Justiça nega indenização a produtor cultural preso injustamente por 363 dias
Juíza Maria Paula, da 4ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do RJ, alegou que a prisão de Ângelo Gustavo não foi ilegal
A 4ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) negou o pedido de indenização por danos morais e materiais ao produtor cultural Ângelo Gustavo Pereira Nobre e sua mãe, Elcy Leopoldina Pereira de Souza, protocolado pela defesa do jovem. Gugu, como é chamado, ficou 363 dias preso injustamente em 2020, após ter sido reconhecido por uma vítima de roubo em uma foto nas redes sociais.
Na ocasião, Ângelo Gustavo foi acusado de participar do roubo de um carro, mas foi absolvido durante uma audiência virtual do Quarto Grupo de Câmaras Criminais do TJ-RJ, onde a justiça admitiu que o rapaz era inocente.
A defesa de Ângelo havia entrado com uma ação pedindo a condenação do Estado com o pagamento de danos morais pelo sofrimento vivenciado e do trauma sofrido, sendo R$ 500 mil ao produtor diretamente e R$ 250 mil à sua mãe, além de danos materiais resultantes dos danos emergentes sofridos pela pausa de 1 ano de trabalho e tratamento psicológico.
A juíza Maria Paula Gouvea Galhardo, responsável pela análise do processo, alegou que é preciso comprovar a má conduta na condução do processo criminal, já que na época da prisão ainda era considerado condenações baseadas em retrato falado, diferentemente da orientação atual no Judiciário do Rio de Janeiro.
"Reconhecimento por fotos de negros, quase todos pobres, acusados de crime, é rotina na polícia, prestigiada pelo Ministério Público, contando com a complacência do Judiciário em todos os níveis e instâncias. No dia em que houver punição do policial, do promotor e do juiz, desembargador e ministro, talvez tenhamos um outro horizonte para pôr fim ao descaso com a liberdade da população menos favorecida" disse João Tancredo em entrevista ao portal Metrópoles.
Segundo a magistrada, apenas em 2020 a condenação baseada exclusivamente no reconhecimento da vítima passou a ser questionada, "de tal modo que não se pode concluir pela ilegalidade do julgamento anterior à mudança de entendimento jurisprudencial", concluiu a juíza.
Em conversa com a Alma Preta Jornalismo, Ângelo Gustavo informou que seu advogado entrou com apelação em segunda instância e, caso a resposta seja negativa, pretende seguir para a terceira e última instância do Poder Judiciário. "Como é que a Justiça assume que errou e não me indeniza?", questiona o produtor.
"A luta é grande. Nunca foi fácil, não vai ser agora. Mas a gente vai ganhar! A próxima publicação será 'Gustavo vence na Justiça pela segunda vez'. A gente tem que fazer isso para dar exemplo para os outros", disse confiante.
Gugu acredita que a decisão é importante para pessoas com casos semelhantes, mas que não têm força para sozinho "lutar contra o sistema".
O caso
Ângelo Gustavo Pereira Nobre, conhecido como Gugu, foi detido em 2 de setembro de 2020 sob suspeita de ter roubado um carro no bairro do Catete, zona sul do Rio de Janeiro, em 2014. A família e a Comissão de Direitos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) afirmaram que o rapaz era inocente e listaram erros e falhas no reconhecimento feito durante a investigação do caso.
Entre as provas estava a recuperação de uma cirurgia no pulmão que Gugu havia feito e, no momento do crime, ele participava de uma missa em memória de um amigo falecido. Além disso, durante o retrato falado, a vítima afirmou que não havia conseguido enxergar bem o rosto do suspeito, mas garantiu que fosse Gustavo.
História inspirou videoclipe
A história de Gugu foi usada como inspiração no videoclipe da música "Dessa Vez Não Deu", do artista Gush. Na obra, o produtor faz uma declaração sobre a maioria das pessoas presas injustamente serem pretas, junto de cortes da cobertura do seu caso em veículos televisivos.
Assista abaixo, na íntegra:
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