Círio de Nazaré: sorteio de santa e disputa por primeiro e último dia marcam novenas
Grupos de oração se reúnem nas periferias da capital paraense para novenas que antecedem uma das maiores festas religiosas do país
As novenas da Santa Peregrina de Nossa Senhora de Nazaré começam um mês antes da celebração do Círio de Nazaré, em 12 de outubro. Tradição religiosa leva imagem de santas de casa em casa, com preferência pelo primeiro e último dia. Há sorteio e até debates sobre a COP 30.
O Círio de Nazaré acontece em 12 de outubro em Belém, mas para quem é devoto, as festividades começam um mês antes. Nas periferias da capital, as tradicionais novenas da Santa Peregrina de Nossa Senhora de Nazaré chamam a atenção pela fé, mas também por tradições como o dia preferido para as novenas e, sobretudo, pelo sorteio da santa.
Na periferia de Ananindeua, Região Metropolitana de Belém, no bairro Cidade Nova são distribuídas quase 50 imagens de Nossa Senhora de Nazaré para a realização das novenas. A aposentada Albertina Bezerra, conhecida como Tia Bebé, há mais de 40 anos comanda esses encontros. Recebeu a missão do avô.
“Desde que eu me entendi por gente, sempre fui católica. Meu avô rezava ladainha desde mocinho e eu pedia sempre a Nossa Senhora que só levasse ele depois que eu pudesse segurar essa cruz. E estou segurando”, afirma Tia Bebé.
Círio de Nazaré, a santa e a sorte nas novenas
Não basta receber a novena de Nossa Senhora de Nazaré em casa: é preciso torcer para ser sorteado e ficar com a imagem da santa. Participante do grupo de tia Bebé, a advogada Danúbia Santana, da Cidade Nova, ganhou duas vezes. Habituada em participar da peregrinação, em 2014, um ano após a morte da avó Albertina de Assunção, Danúbia foi sorteada.
Mas um incêndio destruiu a imagem. Neste ano, ela ganhou novamente. “Receber a Santa Peregrina é o dia em que mais espero no ano e ter ganhado foi uma emoção muito grande. Em 2014, foi emocionante, mas não como agora. Durante muitos anos o sonho da minha avó era ganhar essa santa. Ela não ganhou, morreu e não ganhou”, diz Danúbia.
A primeira e a última casa das novenas antes do Círio de Nazaré
Na divisa entre Belém e Ananindeua, no bairro Castanheira, local que cresceu desordenadamente em volta de um shopping do mesmo nome, há diversos grupos de novena. O primeiro e o último dia são os mais disputados, explica o guia de turismo religioso Renan Ribeiro.
“Sempre tem uma briga por esses dias. A primeira novena, eles acham que a pessoa que recebe é privilegiada, e a última é mega privilegiada. A primeira casa dá o pontapé inicial, a última tem um toque especial: é de lá que sai a imagem para a paróquia”, explica Renan.
Em geral com uma hora de duração, as novenas seguem cânticos e orações determinados por um livro conhecido como Novenário, com temas específicos para cada dia. Entre pai nossos e ave-marias, os encontros reservam momentos de reflexões e o compartilhamento de experiências sobre o tema da noite.
Novena do Círio de Nazaré discutem até COP 30
Quase oito quilômetros de distância separam o Castanheira da comunidade de Nossa Senhora de Aparecida. É a região de um dos mais populosos bairros da capital paraense, o Telégrafo, onde o trabalho de evangelização feito pelos grupos de oração vai além da fé na padroeira dos paraenses.
As novenas da Santa Peregrina de Nossa Senhora de Nazaré servem para tratar de temas atuais, como meio ambiente. A dona de casa Marlene dos Santos trabalha há 27 anos na paróquia organizando a liturgia e os novenários. Ela é a favor de atrelar a palavra de Deus a temas sociais.
“Esse ano o tema está muito bom, principalmente porque estamos perto da COP 30. Trabalhamos a ecologia, sobre o que está acontecendo no nosso planeta. Tudo isso dá o conhecimento e um alerta para as pessoas terem consciência e cuidar da nossa casa comum”, explica a dona de casa.
Crianças são presença cativa nas novenas
A dona de casa Lúlia Tenório participa das novenas que antecedem o Círio há mais de 30 anos. Segundo ela, os pedidos para receber a santa nas casas só crescem. Neste ano, “eram só nove, mas fomos em vinte e quatro casas. Como as pessoas querem muito, a gente vai fazendo até o dia da entrega. Ainda tem família que fica zangada porque a santa não foi”.
Apesar da quantidade expressiva de grupos de novenas nos bairros, Tia Bebé nunca recebeu um “não” e as crianças são presença cativa. “Eu começava e encerrava com as crianças. As mais velhas eram três ou quatro, o resto todas eram crianças”, conta aos risos.