França: apoio de Brigitte Macron a comediante acusado de estupro gera choque e críticas
A primeira-dama da França, Brigitte Macron, foi flagrada em um vídeo divulgado nesta segunda-feira (8) chamando de "vadias estúpidas" quatro feministas que interromperam o show de um humorista acusado de estupro. As reações foram imediatas.
"Eu sou uma 'vadia estúpida'. E espero que você também", escreveu nesta terça-feira (9), Marlène Thomas Decreusefond, no jornal Libération. A jornalista critica duramente Brigitte Macron por zombar abertamente de militantes feministas, usando termos grosseiros em francês ("sales connes").
As ativistas, que usavam máscaras com a palavra "estuprador", pararam o show de Ary Abittan, 51, aos gritos de "Abittan estuprador!", no último sábado (6). Em 2021, ele foi acusado de estupro por uma mulher, mas os investigadores arquivaram o caso dois anos depois, por falta de provas.
Brigitte Macron assistiu ao show no domingo com sua filha e conversou com Abittan antes de ele subir ao palco, segundo um vídeo divulgado pelo site Public.
"Estou com medo", diz Abittan. "Se houver vadias estúpidas aqui, vamos expulsá-las", responde Brigitte, em tom de brincadeira, usando expressões vulgares.
Decreusefond argumenta que a primeira-dama insultou "milhares de outras mulheres feministas". A jornalista acusa Brigitte Macron de ser uma voz feminina que defende a impunidade e de dar um "golpe adicional" à luta contra a violência sexual e os direitos das mulheres, que foi designada como a "grande causa do mandato de Emmanuel Macron".
Para Decreusefond, ser uma "vadia estúpida" define quem lembra que um arquivamento de caso (como o de Abittan) não significa inocência; quem denuncia a insuficiência da justiça (onde 92% das queixas de estupro são arquivadas sem seguimento); e quem luta pelas cerca de 277.000 vítimas anuais de agressões sexuais na França.
Reações do Coletivo e de Figuras Públicas
O coletivo feminista responsável pela interrupção, #NousToutes ("Todas Nós"), reagiu transformando o insulto em um símbolo de resistência. O coletivo converteu a palavra de baixo calão em uma hashtag, #salesconnes, que se tornou viral e foi massivamente compartilhada nas redes sociais, muitas vezes sobre um visual em fundo preto.
Uma militante do #NousToutes Paris Nord, identificada como Gwen, expressou profundo choque, classificando as palavras de Brigitte Macron como "extremamente chocantes" e um "tapa a mais nas vítimas e nas associações feministas". Outras figuras centrais da luta feminista e contra violências à mulher condenaram as declarações da primeira-dama.
O ex-presidente François Hollande criticou os comentários, ponderando que, embora a forma do protesto possa ser contestada, "não se pronunciam palavras dessa forma" quando se trata de mulheres que lutam contra a violência. A ecologista Marine Tondelier classificou a fala como "gravíssima" e imprópria para uma primeira-dama.
Em defesa de Brigitte Macron, sua equipe argumentou que as palavras eram apenas "uma crítica ao método radical usado por aqueles que interromperam o espetáculo".
Essa controvérsia se insere em um momento na França em que o presidente Emmanuel Macron já havia defendido o ator Gérard Depardieu (condenado em maio por agressão sexual) em 2023, afirmando que o ator era alvo de uma "caça às bruxas".
Com AFP