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'Problema é crise de liderança sistêmica, visionária', diz professor da FGV

Umesh Mukhi disse que a falta de planejamento do governo federal brasileiro estimulou uma crise, que agora exige resposta urgente

21 jan 2021 - 17h10
(atualizado em 22/1/2021 às 08h48)
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O problema da falta de insumos importados para a fabricação das vacinas para a covid-19 não é resultado de complicações burocráticas na liberação do produto, mas sim da crise de liderança sistêmica, visionária, existente no Brasil e da falta de foco do governo federal. A opinião é do professor do Departamento de Administração da FGV-EAESP, Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas, Umesh Mukhi, em entrevista ao Estadão. Veja abaixo:

Professor Umesh Mukhi, o senhor é um especialista em Gestão Internacional, pela FGV. O que acontece nesta questão dos insumos para a vacina?

Umesh Mukhi. É a falta de planejamento do governo central aqui no Brasil que estimulou uma crise, que agora está exigindo uma resposta urgente. Mas não se pode esperar que os outros países vão responder a isso de maneira urgente porque eles também estão lidando com crise deles.

Há problemas com a burocracia no processo da importação?

Não é isso. As empresas fazem contratos e cumprem esses contratos. Por exemplo: a importação emergencial de arroz feita pelo Brasil. Nós tivemos problema de arroz aqui no Brasil. Importamos da Índia, normalmente. Também não vejo que seja problema diplomático e nem que esteja havendo atraso. 

Então, o que houve?

O que houve no Brasil foi negligência, falta de planejamento do Brasil. Essa falha de liderança não promove sustentabilidade e não valoriza segurança pública e estimulou uma crise, que agora está exigindo uma resposta urgente. Se você falar que há uma crise e precisa que a vacina chegue aqui dentro de uma semana, isso não é normal, é fora de prazo. Uma situação urgente exige que você ultrapasse a burocracia, por isso que o presidente escreveu uma carta. Mas, em geral, não vejo que a burocracia vai atrapalhar. Ela existe por segurança pública, principalmente no setor da saúde. O problema principal nesta questão é que há uma crise interna do Brasil.

Já há uma relação mais antiga, como ocorreu em medicamentos para febre amarela, por exemplo, não é?

Sim. É comum essa importação dos insumos. Naqueles casos, como febre amarela, zika, havia um direcionamento, um plano. No caso da covid-19, a falta de uma resposta coordenada está atrapalhando. Você vê que tem o presidente da Câmara indo na embaixada da China. Isso é fora do normal. Tem o governo de São Paulo também e agora tem o presidente da República querendo falar com o presidente chinês. Há uma falta de foco. Mas o problema não é das instituições que produzem a vacina, como a Fiocruz e o Instituto Butantan. Isso vem da liderança do governo central, de quem está ocupando o cargo, e qual é a visão dessa liderança no processo. Nós estamos testemunhando que o País trocou três vezes de liderança no Ministério da Saúde. Isso atrapalha a visão sistêmica se quer vacinar o País inteiro. É preciso ter uma liderança sistemática e sustentável que vá além da ideologia e vá agir por todos os brasileiros. Isso é extremamente importante no processo.

Professor, o senhor é indiano. Como compararia com o que ocorre na Índia?

Se você quer comparar com a Índia, que começou a imunizar a população a partir do dia 16, verá que o processo foi liderado pelo primeiro-ministro. Ele foi quem lançou a campanha, com 3 mil centros de imunização, estimulando as pessoas. Essa é uma diferença em relação ao Brasil. O papel da liderança é muito importante se você quer vacinar a população.

Outros países já estão mais avançados.

Os Estados Unidos estão vacinando; a China, está vacinando; a Índia, está vacinando, porque são países que desenvolveram capacidades para lidar com contingência. A Fiocruz e Butantan têm altíssima capacidade de produzir a vacina. Mas acho que a crise é da falta de liderança, que deixou as instituições com um problema. Mas, veja, é preciso também ressaltar que o Brasil e a Índia têm uma relação excelente. Hoje mesmo você pode ver que a Índia já liberou vacina. Isso mostra a confiança na parceria estratégica. E vamos ter ainda outras parcerias entre setores farmacêuticos para importar outra vacina, que se chama Bharat Biotech.

Estadão
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