Reino Unido endurece política de asilo com reforma contestada
O governo britânico apresentou nesta segunda-feira (17) uma grande reforma para endurecer sua política de asilo e imigração. As medidas visam desencorajar as chegadas irregulares de migrantes em pequenas embarcações, um fenômeno que o país tem dificuldade para conter. A reforma também visa restringir a concessão de vistos para alguns países africanos.
A reforma foi apresentada pelo governo trabalhista como "a mais ambiciosa já implementada no Reino Unido". Entre as medidas apresentadas pela ministra britânica do Interior, Shabana Mahmood, está uma mudança completa da política de acolhimento de refugiados, que passarão a ter um status temporário, com reavaliação a cada 30 meses.
Os migrantes que fugiram da ameaça de um regime poderão ser enviados de volta ao país de origem caso haja mudança política, informou o governo. Londres cita como exemplo a Síria, onde "um pequeno número de pessoas começou a retornar de forma voluntária" após a queda do regime de Bashar al-Assad.
Além disso, refugiados terão de esperar 20 anos — contra cinco atualmente — para solicitar residência permanente, medida inspirada no modelo dinamarquês. O governo também quer facilitar a deportação de famílias quando "elas vêm de um país seguro".
O governo trabalhista também planeja eliminar o apoio financeiro automático do Estado aos requerentes de asilo, benefício concedido a mais de 106 mil pessoas em março de 2025. Atualmente, eles recebem uma ajuda semanal e têm direito a alojamento, mas o alto custo de hotéis usados para abrigar imigrantes é alvo de críticas.
As ajudas sociais também serão cortadas "para os refugiados que têm direito a trabalhar e podem se sustentar, mas não o fazem", além de pessoas condenadas. O governo não negou a informação publicada pelo tabloide The Sun de que pretende ainda usar recursos (dinheiro, bens) para financiar a hospedagem dos candidatos ao asilo. "É normal que as pessoas que possuem bens contribuam para sua própria manutenção", declarou o secretário de Estado para Imigração, Alex Norris, à rádio Times Radio.
O governo quer modificar a aplicação da Convenção Europeia dos Direitos Humanos no Reino Unido para facilitar expulsões.
Pedidos de asilo em alta
Shabana Mahmood espera que essas medidas desestimulem as travessias pelo Canal da Mancha. Desde 1º de janeiro, 39.292 pessoas chegaram em pequenas embarcações, número superior ao de 2024, e quase todas pediram asilo em seguida. As possibilidades de recurso em caso de recusa também serão reduzidas.
Os pedidos de asilo aumentaram 18% em 2024, enquanto caíram 13% na União Europeia no mesmo período, segundo dados do governo. Mais de 400 mil solicitações foram registradas desde 2021, contra 150 mil entre 2011 e 2015.
Restrição de vistos para países africanos
O governo britânico também ameaça restringir a concessão de vistos para Angola, Namíbia e República Democrática do Congo, acusando esses países de não cooperarem suficientemente para readmitir seus cidadãos em situação irregular no Reino Unido.
Esses governo têm "um mês" para melhorar a cooperação, alertou Alex Norris nesta segunda-feira à Sky News. Segundo Londres, isso envolve "milhares" de pessoas atualmente em situação irregular no Reino Unido. Outros países também podem ser alvo, especialmente aqueles com "altas taxas de pedidos de asilo" de pessoas que entraram legalmente no país, disse o secretário de Estado para Imigração.
Reforma criticada
As medidas provocaram forte oposição dentro do Partido Trabalhista e entre ONGs de apoio aos requerentes de asilo. O deputado trabalhista Tony Vaughan lamentou uma retórica que incentiva "uma cultura de divisão", enquanto a organização Refugee Council classificou as medidas como "duras" e "inúteis".
O líder do partido anti-imigração Reform UK, Nigel Farage, comemorou os anúncios, afirmando que Shabana Mahmood falava como "uma simpatizante do Reform". Já Kemi Badenoch, líder da oposição conservadora, avalia que esse é "um passo na direção certa", mas que as medidas "ainda não vão longe o suficiente".
O Reino Unido tem sido palco de inúmeros protestos anti-imigração. No verão europeu (de junho a setembro), ocorreram várias manifestações diante de hotéis que abrigam requerentes de asilo. Um dos atos, organizado pela extrema direita, reuniu até 150 mil pessoas em Londres em meados de setembro, segundo a polícia.