Projeto ensina teatro em escolas públicas da periferia da Grande São Paulo
Em Santo André, arte-educadores estimulam estudantes a ocuparem espaços reais e imaginários, dentro e fora da escola
E se, em vez de ir até uma escola de teatro, fosse ela que viesse até você? Em Santo André, na Grande São Paulo, o teatro não espera novos talentos aparecerem. É ele que vai atrás. Entra pelos portões das escolas públicas, ocupa salas de aula, afasta as carteiras, transforma os corredores em espaço de ensaio, e faz do contraturno um período de criação artística.
É assim que funciona a Escola Itinerante de Teatro (EIT), projeto da Cia. Estrela D’Alva que, desde 2018, já formou mais de 200 adolescentes em teatro, levando a experiência da cena para dentro de escolas públicas, principalmente em bairros periféricos e áreas descentralizadas, onde o acesso à cena cultural é limitado. A iniciativa permite que os jovens comecem a atuar sem precisar sair do próprio bairro.
Durante um ano inteiro, a EIT ocupa escolas estaduais de ensino médio e oferece aulas semanais gratuitas de teatro no contraturno. Só que o rolê não é só aprender a atuar. O projeto cria uma vivência contínua com o teatro, mistura formação artística, convivência coletiva e circulação pela cidade, colocando esses jovens em contato direto com a cena cultural.
Estudantes atuam em todo o processo de criação
Além das aulas regulares, coordenadas por Lígia Helena de Almeida e Paulo Gircys — fundadores da Cia. Estrela D’Alva e com longa trajetória na arte-educação —, o projeto promove saídas coletivas para assistir a espetáculos, visitas a espaços culturais e teatros históricos da cidade, além de intercâmbios com outros grupos e escolas.
Ao final de cada ciclo, uma escola se apresenta na outra; depois, todos vão juntos se apresentar em palcos emblemáticos de teatro da cidade. E os espetáculos criados pelos adolescentes partem de suas próprias experiências. Em cena, surgem temas como família, escola, sexualidade, gênero, conflitos geracionais e o desejo de ser escutado.
Não se trata de falar da adolescência de fora, mas de afirmar esse tempo da vida como lugar legítimo de criação artística. Os próprios estudantes concebem cenários e figurinos, com acompanhamento de artistas convidados, fortalecendo a noção de autoria e pertencimento.
Teatro feito na escola ocupa espaços da cidade
Ao levar o teatro para dentro das escolas públicas, o projeto reduz muitas barreiras de acesso à cultura e à formação artística, mas também cria um espaço para que essa galera troque uma ideia, se expresse e se escute. É nesse “pega a visão” que a magia acontece, mudando o rumo de vida de muita gente.
Em um contexto em que adolescentes das periferias ainda são vistos mais como problema do que como potência, o projeto faz o movimento inverso, reconhecendo esses jovens como artistas em formação, capazes de criar, falar de si e ocupar os espaços culturais da cidade. É teatro feito no chão da escola, com o olhar voltado para a cidade inteira.
Em 2025, a Escola Itinerante funcionou na EE Senador João Galeão Carvalhal, no Jardim Bela Vista, e na EE Dr. Luiz Lobo Neto, no bairro Paraíso, com apresentações tanto dentro das escolas quanto no palco dos teatros da cidade. O projeto começou em 2018 na EE Amaral Wagner; ocupou a EE Wanda Bento Gonçalves, no Capuava, em 2022; e, em 2023, atuou na EE Francisca Helena Furia, no Recreio da Borda do Campo, e na EE Professor José Calvitti Filho, na Vila Scarpelli.