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Política

Não é só condenados por golpe: PL da Dosimetria pode beneficiar condenados por crimes como exploração sexual

Ao Terra, penalistas destrincham o projeto de lei apresentado pelo Senado com o intuito de aliviar penas de Bolsonaro e a aliados

17 dez 2025 - 04h59
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Jair Bolsonaro está preso há três semanas na superintendência da Polícia Federal em Brasília.
Jair Bolsonaro está preso há três semanas na superintendência da Polícia Federal em Brasília.
Foto: Wilton Junior/Estadão / Estadão

Como alternativa à anistia para os envolvidos no 8 de Janeiro, a Câmara dos Deputados aprovou o "PL da Dosimetria". O projeto altera as leis Penal e de Execução Penal para reduzir as penas do ex-presidente Jair Bolsonaro, de seus aliados e de manifestantes condenados. No entanto, especialistas alertam que a medida pode "estourar a bolha" e beneficiar condenados por outros crimes, gerando efeitos colaterais imprevistos no sistema prisional.

As brechas do projeto foram identificadas até por aliados do ex-presidente. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), por exemplo, defendeu ajustes na proposta para evitar que ela beneficie "marginais de verdade". Nesta quarta-feira (17), a matéria segue para análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, sob forte divergência sobre seu futuro.

Mas, afinal, o que propõe o PL da Dosimetria?

Há quatro tópicos centrais.

  • “Regra geral” para progressão de pena

O projeto altera a lógica da progressão de penas no Brasil — o sistema que permite ao preso passar do regime fechado para o semiaberto ou aberto. Atualmente, a regra mais branda (cumprimento de 16% da pena) é reservada apenas a crimes sem violência ou grave ameaça. O novo PL inverte essa lógica: os 16% passam a ser a regra geral para quase todos os delitos.

Embora o texto cite exceções como crimes hediondos, milícia e feminicídio, ele deixa de fora uma vasta lista de infrações. Por mais que a lista possa parecer grande, há muitos outros crimes destrinchados na Parte Especial do Código Penal – incluindo o último título, o 12, que diz respeito aos crimes contra o Estado Democrático de Direito. Trecho esse que foi incluído no Código Penal em 2021, com sanção do então presidente Jair Bolsonaro.

“O Direito Penal é um direito legalista. Se não está na lei, não houve. Se não estiver na lei, você não pode aplicar”, explica  Cristiano Lázaro, mestre, professor Universidade Católica de Salvador (UCSal) e advogado criminalista. Ou seja, conforme avalia, para todos os demais crimes que não constam nas exceções, o que passa a ser aplicado é a regra geral de 16%. E nessa mudança não são apenas os crimes contra o Estado que são beneficiados.

Se aprovado este texto, como cita o especialista, condenados por exploração sexual e favorecimento à prostituição, por exemplo, poderão progredir para uma pena mais branda a partir do cumprimento de 16% da pena, assim como condenado por coação no curso do processo também podem ser beneficiados.

  • Remição da pena em regime domiciliar

O PL da Dosimetria também propõe uma alteração pontual no Artigo 126 da Lei de Execução Penal que impactaria diretamente a situação de Jair Bolsonaro. O foco é a remição, benefício que permite reduzir o tempo de sentença por meio de trabalho ou estudo. Atualmente, a regra geral prevê o abatimento de um dia de pena para cada três dias trabalhados ou para cada doze horas de estudo.

A questão é que, como aponta o penalista Cristiano Lázaro, isso vale para regimes fechados, semiabertos e aberto – visto que, no geral, a prisão domiciliar é um substitutivo da prisão preventiva. 

Já o PL da Dosimetria quer acrescentar um novo parágrafo no artigo dizendo que “o cumprimento da pena restritiva de liberdade em regime domiciliar não impede a remição da pena”. Ou seja: pode passar a ser possível conseguir a diminuição da pena por meio de estudo e trabalho também quando a pessoa estiver em regime domiciliar. “Não há comparativo na nossa legislação sobre isso”, aponta o especialista.

  •  Crimes no mesmo contexto

A terceira parte do projeto foca em crimes cometidos em um mesmo contexto, especificamente contra as instituições democráticas. É neste capítulo que se encontram os dois principais delitos atribuídos a Jair Bolsonaro e seus aliados: Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito (4 a 8 anos de reclusão) e Golpe de Estado (4 a 12 anos).

Atualmente, as penas desses crimes são somadas. O PL da Dosimetria, contudo, propõe aplicar a regra do Artigo 70 do Código Penal, que proíbe essa soma. Em vez disso, considera-se apenas a pena do crime mais grave, com um aumento de um sexto até a metade.

Para ilustrar, essa regra é semelhante ao que ocorre em acidentes de trânsito: se um motorista causa a morte de vários passageiros sem intenção, ele não responde pela soma de todos os homicídios, mas por um só com pena aumentada. A grande polêmica do PL é que ele exige essa unificação mesmo que haja “desígnio autônomo”, ou seja, mesmo que o agente tenha tido a intenção clara de cometer cada um dos crimes.

A eficácia desse trecho é debatida, pois o Supremo Tribunal Federal (STF) já entendeu que as ações de Bolsonaro e seus aliados foram atuações distintas, e não um contexto único. Apesar disso, Frederico Horta, professor de Direito Penal da UFMG, avalia que a medida cria um tratamento mais benéfico que pode funcionar como um "furo no balão": “Tente a se espalhar por força de um princípio de igualdade”.

Para Horta, essa mudança pode representar um progresso no sistema. “Considero que isso leva realmente a penas mais racionais, penas proporcionais, penas adequadas. Estamos vivendo um período de populismo penal, em que está se ampliando penas simplesmente para dar satisfações à opinião pública, sobrecarregando o sistema penitenciário e sacrificando vidas sem que isso represente nenhum ganho em termos de controle da criminalidade em termos de prevenção do crime”, avalia.

Além disso, para ele, essa forma de aplicabilidade "corrige o exagero enquanto aplaca o tipo de discurso de exceção e de retrocesso". “Porque tira o discurso de quem defende a impunidade a pretexto de fazer Justiça, de combater uma injustiça. Eu acho que se a gente tiver um tratamento mais proporcional do concurso de crimes, para esse e para outros casos, isso vai ser um avanço”, complementa.

  • Contexto de multidão

Por fim, o projeto introduz um atenuante específico para os crimes contra as instituições democráticas: o contexto de multidão. Caso o PL seja aprovado, as penas para Abolição Violenta do Estado e Golpe de Estado devem ser reduzidas de um terço a dois terços, “desde que o agente não tenha praticado ato de financiamento ou exercido papel de liderança”.

Esse trecho, então, teria como intuito aliviar a pena das pessoas que invadiam as sedes dos Três Poderes nos atos de 8 de Janeiro.

E agora?

O projeto de lei da Dosimetria foi aprovado na madrugada da última quarta-feira, dia 10, na Câmara dos Deputados. O placar geral foi de 191 a favor, 148 contra e uma abstenção e agora segue para o Senado Federal, passando pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e podendo ir à plenária. 

Caso tenha qualquer alteração no texto, ele precisa retomar à Câmara para ser novamente aprovado, e depois volta novamente ao Senado. Se aprovado no Senado, o texto parte para a Presidência -- que pode tanto transformar o projeto em lei quanto vetá-lo parcialmente ou integralmente.  

Se o Lula vetar partes do texto, o projeto volta para análise das Casas Legislativas. Já se o veto for total, a decisão pode ser derrubada por maioria no Senado e na Câmara.

Se o PL da Dosimetria for aprovado, passa a ter peso de lei. O que pode acontecer, como alertado pelos especialistas, é que o Supremo pode ser provocado para avaliar a legitimidade constitucional da lei. Nisso, a lei pode ser suspensa até a discussão final da Corte sobre a sua legalidade ser finalizada. 

Jair Bolsonaro foi condenado a 27 anos e três meses de prisão, tido como líder da tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. Conforme o que foi determinado pela maioria do Supremo, serão 24 anos e 9 meses em reclusão (regime fechado) e 2 anos e 9 meses em detenção (ou seja, em regime semiaberto ou aberto). 

Ele estava em prisão domiciliar desde agosto devido a outro processo, depois foi preso preventivamente em 22 de novembro por violação da tornozeleira eletrônica e só passou a cumprir a pena do caso da trama golpista a partir de 25 de novembro, quando o STF deu o processo como transito em julgado e Moraes determinou o início do cumprimeiro da pena. 

Lula diz que Bolsonaro ‘tem que pagar pelo que fez', mas afirma não ter decisão sobre PL da Dosimetria:
Fonte: Portal Terra
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