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“Vão te prender”: os 30 anos da primeira CPI contra o funk e a repressão aos bailes

CPI de deputados cariocas começou em 1995, mesmo ano em que um vereador do Rio de Janeiro apresentou a primeira lei em defesa dos bailes

2 out 2025 - 04h59
(atualizado em 2/10/2025 às 07h47)
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Resumo
A primeira CPI contra o funk, em 1995, destacou a repressão cultural e policial aos bailes no Rio, e relatório final cobrou responsabilidades do poder público; 30 anos depois, o cenário permanece desafiador, com recorde de propostas legislativas contra o funk.
Rômulo Costa, dono da Furacão 2000, foi para a delegacia por promover baile funk no morro Chapéu-Mangueira.
Rômulo Costa, dono da Furacão 2000, foi para a delegacia por promover baile funk no morro Chapéu-Mangueira.
Foto: Arquivo pessoal

“A Benedita da Silva, que era deputada, ficou conversando com os policiais na sala, eu fiquei na cozinha. A empregada escutou a conversa, veio e avisou: vão te prender”, recorda Rômulo Costa, proprietário da Furacão 2000, que promovia bailes funk no Rio de Janeiro quando foi instaurada a primeira Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o estilo musical, em 1995.

A cena ocorreu em um baile que estava no centro das atenções da mídia, da polícia e da política, no morro Chapéu-Mangueira, onde jovens da classe começaram a colar. O pancadão acontecia em uma quadra de esportes em frente à casa da deputada Benedita da Silva, que, na ocasião, intercedeu contra a interdição que a polícia tentava impor.

O dono da Furacão 2000, organizador do baile, fugiu ao ser avisado de que seria preso. Voltou, porém, após um telefonema da deputada. “Ela disse que só haveria baile se eu retornasse. Voltei e o que aconteceu? Fui preso. Levaram-me para a delegacia em um comboio de dez carros”, recorda Rômulo Costa, que só foi liberado na manhã seguinte, após pagar fiança de vinte reais e assumir a acusação de desacato aos policiais.

Baile do Chapéu-Mangueira atraía jovens de classe média em meados da década de 90: sucesso do funk extrapolava comunidades.
Baile do Chapéu-Mangueira atraía jovens de classe média em meados da década de 90: sucesso do funk extrapolava comunidades.
Foto: Divulgação

Rap das Armas era um funk a favor da paz

Outro envolvido com bailes funk que precisou prestar esclarecimentos na delegacia foi MC Leonardo, parceiro de MC Junior, uma das duplas que estouravam, como Cidinho e Doca, criadores da lendária “eu só quero é ser feliz”. Eles fizeram uma versão do Rap das Armas, bem mais pesadona que a original de Júnior e Leonardo, que teve que se explicar para a delegada.

A dupla divulgava o disco De Baile em Baile, de 1995. Leonardo conta que “foi muito rápido. Eu mostrei o CD e falei que era caçula de quatro filhos, morei em barraco, trabalhava desde os doze anos e estava ganhando trinta salários-mínimos por final de semana. Que ela me deixasse trabalhar. Antes de sair, falei que meu irmão mais velho tinha passado no concurso para a Polícia Militar.”

Em 2008, MC Leonardo fundou a Associação dos Profissionais e Amigos do Funk (Apafunk), com o apoio do advogado Guilherme Pimentel, atuante nas causas ligadas ao movimento. Para Pimentel, “ao curtir o baile no asfalto, a favela passou a viver a cidade. A mistura gerava conflitos, mas também namoro, amizade e desmontava a criminalização. Começou a assustar uma classe média que não queria ver seus filhos e filhas misturados com a favela. Esse é o ponto.”

Funkeiros Junior e Leonardo no programa da Xuxa. Fã de funk, apresentadora promoveu o gênero na Globo.
Funkeiros Junior e Leonardo no programa da Xuxa. Fã de funk, apresentadora promoveu o gênero na Globo.
Foto: Arquivo pessoal

Deputados fazem primeira CPI contra o funk no Brasil

“Era gritante a perseguição aos bailes”, lembra Rômulo Costa, da Furacão 2000. “Foi nessa temperatura que propuseram a CPI, para chamar a turma que proibia, quem interditava, o comandante, a polícia militar, quem dava alvará, chamaram a prefeitura”. Era a primeira CPI contra o funk no Brasil.

A pluralidade de vozes contribuiu para os resultados favoráveis ao funk, mas uma figura central, o juiz Siro Darlan, não compareceu à CPI. Responsável pela área da infância e juventude, ele lembra que havia casos de menores que engravidavam nos bailes; o Ministério Público ingressava com ações contra os promotores desses eventos, e eram frequentes as denúncias de violência e tráfico.

“Nunca fui contra o funk, eu sempre fui a favor da cultura e da literatura da periferia. Não fui à CPI porque os parlamentares queriam disciplinar uma atividade cultural, por que não disciplinavam festas de rock? Me recusei porque meu papel não era político, era jurídico”, explica Darlan.

Quando foi vereador, Antônio Pitanga aprovou a primeira lei brasileira que reconhece o funk como manifestação cultural, em 1996.
Quando foi vereador, Antônio Pitanga aprovou a primeira lei brasileira que reconhece o funk como manifestação cultural, em 1996.
Foto: Divulgação

Vereador fez a primeira lei a favor do funk no Brasil

A repressão aos bailes e a criação da CPI foi tirando opancadão dos morros e levando para os clubes no asfalto. Foi a era de ouro dos bailes de corredor, quando galeras rivais formavam dois grupos, com um corredor entre elas, formando um espaço de agressões, como parte da imprensa reforçou. Mas não era só isso.

Os bailes em clubes evidenciavam a falta de opções de lazer para a juventude das favelas, que muitas vezes se aglomerava nos pontos de ônibus para voltar para casa. A força desse movimento cultural levou o ator e então vereador Antônio Pitanga a propor, em 1995 — no mesmo ano da CPI —, a primeira lei brasileira a reconhecer o funk como manifestação cultural, aprovada no ano seguinte (Lei nº 2.518/96).

Trinta anos depois, a repressão ao funk se intensificou. Em 2025, o Rio de Janeiro liderou o recorde de leis contra o movimento, com 63 propostas legislativas municipais, estaduais e federais até maio. Para MC Leonardo, “não existe cena do funk, existe o baile que a polícia proíbe onde quer. É muito triste falar isso depois de tanto tempo. Lamento muito dizer que estamos no pior momento.”

Fonte: Visão do Corre
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