O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso da trama golpista que está sendo julgada pela Primeira Turma no Supremo Tribunal Federal, afirmou que Jair Bolsonaro sempre foi o "ponta de lança do discurso populista que caracteriza novas ditaduras no mundo todo". Sua fala foi feita durante o voto da ministra Cármen Lúcia, a decana do grupo, nesta quinta-feira, 11, que formou maioria pela condenação do ex-presidente e de outros sete aliados por golpe de Estado.
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Moraes aponta que de meados de junho de 2021 ao 8 de janeiro de 2023, o discurso elavancado por Bolsonaro foi o mesmo: o de fraude nas urnas, de deslegitimação da Justiça Eleitoral e do Poder Judiciário, da necessidade de intervenção militar e da perpetuação no poder.
"Essa organização criminosa liderada por Jair Messias Bolsonaro tentou simplesmente se apoderar do Estado", disse Moraes. O objetivo do discuso, para Moraes, era claro. E por mais que não tenham alcançado, "fizeram atos executórios e consumaram os crimes".
O aparte de Moraes durante o voto de Moraes acontece como um contraponto após a manifestação do ministro Luiz Fux, que votou pela absolvição de Bolsonaro de todos os crimes analisados pela trama golpista e afirmou que não houve tentativa de golpe durante as mais de 14 horas de fala na quarta-feira, 10, divirgindo da posição do relator.
Mais sobre o julgamento
O julgamento teve início na terça-feira passada e, agora, caminha para o seu quinto dia de sessões nesta quinta-feira, 11.
As sessões já contaram com a leitura do relatório geral por parte de Alexandre de Moraes, relator do caso; a manifestação do procurador-geral da República, Paulo Gonet, que reforçou a denúncia; e o pronunciamento final da defesa dos oito réus. Agora, nesta semana, é a vez dos ministros votarem pela condenação, ou não, dos envolvidos tidos como "núcleo crucial" do plano de golpe de Estado.
São réus no processo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL); ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, Walter Braga Netto; ex-ajudante de ordens Mauro Cid; almirante de esquadra que comandou a Marinha, Almir Garnier; ex-ministro da Justiça, Anderson Torres; ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno; o general e ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira; e o deputado federal e ex-presidente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) Alexandre Ramagem (PL-RJ).
Em relatório final, emitido em julho, a Procuradoria-Geral da República pediu a condenação dos réus (com exceção de Ramagem) pelos crimes:
- Organização criminosa armada – pena de 3 a 8 anos de prisão, podendo chegar a 17 anos se houver uso de arma de fogo ou participação de funcionário público;
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito – pena de 4 a 8 anos de prisão;
- Golpe de Estado – pena de 4 a 12 anos de prisão;
- Dano qualificado pela violência ou grave ameaça – pena de seis meses a 3 anos de prisão;
- Deterioração de patrimônio tombado – pena de 1 a 3 anos de prisão.
As penas máximas somadas podem chegar a 43 anos. Vale ressaltar especificidades que podem pesar em uma possível condenação dos réus: Bolsonaro, para além de denunciado pelos crimes, é apontado como líder da organização criminosa e Mauro Cid deve ter a pena reduzida devido a seu acordo de colaboração premiada com a Polícia Federal.
Já Alexandre Ramagem (PL-RJ), deputado federal e ex-presidente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) que também é réu, é o único acusado por apenas três desses cinco crimes: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.
Alexandre de Moraes (relator do caso) começou os votos da Primeira Turma, votando pela condenação de todos os acusados. Em sua fala, ele elencou 13 atos para explicar a trama golpista em julgamento e traçou uma linha do tempo do "golpismo", que interligaria os réus e os crimes em questão. Para ele, a organização criminosa -- liderada por Bolsonaro --, mostrou que "não sabe que é um princípio democrático republicano a alternância de poder".
"Quem perde vira oposição e disputa as próximas eleições. Quem ganha assume e tenta se manter [no poder], mas pelo voto popular. Não tenta se manter utilizando órgãos do Estado. Não tenta se manter coagindo, ameaçando gravemente, deslegitimando o poder judiciário de seu País, a justiça eleitoral", declarou, em trecho de seu voto.
Na sequência votou Flávio Dino, que acompanhou o relator. Dino votou pela condenação de Jair Bolsonaro e outros sete aliados por todos os crimes, mas adiantou um ponto com relação a como imagina as penas: para ele, não há a menor dúvida de que os “níveis de culpabilidade” são diferentes entre os réus – e três deles podem ter “possibilidade de redução de pena abaixo do mínimo legal”.
“Concorre para o crime na medida de sua culpabilidade”, ressaltou Flávio Dino, ao explicar sobre o assunto. Nisso, para ele, tem “participação de menor importância” nos crimes julgados pela ação penal os réus Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-presidente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência); Augusto Heleno, ex-ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional); e Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-ministro da Defesa.
Depois, na quarta-feira, foi a vez de Luiz Fux. A sessão estava prevista para durar três horas, das 9h às 12h, mas Fux acabou levando 14 horas para concluir seu voto. Fux se mostrava voz destoante entre os demais ministros da Primeira Turma e assim seguiu, votando pela absolvição de Jair Bolsonaro, assim como dos réus Almir Garnier, Alexandre Ramagem, Sérgio Nogueira, Augusto Heleno e Anderson Torres.
Em paralelo, Fux votou pelas condenações de Mauro Cid e Walter Braga Netto – mas apenas pelo crime de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito. Com relação aos outros quatro crimes imputados pela PGR, ele votou para absolvê-los. O ministro, ainda, ao retomar as preliminares, apontou incompetência da Primeira Turma em julgar a ação penal.
Nesta quinta-feira, 11, votou Cármen Lúcia, que formou maioria pela condenação dos réus. Ainda falta votar Cristiano Zanin (presidente da Turma). Não há limite de tempo pré-definido para os votos de cada ministro.
A Primeira Turma votar pela condenação de réus não significa que eles serão presos imediatamente. Isso porque eles ainda podem apresentar recursos --que podem pesar mais ou menos, a depender do placar do júri. A execução de uma eventual pena só pode acontecer após ser dado “trânsito em julgado”, ou seja, quando são esgotados todas as possibilidades de recursos.
Jair Bolsonaro está em prisão domiciliar desde o dia 4 de agosto, mas devido um processo que corre paralelamente no STF. No caso, se trata do inquérito que aponta que as ações do deputado Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos, com o apoio do ex-presidente, tiveram como objetivo pressionar o Supremo a desistir da ação penal da trama golpista. Nisso, ambos foram indiciados pelos crimes de coação no curso do processo e abolição do Estado Democrático de Direito.