Do gueto ao palco: a história de Everson Pessoa no Demônios da Garoa
Desde 2017, Everson Pessoa, criado nas rodas de samba de São Mateus, é integrante do tradicional grupo Demônios da Garoa
Nascido em Santo André, na Grande São Paulo, e criado em São Mateus, bairro da zona leste da capital paulista, Everson Pessoa, 43, faz parte do grupo Demônios da Garoa desde 2018. Além de cantar e tocar violão de seis cordas e violão tenor, o sambista acrescenta suas vivências ao grupo musical com décadas de carreira.
“Levo o melhor do samba de raiz, um pouco de São Mateus. Levo um pouco da favela, porque eu gosto de falar para eles: ‘Olha aqui é o Demônios da Garoa, mas tem o nosso dialeto, nossa experiência do gueto’. E esse olhar está sendo bem recebido dentro do Demônios”, explica Pessoa.
Este ano, o grupo musical celebrou 80 anos de existência. Desde 1994, ele é reconhecido pelo Guinness Book, o livro dos recordes, como o grupo vocal brasileiro mais antigo em atividade no Brasil.
Pessoa conta que o primeiro convite para tocar com os Demônios surgiu em 2002, quando substituiu o músico Ventura Ramirez em uma apresentação no Parque Ecológico do Tietê, no bairro do Cangaíba, na zona leste, a convite de Ricardo Rosa.
E relembra como se sentiu na ocasião: “Voltei lá em 1988, vendo o LP do Demônios na casa da minha tia. Ouvindo o disco do Demônios do Trem das Onzes que tem aquele trem grandão. Eu, criança, ouvia os Demônios e me vi no palco com eles”, conta.
Antes de integrar o Demônios da Garoa, o sambista fez parte do grupo Quinteto em Branco e Preto, conjunto batizado pela madrinha do samba, Beth Carvalho, de 1997 a 2013. Pessoa acompanhou Beth em apresentações e turnês internacionais. Em carreira solo, ele lançou os álbuns "Samba Certeiro", em 2017, e "Pra Confortar o Coração, em 2019.
A partir de 2017, entrou para a banda de apoio do Demônios da Garoa. No dia em que a madrinha do samba faleceu, em 2018, Pessoa foi convidado pelo Demônios para cantar ‘Andança’ em homenagem a Beth Carvalho no Bar Brahma, no centro de São Paulo.
A estreia oficial como músico do grupo ocorreu poucos meses depois. “Fui para a frente no show do Demônios com o Toquinho, que se chamava ‘De Adoniran a Vinícius’, em 2018 no Tokio Marine Hall. O Demônios da Garoa cantava Adoniran e o Toquinho cantava Vinícius. Foi a primeira vez que vesti a grande farda do Demônios da Garoa”, relembra.
Entre as andanças como músico, o integrante do Demônios sempre teve São Mateus como a sua raiz. Criado no Jardim Vila Carrão, frequentava os sambas de Tia Cida dos Terreiros, a matriarca do samba de São Mateus.
O irmão do músico Yvison Pessoa, 45, também sambista, destaca a persistência do músico em fazer da arte o seu trabalho.
“Para mim, ele é um gênio da música brasileira. Além de ótimo músico e versátil, toca vários instrumentos de corda, é arranjador e compositor. Enfim, o cara é um turbilhão de coisas e é um ser iluminado que vem pro mundo para ser músico mesmo. E a trajetória dele é muito linda.”
Os irmãos Pessoa fazem parte do conjunto Berço do Samba de São Mateus, que tem como foco resgatar composições e destacar sambistas do bairro.
Já o músico, Rodrigo Campos, 45, ensinou Everson a tocar nas rodas de samba do bairro da zona leste e hoje destaca a presença do sambista no Demônios. “Hoje, Everson é um dos principais músicos do samba de São Paulo e do Brasil. O samba de São Paulo também se refere muito a São Mateus. E ter um sambista de São Mateus no Demônios torna isso ainda mais óbvio aos olhos de quem não vê isso claramente”, pontua Campos.
Pessoa diz ter como principal objetivo dentro do Demônios da Garoa levar o conjunto para outros públicos. “A gente tem entrado em vários espaços. A minha presença pode ajudar a ter um bom relacionamento com o público. O grupo quer se aproximar mais das pessoas para não ficar no território de elite, como algo inacessível. Porque o povo que não tem grana ama o Demônios de graça”, finaliza.