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Brasil criou primeira lei antirracista após hotel negar hospedagem a dançarina negra americana

Lei Afonso Arinos foi promulgada em 3 de julho de 1951; a partir de 1989, discriminação racial deixou de ser contravenção e virou crime

4 jul 2022 - 15h39
(atualizado às 16h31)
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Publicação sobre a aprovação da Lei Afonso Arinos
Publicação sobre a aprovação da Lei Afonso Arinos
Foto: Imagem: Fundação Cultural Palmares / Alma Preta

A primeira lei contra a discriminação racial completa 71 anos. Em 3 de julho de 1951, o presidente Getúlio Vargas sancionou a lei 1.390/51, do deputado Afonso Arinos, que em nove artigos definia como contravenção penal a discriminação racial em comércios, hotéis e órgãos públicos. De acordo com informações da Fundação Cultural Palmares, o projeto foi motivado por um caso de racismo contra uma bailarina negra. Katherine Dunham, afro-americana, foi impedida de se hospedar em um hotel em São Paulo devido à sua cor de pele.

A lei Afonso Arinos tramitou por cinco meses na Câmara dos Deputados, recebeu uma emenda do deputado Hermes Lima, foi avaliada na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e aprovada por unanimidade no plenário da Câmara em 15 de dezembro.

No Senado, a tramitação do projeto de lei contra a discriminação demorou seis meses e foi acompanhado de perto pela população, na época, por conta de um caso de racismo contra uma cantora e bailarina negra dos EUA que não foi aceita como hóspede em um hotel de São Paulo.

"Precisou acontecer um escândalo de repercussão internacional para o Brasil começar a se mexer em relação ao racismo", comenta Irapuã Santana, presidente da Comissão Permanente de Igualdade Racial da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil-SP).

Na própria Câmara dos Deputados, onde tramitou a lei Afonso Arinos, ocorreu um caso de discriminação racial. Em 1904, poucos anos após a Proclamação da República o advogado negro Manuel Monteiro da Mota Lopes, conhecido como Monteiro Lopes, foi eleito deputado federal, mas não foi diplomado como legislador, pois foi discriminado por conta da sua raça.

Cinco anos depois, em janeiro de 1909, o pernambucano Monteiro Lopes disputou a eleição e novamente foi eleito.

Dessa vez, houve uma grande mobilização popular liderada por grupos de homens negros de Campinas (SP), São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ) e Recife (PE) para reivindicar que o parlamentar fosse empossado. Como deputado, o primeiro negro da história do Brasil, Monteiro Lopes apresentou projetos de interesse popular contra o trabalho infantil, por melhores aposentadorias, contra a exploração dos operários e propôs a criação do Ministério do Trabalho.

Infelizmente, em 1910, pouco mais de um ano após a posse, Monteiro Lopes morreu sem terminar o mandato, aos 43 anos de idade.

Lei Caó

Afonso Arinos, que era um advogado branco nascido em Minas Gerais e que anos depois se tornou membro da Academia Brasileira de Letras. A lei que ele criou e leva o seu nome ficou em vigor até 1989, quando a legislação sobre racismo no Brasil foi atualizada com a lei 7.716/89.

Essa nova lei foi apresentada pelo deputado federal negro Carlos Alberto Oliveira dos Santos, conhecido como Caó, que era advogado e jornalista. Por conta da sua luta contra o racismo e pela sua militância no movimento negro, a lei é chamada até hoje de Lei Caó.

"Na época da lei Afonso Arinos, o combate ao racismo, ainda era algo só 'para inglês ver', não chegava a ser um crime, era uma infração de menor potencial ofensivo, uma contravenção. Era uma espécie de sinalização de virtude, sem ter uma preocupação contra a disseminação do racismo", pondera Irapuã Santana, da OAB-SP.

Alma Preta
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