pontos do relatório enviado à Justiça é a "possível dissolução" da ADMP, decisão que cabe ao Ministério do Interior. A associação não foi localizada pela AFP para comentar o caso.
A missa em homenagem a Pétain tinha sido proibida pelo prefeito de Verdun, Samuel Hazard, de centro-esquerda, por risco de "perturbação da ordem pública". Mas a decisão foi anulada pelo tribunal administrativo na sexta-feira (14).
Segundo o prefeito, "um número muito pequeno", cerca de 20 pessoas, participou da missa no sábado. Do lado de fora, cerca de cem manifestantes, incluindo vários políticos, protestaram diante da igreja, sob vigilância da polícia.
Revisionismo histórico
Entre vaias, um militante de extrema direita, Pierre-Nicolas Nups, entoou "Maréchal, nous voilà", uma canção em louvor ao chefe do regime de Vichy.
Na França, declarações revisionistas podem levar a até um ano de prisão e multa de € 45 mil. A lei define como crime a negação, minimização ou banalização extrema de genocídio, crimes de guerra ou crimes contra a humanidade.
Em abril, o presidente do partido de extrema direita Reconquista!, Éric Zemmour, foi condenado pela Corte de Apelação de Paris a pagar multa de € 10 mil por contestação de crime contra a humanidade, após afirmar em 2019 que Pétain havia salvado judeus franceses. Ele recorreu à Corte de Cassação.
(Com AFP)