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Ações da Anatel contra pirataria acabarão com “gatonet” no Brasil?

O Brasil tem atualmente de 5 milhões a 7 milhões de aparelhos clandestinos. Fontes dizem a Byte, porém, que efeito a longo prazo é incerto

17 mar 2023 - 05h00
(atualizado às 09h50)
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Ação deverá ter algum impacto sobre a pirataria de TV no Brasil, mas o efeito a longo prazo ainda é incerto
Ação deverá ter algum impacto sobre a pirataria de TV no Brasil, mas o efeito a longo prazo ainda é incerto
Foto: André Borges/Estadão Conteúdo

O Brasil tem atualmente de 5 milhões a 7 milhões de aparelhos clandestinos de sinal de TV por assinatura, segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). É um problema antigo, mas nas últimas semanas recebeu um de seus maiores golpes, com a ordem da agência para cortar o acesso de TV boxes clandestinas, ou "gatonets", ao sinal pirata dos canais pagos. 

O plano conta com a colaboração da Receita Federal, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e outros órgãos fiscalizadores federais e estaduais. A ação deverá ter algum impacto sobre a pirataria de TV no Brasil, mas o efeito a longo prazo ainda é incerto, segundo fontes a Byte.

A estratégia da Anatel consiste em exigir às prestadores de serviços de telecomunicações que cortem o acesso ou o redirecionamento do conteúdo ilegal de TV. Também manda bloquear as chaves de criptografia do Serviço de Acesso Condicionado — que consiste em pacotes de canais por diversos meios eletrônicos e protocolos de comunicação.

A agência repassa às operadoras de comunicação uma lista com os endereços IPs (protocolo de internet, em inglês) dos servidores responsáveis por piratear o conteúdo para os modelos de TV boxes que não possuem homologação junto à Anatel.

Estes IPs, portanto, são bloqueados com o intuito de enfraquecer a cadeia do serviço ilícito sem atingir legalmente o usuário. Até o momento, a agência tem informado que parte do público já sente a queda dos canais consumidos dessa forma.

As ações contam ainda com a apreensão e retirada de circulação de milhões de unidades desses aparelhos considerados ilegais.

Desde 2018, com a criação do Plano de Ação de Combate à Pirataria (PACP) foram retirados mais de 6,5 milhões de equipamentos não certificados de circulação, dos quais 1,4 milhão estavam relacionados à pirataria de conteúdo audiovisual. 

O que muda? 

Em entrevista a Byte, o superintendente de Fiscalização da Anatel, Hermano Barros Tercius, afirma que ações contra a pirataria ocorrem no Brasil desde a criação da agência. Mas as novas medidas anunciadas em 2023 foram implementadas conforme a evolução da tecnologia, do mercado e das práticas dos fraudadores. 

“Com a aprovação do Plano de Ação para Combate a Decodificadores Clandestinos do SeAC (Serviço de Acesso Condicionado, nome técnico da TV por assinatura), a Anatel passou a atuar junto àqueles equipamentos não homologados presentes nas casas dos usuários”, disse.

“Importante destacar que, apesar de ser possível, não se está buscando responsabilizar legalmente ao usuário, mas sim inviabilizar o serviço de um provedor ilegal de conteúdo audiovisual”, acrescentou o representante da Anatel. 

Propósito da Anatel é permitir que provedores piratas possam bloquear o acesso a esses servidores, inibindo a prática da pirataria
Propósito da Anatel é permitir que provedores piratas possam bloquear o acesso a esses servidores, inibindo a prática da pirataria
Foto: Reprodução / PxHere

Ações determinam o fim do gatonet no Brasil?

Questionada por Byte se as novas medidas dão fim à pirataria audiovisual, a Anatel afirmou que “o objetivo do Plano de Ação para Combate aos Decodificadores do SeAC é minimizar os riscos físicos e lógicos aos usuários e às redes de telecomunicações pelo uso de equipamentos não homologados, assim como suportar ações de combate sobre pirataria de conteúdo audiovisual”. 

Uma reportagem do UOL revelou que "gatonets", continuam sendo usados nas favelas do Rio de Janeiro. Um dos fornecedores ilegais, que preferiu não se identificar, afirmou que tem cerca de 2.000 clientes.

Para Yuri Melo, professor e doutor em Engenharia da Computação da Universidade Federal do Ceará (UFC), apesar de possibilidades de surgirem novas formas de pirataria, a estratégia da Anatel representa um importante passo. 

“O propósito é permitir que provedores de grande porte possam bloquear o acesso a esses servidores, inibindo a prática da pirataria. Todavia, a utilização de técnicas como proxy, mudança de servidor ou VPN podem burlar essa medida, tornando difícil o rastreamento e o bloqueio de cada um dos endereços”, destacou. 

O advogado Jorge Bacaloni, gerente regional de antipirataria da Vrio Corp (empresa formada pela Directv, Sky e a plataforma de streaming DGO) ressalta que as ações da Anatel são necessárias mas devem ser associadas a outras.

"O problema da pirataria também tem outras arestas que devem ser enfrentadas além da fiscalização, como estratégias de longo prazo voltadas à educação e conscientização da população. Sempre por meio da união de esforços do poder público e da iniciativa privada”, disse. 

A Vrio Corp realiza diversas ações contra a pirataria, com consultorias e investigações para pesquisar, coletar e denunciar transmissões ilegais e infratores. 

Bacaloni ainda destacou um estudo da consultoria Ipsos em diversos países latinos, que apontou um salto recente na oferta e consumo online de conteúdos ilegais. Um dos principais motivos para isso, diz, foi o isolamento social causado pela pandemia de covid-19. 

O comércio ilegal

Em média, uma TV por assinatura custa mais de R$ 70 por mês. No gatonet, a depender do "negócio", o cliente compra a TV box e paga uma taxa única para a liberação do sinal ilegal, que varia de R$ 40 a R$ 300 e inclui uma gama de 250 canais em média. 

Pessoas que comercializam este aparato afirmaram a Byte que estão preocupadas com as novas medidas e estimam uma queda em 80% das vendas.

“Com certeza vai impactar. Eu mesmo ia comprar e desisti, porque se eles fizerem esse bloqueio do sistema, você não vai conseguir mais acessar nem na TV e nem na plataforma do aparelho”, disse um comerciante, que preferiu não se identificar.

Semelhantes às boxes de algumas operadoras de celular, os aparelhos funcionam com decodificadores que abrem os sinais de satélites para acessar conteúdos pagos das empresas de mídia.

“Esse bloqueio impede que o sinal seja transmitido, todas as programações, todos os canais fechados serão impedidos, então vai ser bem impactante, as vendas vão cair tipo 80%. Até o momento, pelo que sei, não tem nada que consiga driblar o sistema, perguntei para colegas e ninguém sabe”, acrescentou o vendedor.

Cliente compra a TV box e paga uma taxa única para a liberação do sinal ilegal, que varia de R$ 40 a R$ 300
Cliente compra a TV box e paga uma taxa única para a liberação do sinal ilegal, que varia de R$ 40 a R$ 300
Foto: Poder360

Riscos do gatonet

Segundo a Anatel, a pirataria prejudica empresas e consumidores de muitas formas. Alguns exemplos disso são a interferência nas redes de telecomunicações e os danos às empresas que oferecem TV por assinatura legalmente.

Há até mesmo o risco à segurança física e dos dados dos usuários. Aparelhos clandestinos podem ter pouca segurança em seu hardware e permitir acesso ilegal de hackers, que podem obter dados pessoais dos clientes como senha de internet e localização física da residência.

“Por meio da promessa de conteúdo gratuito ou a preços muito baixos e utilizando-se de equipamentos não certificados, os usuários acabam caindo nos argumentos de vendedores  e, na maioria das vezes, ignoram que estão correndo riscos físicos e de seus dados”, disse o superintendente da Anatel.

Como as empresas podem atuar?

Para combater a pirataria de conteúdo, as empresas de TV a cabo têm à disposição diversas técnicas como o uso de criptografia (uma cmada extra de segurança) de sinal mais robusta. Isso impede que o sinal de TV seja capturado e distribuído ilegalmente, explicou Yuri Melo, da UFC.

“Além disso, é possível adotar sistemas de autenticação de usuário mais sofisticados, como senhas e códigos de acesso, a fim de garantir que apenas os assinantes autorizados tenham acesso ao conteúdo disponível”, afirmou o engenheiro.

Perdas anuais de R$ 15 bilhões

Segundo estimativas da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA), com base em dados da Anatel e do IBGE, a pirataria de conteúdos de TV por assinatura provoca perdas anuais de R$ 15 bilhões, que poderiam ser investidos no setor e gerar impostos para o estado. 

“Além disso, a pirataria ameaça empregos, financia o crime organizado e coloca em risco a segurança cibernética dos usuários”, disse a ABTA em entrevista a Byte. A associação tem como associados grandes empresas do ramo de TV a cabo no Brasil.

A entidade elogiou ressaltou as últimas ações do governo federal, como a Operação 404, coordenada pelo Ministério da Justiça e por polícias civis estaduais, e que teve sua quinta fase realizada nesta terça-feira (14). Mais de 250 sites e aplicativos de conteúdo audiovisual irregular foram bloqueados, e a polícia efetuou 11 prisões em flagrante em oito estados.

Fonte: Redação Byte
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