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Volta às aulas abre chance de parcerias

Reinício das atividades escolares vai exigir esforços conjuntos de instituições, governos e famílias

28 jun 2020 - 05h12
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O reinício das aulas foi anunciado no Estado de São Paulo: a partir de 8 de setembro, as escolas poderão retomar aulas presenciais com parte dos alunos. Há alguns critérios para que isso ocorra, como medidas de higiene, por exemplo, mas a notícia causou muitas reações.

Há famílias que consideram a retomada este ano uma atitude precipitada e os argumentos para contestar a decisão são realistas. Primeiramente, o fato de não termos vacina contra a covid-19 deixa a população sempre em risco, por maiores que sejam os cuidados tomados. Apesar de sabermos que as crianças se infectam menos e, talvez, transmitam menos o vírus, a ida delas à escola e a estada delas lá envolvem um considerável número de pessoas. Há pais que não querem correr tal risco.

Há também os que afirmam que poucas escolas possuem condições físicas para atender alunos presencialmente: em geral, as salas de aula são fechadas por paredes, com porta e janelas pequenas - quando não com vitrô basculante - que não possibilitam boa ventilação. Ainda levantam o reduzido número de trabalhadores para a higienização frequente dos espaços e ausência de pias suficientes para todos: alunos, educadores e trabalhadores.

Isso sem falar na dificuldade de a instituição escolar lidar com relativo êxito em determinadas situações. Uma mãe refletiu em um grupo de mensagens instantâneas: "A escola mal dá conta de piolho, que se prolifera rapidamente entre os alunos, como vai dar conta do coronavírus?".

Há famílias favoráveis ao retorno tão logo seja possível, é claro. Os argumentos também são valiosos: a falta que tem feito aos mais novos o relacionamento com colegas e professores, o processo de socialização pública interrompido, a organização do cotidiano um tanto quanto atrapalhada, a tranquilidade dos pais para ir ao trabalho sabendo que os filhos estão em um local confiável para eles e a aprendizagem que, para crianças, depende bastante do vínculo presencial estabelecido com os professores e com a escola.

Bem, mas há como resolver isso? Temos, aqui, uma boa oportunidade para inaugurar uma nova relação entre a escola e a comunidade que a frequenta. Que tal construir uma parceria escola/família de verdade? Nunca tivemos essa chance antes! Mas, como?

Primeiramente, formando uma comissão gestora desse retorno às aulas com a participação de todos os envolvidos: representantes de pais, de docentes, da direção da escola, dos trabalhadores da instituição escolar, dos alunos. Importante é lembrar que o objetivo de integrantes tão diferentes é o mesmo: o retorno às aulas eficiente no processo de ensino/aprendizagem e com a maior segurança possível.

Sim! Como falta pouco mais de dois meses antes da data prevista, essa comissão conseguiria dar conta de debater e chegar a conclusões importantes para aquela comunidade a respeito de muitos pontos envolvidos nesse retorno, que não é algo simples, não.

Do ponto de vista do processo do ensino e da aprendizagem: certamente, este ano letivo não poderá ser considerado como os outros anos pela comunidade, por isso processos já estabelecidos precisarão ser rediscutidos e reconstruídos. Por exemplo: quais os critérios serão usados para as avaliações? Seria justo avaliar a aprendizagem de alunos igualmente já que muitos não conseguiram se adaptar ao ensino remoto? Como identificar questões emocionais decorrentes da existência da pandemia e do período de isolamento físico interferindo na aprendizagem, e como trabalhar, na escola, com essas situações? Quais metodologias e práticas de ensino inovadoras poderiam contribuir para uma retomada exitosa dos estudos por parte dos alunos e como avaliar o sucesso do uso delas na aprendizagem?

Do ponto de vista sanitário: quais locais da escola os alunos poderão usar, quais deverão evitar e quais não terão acesso de modo nenhum? Como serão administrados os períodos mais críticos, como horário de entrada, intervalo ou recreio e saída? Como garantir o distanciamento físico necessário exigido entre os alunos? Como tratar atitudes rebeldes ao uso da máscara? Como e quando a higiene das mãos deverá ser incentivada e/ou exigida? Que atitudes tomar quando um aluno chega à escola adoentado - não importa que tipo de doença?

Do ponto de vista da cooperação entre a escola e as famílias: os grupos de mães em aplicativos de mensagens podem ganhar objetivos mais nobres do que o atuais? Quais e como? Como administrar e resolver os conflitos que irão surgir? Como chegar a consensos em assuntos importantes para todos? Como debater sem ânimos exaltados? Como estabelecer comunicação não violenta? Há mães e/ou pais que poderiam colaborar com uma hora ou mais na semana para que todos os assuntos decididos sejam praticados?

É um caminho novo para a maioria das escolas e das famílias que só conhecem a chamada parceria de modo nada parceiro. É, também, uma grande chance social que temos para começar um trabalho respeitoso e justo dentro das escolas envolvendo todos os seus segmentos, difícil de ser testemunhado até então. Que tal provocar a escola que seu filho frequenta - ou as famílias de seus alunos - com esse desafio?

*Rosely Sayão é psicóloga

Estadão
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