Chacina no Rio é denunciada na Comissão Interamericana de Direitos Humanos
A denúncia na Comissão é o primeiro passo para que o caso, se aceito, seja encaminhado à Corte, que pode condenar o Estado
O Instituto Anjos da Liberdade denunciou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos a responsabilidade do Estado do Rio de Janeiro pelas mortes nos complexos do Alemão e da Penha, com pedido de investigação, proteção às vítimas e punição dos envolvidos.
O Instituto Anjos da Liberdade (IAL), que há 23 anos atua na defesa dos direitos humanos, apresentou uma denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) para que o Estado do Rio de Janeiro seja responsabilizado pelas mortes ocorridas nos complexos do Alemão e da Penha.
O ativista Márcio Ruzon, do IAL, explica que a Comissão recebe a denúncia, analisa e emite um parecer com recomendações para que o Rio de Janeiro adote medidas para que as violações não aconteçam mais. Se não acatar, o caso vai para a Corte, que julga e pode emitir sentença punindo o Estado e pedindo reparação às vítimas e familiares.
“O Brasil já foi denunciado pelo menos quinze vezes, e, na maioria dos casos, por violência policial. Por isso, há boas chances de vencermos esta também”, afirma Ruzon. A ação pede a proteção dos familiares das vítimas, de defensores dos direitos humanos e de jornalistas internacionais. Solicita ainda a realização de uma investigação independente, a preservação das provas e o afastamento dos agentes envolvidos na operação nos complexos da Penha e do Alemão.
Quanto tempo pode levar a ação?
Ruzon, que é Coordenador Nacional de Direitos Humanos do IAL, não arrisca previsão sobre o tempo da ação. “Por ser uma instância estrangeira, mesmo com poder decisório, há o conflito da soberania e questões culturais, não dá para precisar uma data. Por isso entramos e fundamentamos o pedido de urgência.”
Recentemente, o Brasil foi condenado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos em diferentes casos, como o do trabalhador rural Antônio Tavares Pereira, morto por um disparo de policial no Paraná. Outra condenação se refere à demora na demarcação das terras do povo Xukuru, em Pernambuco.
Entre as condenações, há uma coincidência: o caso da chacina na favela Nova Brasília, no mesmo Complexo do Alemão, onde 26 pessoas foram mortas. Um dos resultados dessa condenação foi a proposta da chamada ADPF das Favelas, que estabelece regras para operações policiais em comunidades — e que o governador Cláudio Castro (PL) classificou como “maldita”.
Questionamentos na Comissão Interamericana de Direitos Humanos
Entre os questionamentos da ação protocolada na CIDH está o fato de que as forças de segurança do Rio de Janeiro acusaram a população de violar o local do crime e de possível fraude processual, alegando que as vítimas teriam sido despidas para não aparecer com roupas camufladas ou outras vestimentas semelhantes às dos policiais.
“O que dizer então das dezenas de corpos nesta e em outras operações, que são empilhados feitos carnes em açougue, sem qualquer preservação do local de crime para perícia?”, questiona Ruzon. Ele também pergunta se houve dinheiro apreendido na operação, pois só foram apresentadas armas e drogas. A ação questiona ainda marcas de tiros na nuca, vítimas esfaqueadas e por que as baterias das câmeras policiais não filmaram toda a ação.
A assessoria de imprensa da Casa Civil do Rio de Janeiro foi contactada para um posicionamento sobre os questionamento da ação na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, mas não respondeu. A secretaria de Segurança Pública e a Polícia Militar, também não.