Maquiadora de mortos faz sucesso na web e relembra início na carreira: "Parecia um reencontro"
A área, responsável pela preparação de um corpo para o funeral, encantou Josiane Oliveira de imediato, e hoje ela já capacita outras pessoas
Quando um amigo falou para Josiane Oliveira, de 42 anos, sobre o curso de tanatopraxia, ela não imaginava que estava prestes a ter uma experiência transcedental, uma espécie de reencontro. A área, responsável pela preparação de um corpo para o funeral, a encantou de imediato, e hoje ela capacita outras pessoas.
"De cara, quando eu coloquei os pés pela primeira vez em um laboratório, parecia que era um reencontro. Parecia que tinha feito isso a minha vida toda", diz ela, em entrevista ao Terra.
Dali até hoje são sete anos de uma especialidade aparentemente curiosa, mas muito comum. Entre as etapas da tanato, ela faz a desinfecção do cadáver e toda a produção estética do cadáver, como a necromaquiagem.
A rotina na funerária onde trabalha em Taboão da Serra, em São Paulo, é compartilhada com seus mais de 600 mil seguidores no TikTok e no Instagram. Todos os dias Josiane mostra como lava o cabelo dos mortos, curiosidades sobre o corpo humano e até a maleta de maquiagem para prepará-los para o último seu último evento: o próprio funeral.
"As pessoas falam que eu romantizo a profissão, eu não romantizo. A gente tem que frisar que não é um procedimento romântico, mas pode ser um procedimento humanizado", defende.
Como é o cuidado com o cadáver antes do funeral
O processo da tanatopraxia, área que prepara o cadáver para o seu funeral, tem várias etapas. Quase que diariamente, Josi faz primeiro a desinfecção dos corpos. Isso é necessário porque, depois da morte, o corpo humano libera gases e líquidos.
A etapa seguinte é a conservação, na qual é aplicado um líquido para que o corpo não entre em putrefação durante o velório. Isso possibilita que o cadáver tenha um funeral mais longo ou seja transladado, por exemplo, de avião. Inclusive, essa é uma exigência das companhias aéreas, segundo Josi.
Em seguida, a profissional dá início aos procedimentos estéticos no corpo: a lavagem dos cabelos, a roupa, esmaltação das unhas e necromaquiagem. Josiane garante que usa em seus clientes todos os produtos que ela mesma usaria em sua casa: shampoo, creme, secador, chapinha, base, pó facial, rímel, blush, batons, delineadores, gloss e sombra.
@josianetanatopraxia ♬ som original - Instrutora Josiane Oliveira ☑️
Josiane assegura que nunca usa maquiagens vencidas e sempre compra os produtos em lojas especializadas. A qualidade é fundamental para, como ela diz, antender "o amor da vida de alguém".
"Geralmente fazemos restaurações faciais, por exemplo, e depois a cobertura com a necromaquiagem. Fazemos o que a família pede, não o que achamos bonito", explica.
Para isso, Josiane pede sempre uma referência para os familiares, por exemplo, a foto de como a pessoa gostava de sua maquiagem.
"Teve uma moça que veio do IML [Instituto Médico Legal], sofreu um acidente, e veio com o olhinho de gato [delineado]. A mãe pediu para fazer, sabe?", relembra. A tanatopraxista conta que chegam a mandar até os produtos que a pessoa usava, inclusive, perfume.
Algumas famílias pedem para fazer as maquiagens ou vestir o defunto, incluindo terços e bonecas. Há pedidos inusitados também, como já recebeu, por exemplo, de colocar uma lata de cerveja junto da urna de uma senhora.
"E ela foi segurando mesmo", ri.
Repercussão na internet
Ao contrário da maquiagem, que está no cotidiano de milhares de pessoas e é encarada com naturalidade, a morte ainda é um tabu. A necromaquiadora Josiane Oliveira percebe isso a cada conteúdo que publica nas redes sociais.
Quando compartilha os produtos que usa ou a lavagem dos cabelos dos mortos, em especial, ela recebe uma enxurrada de comentários curiosos.
"Isso está despertando duas vertentes: pavor, horror, e um amor muito grande das pessoas", conta.
O pavor está atrelado ao medo de quem passou para o "lado de lá" da vida. Esse sentimento, aliás, passa longe da rotina de Josiane. A profissional acredita que seus clientes não podem fazer nenhum mal.
"Eu costumo pedir licença, porque aprendemos desde criança que o nosso corpo é um templo, uma casa. Não entramos na casa de ninguém sem pedir licença. Eu estou tocando num corpo que eu não conheço a história. Tem que ter uma humanização", argumenta.
Às vezes, Josiane até conversa com eles.
"Dona Maria, está acabando. Já vai, sua família está te esperando, você vai pro seu último evento", lembra.
Mesmo levando de forma natural, ela afirma que é preciso saber lidar com o contexto para trabalhar com a tanato, senão "pira". Comentários preconceituosos, por exemplo, podem desestimular quem quer seguir na profissão.
Josiane lembra que já ouviu até pessoas dizerem que não beberiam água em sua casa ou não encostariam nela. "Acredita? Em pleno século 21? A gente cuidando de uma pedra tão preciosa. [...] O tamanho do preconceito que elas criam", lamenta.
A profissional não revelou quanto ganha atualmente, mas, segundo contou ao Terra, o salário inicial do profissional de tanatopraxia é de R$ 2 mil.