Rafael Câmara: Temos um campeão. Mas também é preciso calma
Rafael Câmara é o cara do momento e as expectativas ficam altas após o título da F3. Mas é preciso MUITA calma para tudo ir água abaixo.
Além da ótima prova de Gabriel Bortoleto na Hungria, o último final de semana marcou o título de Rafael Câmara na F3, uma das categorias de acesso à F1. O jovem pernambucano conquistou o campeonato com uma prova de antecedência e de uma forma convincente perante à concorrência e mídia especializada.
Até o início deste ano, Rafael Câmara era conhecido basicamente em circulos restritos do público brasileiro, até mesmo pouco entre o pessoal que cobre automobilismo, mas tendo atenção de vários abnegados que acompanham a chamada "base" (alguns até apelidados´jocosamente de "sommeliers de base"). Se sabia que o recifense tinha tido uma boa campanha no kart, sendo vice-campeão no mundial da OK Junior em 2019 e no europeu em 2021. Neste mesmo ano, participou das seletivas da Academia de Pilotos da Ferrari e foi escolhido para participar das fileiras do programa de formação de pilotos.
A partir daí, Câmara partiu para os monopostos, atuando na F4. Já foi para a Oriente Médio, a Italiana e a Alemã. Nelas, foi vice na primeira e terceiro nos outros dois campeonatos. Aqui, já teve que encarar nomes como Alex Dunne, Luke Browning, Taylor Barnard, Martinius Stenshorne e um tal de Kimi Antonelli...
Antonelli seguiu no caminho de Câmara na Regional do Oriente Médio na Europeia em 2023, sendo companheiros na PREMA. O italiano venceu os dois campeonatos, mas o brasileiro andou próximo. A Ferrari sabia o que tinha nas mãos e optou por manter Câmara na Regional Europeia em 2024. O recifense ainda fez a Regional do Oriente Médio e ficou atrás de seu companheiro de Academia Tuukka Taponen e Taylor Barnard. Mas venceu a Europeia batendo o ex-integrante do programa italiano, James Whearton.
A subida para a F3 era natural. A ida para Trident foi vista com bons olhos, dado o histórico do time na categoria, ainda mais em um momento de introdução de um novo carro. E a F3 vinha com uma escalação muito forte, considerada por muitos com melhores perspectivas do que a F2.O resultado veio e agora Rafael Câmara é o nome do momento.
Natural todo o entusiasmo em torno em nome de Câmara e o público que acompanha automobilismo teve contato com este compatriota, que garantiu o terceiro título brasileiro seguido nas categorias de base da F1 (começou com Felipe Drugovich na F2 em 2022). O que Rafael Câmara conseguiu não foi pouco e tem que ser valorizado.
Mas como diz o velho meme: Torcedores, calma.
Porém, ao mesmo começaram vozes elevando o recifense a "sucessor de Lewis Hamilton na Ferrari". Veículos como o Estadão e Veja cairam neste sentido e começaram a jogar lenha nesta fogueira . Uma coisa é Rafael Câmara fazer parte da Academia de Pilotos da Ferrari e mostrar muito talento até aqui. Outra, é ser pintado como postulante imediato a titular no time italiano.
É importante sim fazer com que um público não acostumado ao dia-a-dia do meio possa entender o contexto. Porém, carregar nas tintas pode ser uma simplificação muito forte ou até mesmo cair em um oportunismo da situação. Mas já é começar a colocar peso em um piloto que está em um ótimo caminho e, que se as condições permitirem, pode chegar lá.
O Brasil ficou mal acostumado a praticamente 30 anos ininterruptos de pilotos de alto nível, disputando títulos e vitórias. Quando Felipe Drugovich e Gabriel Bortoleto surgiram nos últimos tempos com perspectivas de chegar à F1, o discurso de alguns era basicamente este: vamos ter calma para não queimas expectativas. Mas uma parte considerável resolveu lançar combustível na torcida, com uma parcela indo a uma quase cegueira.
Este artigo não quer balizar como o público deve torcer. Longe disso. Afinal de contas, sem ilusão não se vive, muito menos sem empolgação. Mas é uma singela tentativa de colocar as coisas em uma perspectiva mais realista. Rafael Câmara tem chances de fazer muito ainda. Se o acordo com a Invicta Racing for confirmado para a F2 em 2026 (está muito bem encaminhado), podemos esfregar as mãos.
Mas a torcida principal é para fazer um bom ano e confirmar a visão de que o brasileiro é um piloto com material para chegar na F1. Hoje, na fila da Ferrari, há Oliver Bearman. Se tudo der certo, Rafael Câmara estará pronto para entrar na F1 em 2027. Vendo o histórico italiano, dificilmente pode entrar no time principal. Tivemos o exemplo de Felipe Massa, que é considerado o Marco Zero da Academia Ferrari, que fez sua estreia na Sauber em 2002, para depois só ir para o time principal anos depois. Mas por que não em outro time? Se a qualidade aparecer e o estilo de pilotagem se consolidar, as chances aparecem naturalmente.
Até porque a situação de Lewis Hamilton na Ferrari termina em 2026 em princípio. O que vem depois, não se sabe. Se o inglês realmente sai, qual seria a ação? Promover Bearman se este evoluir ou ir ao mercado? Por enquanto, trata-se de pura futurologia.
Se for para tratar de futuro, vamos focar no nosso Rafael Câmara para que tudo corra bem e assim possamos ter mais brasileiros no grid da F1, confirmando a nossa tradição na categoria. O resto é simplesmente o resto e deixemos o destino cumprir o seu caminho....