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Novas regras que dificultam residência e cidadania de brasileiros em Portugal começam a valer hoje

As mudanças na Lei de Estrangeiros de Portugal fecham portas que antes eram amplamente utilizadas por imigrantes, especialmente do Brasil

23 out 2025 - 06h18
(atualizado às 07h43)
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Resumo
Novas regras de imigração em Portugal, aprovadas sob influência da extrema direita, dificultam o acesso à residência e cidadania, com aumento do tempo para cidadania, restrições ao reagrupamento familiar e exigências de alta qualificação para vistos de trabalho, impactando especialmente os brasileiros.
Imigrantes protestam contra a decisão do governo de endurecer a política migratória, em frente ao Parlamento português, em Lisboa, em 25 de outubro de 2024.
Imigrantes protestam contra a decisão do governo de endurecer a política migratória, em frente ao Parlamento português, em Lisboa, em 25 de outubro de 2024.
Foto: AFP - PATRICIA DE MELO MOREIRA / RFI

Entram em vigor nesta quinta-feira (23) as novas regras de imigração em Portugal, aprovadas sob forte pressão da extrema direita local. A Lei 61/2025 extingue o visto de trabalho genérico e exige alta qualificação profissional. Turistas não poderão mais solicitar residência, e o tempo mínimo para pedir cidadania sobe de cinco para sete anos. O reagrupamento familiar só será permitido após dois anos de residência legal, afetando diretamente os mais de 500 mil brasileiros que vivem no país. 

A nova legislação, que altera a Lei de Estrangeiros de Portugal, fecha portas que antes eram amplamente utilizadas por imigrantes, especialmente os vindos do Brasil. A partir de agora, turistas não poderão mais solicitar residência após a entrada no país. Essa prática, comum entre brasileiros, foi definitivamente proibida.

O visto de trabalho passa a ser concedido apenas a profissionais com "altas qualificações", cuja lista oficial ainda não foi divulgada. Isso elimina o visto genérico, antes amplamente utilizado por trabalhadores em áreas como serviços, construção civil e turismo — setores em que os brasileiros lideram entre os estrangeiros empregados.

O tempo mínimo de residência para solicitar a cidadania portuguesa aumentou de cinco para sete anos. Já o reagrupamento familiar só poderá ser solicitado após dois anos de residência legal. Casais em união estável sem filhos precisarão comprovar 18 meses de coabitação antes da entrada no país. Filhos menores e dependentes com deficiência continuam tendo direito à reunificação imediata, porque as mudanças não se aplicam a menores de idade.

Menos inclusão e mais controle

A nova lei foi aprovada com 160 votos a favor e 70 contra e contou com o apoio da extrema direita portuguesa ao governo de centro-direita liderado pelo Partido Social Democrata (PSD), revelando uma aliança que provoca preocupação entre organizações de direitos humanos e especialistas em integração social. Para eles e boa parte da sociedade portuguesa, a nova lei reflete uma mudança de paradigma na forma como o país lida com a imigração: o foco no controle e na restrição substitui gradualmente a lógica da inclusão e da proteção.

O Partido Socialista e toda a esquerda portuguesa votaram contra a nova legislação. O presidente Marcelo Rebelo de Sousa promulgou o texto após ajustes exigidos pelo Tribunal Constitucional. O governo português defende que a medida "equilibra imigração com responsabilidade e humanismo", mas críticos apontam oportunismo político e submissão direta à extrema direita do país.

A primeira versão do texto foi vetada pelo Tribunal Constitucional por conter cinco normas inconstitucionais, incluindo restrições ao reagrupamento familiar. Houve ainda tentativas do partido de extrema direita Chega de incluir exigências como cinco anos de descontos na Previdência Social para acesso a apoios sociais — proposta retirada, mas que pode voltar em outro projeto.

Segundo Mariana Carneiro, diretora da ONG SOS Racismo, a aprovação da lei com apoio da direita radical representa uma "violação da Constituição da República Portuguesa e das convenções europeias de direitos humanos, além da Declaração Universal dos Direitos Humanos". 

Imigração "tratada como crime"

Ela denunciou à RFI que a imigração tem sido "tratada como crime", o que, "infelizmente, não é novidade, pois Portugal vem trilhando esse caminho há bastante tempo". Mariana afirma que o governo, empossado em março de 2024, tem adotado uma postura cada vez mais alinhada à extrema direita, cedendo a princípios racistas e xenófobos presentes na sociedade portuguesa.

Para a diretora do SOS Racismo, trata-se de um ataque flagrante às pessoas que escolhem viver e trabalhar no país. Enquanto os vistos Gold recebem tratamento privilegiado, políticas de imigração cada vez mais restritivas são aplicadas aos demais imigrantes. 

Imigrantes brasileiros lideram listas

O impacto econômico pode ser profundo. Brasileiros representam a maior força de trabalho estrangeira em Portugal, com presença marcante em setores essenciais. A restrição ao visto genérico pode gerar escassez de mão de obra e pressionar empresas que dependem de trabalhadores imigrantes. Segundo o Banco de Portugal, em 2024, brasileiros lideravam entre os estrangeiros empregados em quase todos os setores, exceto agricultura e pesca.

A Agência de Integração, Migrações e Asilo (AIMA) terá até nove meses para responder aos pedidos de reagrupamento familiar, ampliando o prazo atual de três meses. A nova lei também mantém o direito de recorrer judicialmente em caso de negativa, mas exige comprovação rigorosa dos vínculos com Portugal.

Para quem já vive em Portugal, a recomendação é buscar assessoria especializada e acompanhar as atualizações da legislação.

Brasileiros em Portugal enfrentam discriminação crescente

A presença brasileira em Portugal, que representa cerca de 15% da população imigrante no país, tem sido marcada por episódios recorrentes de discriminação, xenofobia e exclusão institucional. Embora os laços históricos e linguísticos entre os dois países sugiram proximidade, os dados revelam um cenário cada vez mais hostil para quem busca viver e trabalhar legalmente em território português.

Segundo a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR), o número de denúncias de xenofobia contra brasileiros aumentou 142% entre 2018 e 2021, totalizando 109 queixas formais. Os relatos incluem desde agressões verbais e físicas até dificuldades de acesso à moradia e oportunidades de trabalho. A comissão alerta para a subnotificação desses casos, indicando que o número real pode ser significativamente maior.

A Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância (ECRI) também aponta que os brasileiros são o grupo imigrante mais discriminado em Portugal. Em seu relatório de 2022, a ECRI revelou que 55% dos brasileiros residentes afirmam já ter sofrido algum tipo de discriminação, índice superior ao de outras comunidades lusófonas, como os do continente africano (33%). O documento recomenda que o governo português implemente políticas públicas com metas claras de inclusão e participação ativa da sociedade civil.

Outro estudo relevante é o relatório Migramyths, publicado pela Casa do Brasil de Lisboa, que analisa os mitos e estigmas associados à imigração brasileira. A pesquisa destaca que mulheres brasileiras enfrentam dupla discriminação — por gênero e por nacionalidade — especialmente em serviços públicos como centros de saúde. Os dados mostram que 56,8% das entrevistadas relataram episódios de xenofobia, enquanto 27,8% mencionaram preconceito linguístico.

Além da discriminação cotidiana, os brasileiros também enfrentam barreiras institucionais. Entre 2023 e 2024, o número de brasileiros impedidos de embarcar para Portugal aumentou 700%, passando de 179 para 1.470 pessoas, segundo dados divulgados pela imprensa portuguesa com base em registros da imigração. A justificativa oficial envolve questões documentais, mas especialistas apontam para um endurecimento das políticas migratórias e maior seletividade na entrada de estrangeiros.

RFI A RFI é uma rádio francesa e agência de notícias que transmite para o mundo todo em francês e em outros 15 idiomas.
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