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Racismo não pode ser aceito como opinião ou mero gosto pessoal

Adolescente viraliza opinando sobre não gostar de boca grande e cabelo crespo. Isso tem nome e não é "gosto pessoal"

7 jun 2024 - 10h58
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Desvalorizar e criticar feições ligadas à negritude não é opinião ou gosto, é racimos mesmo
Desvalorizar e criticar feições ligadas à negritude não é opinião ou gosto, é racimos mesmo
Foto: Imagem de freepik

Que o racismo é estrutural, permeia nosso subconsciente e é alimentado em diversas esferas sociais, isso quem me acompanha já está cansado de saber. A questão que vem se tornando latente é que, aparentemente, a cada dia que passa, as pessoas estão voltando a ser racistas de maneira mais escancarada.

E para ser bem sincero, isso nem me surpreende muito porque já faz um tempo que ser racista gera muito engajamento. Não só por quem compartilha criticando, mas também pelo fato de muitos racistas se identificarem e se reconhecerem em falas racistas. Coisas como "gosto não se discute", "é só minha opinião" e liberdade de expressão são só maneiras covardes de racistas se manifestarem explicitamente.

Uma adolescente de 15 anos publicou um vídeo em rede social em que fala sobre o visual de uma pessoa negra. Ela diz que não gosta de boca grande e de cabelo crespo. Ela ainda afirma que não cita nome de ninguém e que está expressando sua opinião. E "se você achou ruim, é só passar o vídeo", diz. Não é bem assim, não. 

Bobo quem pensa que gosto é algo que você já nasce com ele. O gosto é 100% uma construção social que vai se alterando a depender de que momento da história você vive.

Em momentos de escassez alimentar, uma pessoa gorda era o ideal de beleza, já que a gordura era sinal de fartura e vida boa. Mulheres de quadris grandes já foram o ideal de beleza, porque se via nelas a parceira ideal para reprodução e até o pênis pequeno das estátuas gregas eram feitos daquele jeito porque era símbolo de inteligência e pênis grande, sinônimo de barbárie.

Falando de Brasil, podemos trazer alguns  pontos de por que as pessoas não gostam de gente preta e de traços que remetem à negritude. E aí não tem jeito, temos que ir na escravidão e lembrar que durante 400 anos pessoas negras eram animais, objetos, coisas, que só serviam para trabalho, reprodução e castigo.

Tudo que era negro era rejeitado socialmente, afinal ninguém queria aquele local. E era tudo mesmo: religião, costumes, corpos, cultura e o fenótipo. Em contrapartida, tudo que era branco era ideal. Os monarcas eram brancos, os estudados eram brancos e, o mais importante, os que escravizavam eram brancos.

Hoje, o Brasil tem menos tempo sem escravidão do que com escravidão, logo, várias cicatrizes daquele momento são vistas até hoje. Pretos continuam sendo a maioria à margem, enquanto brancos seguem sendo os mais abastados. Isso se reflete por exemplo nos galãs de novelas, nos príncipes e princesas e em todo produto da indústria cultural, que é uma aliada fortíssima do racismo.

Fora isso, temos também o imperialismo em que vivemos, que tudo que importamos são de sociedades majoritariamente brancas. Então a cultura, música, mídia, informação e outras coisas que consumimos vêm da Europa e dos Estados Unidos, que são regiões de gente branca, que produzem muito conteúdo onde brancos são protagonistas.

Então, não! Não é gosto. Tão pouco só uma opinião. É puro suco de racismo. Racismo esse que as pessoas não estão nem um pouco interessada em contrapor. Para essa galera, racismo é só chamar preto de macaco. Elas não estão preocupadas com todas nas nuances do racismo, até porque, para muitas delas, isso não faz a menor diferença.

Quando você só vê beleza no cabelo mole, na brancura, no nariz grande afilado, isso não quer dizer que você tem um gosto pré-determinado por Deus. Isso quer dizer que você foi tão alimentado pelo fenótipo branco sendo ligado ao que é belo, próspero e ideal que você rejeita o que se opõe a ele.

E, falando de Brasil, temos o negro sendo visto como oposto do branco, e é por isso que é comum vermos a rejeição a pessoas negras sendo resumida a gosto quando, na verdade, é toda uma estrutura racista que tem como objeito deixar pessoas negras à margem da sociedade para que sigamos pensando que só a brancura tem valor.

Fonte: Luã Andrade
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