‘Skatista Cego’ escolheu carreira por influência de jogo de videogame de lenda do esporte: ‘Consigo fazer tudo que quiser’
Com apenas 20% da visão de um olho, Fernando Araújo é skatista profissional e sonha em disputar os X-Games
Fernando Araújo, conhecido como 'Skatista Cego', superou limitações visuais graças à paixão pelo skate, conquistando espaço no esporte profissional e inspirando outros deficientes visuais com sua trajetória.
“Nunca pensei em ser um profissional de skate, isso foi meio que acontecendo. Nunca imaginei viver do skate”, é o que diz Fernando Araújo, 31 anos, conhecido como ‘Skatista Cego’. O carioca tem somente 20% de visão do olho direito, mas isso não o limita para dropar a pista em cima do shape. Hoje, ele ganha a vida remando o ‘carrinho’ e fazendo manobras pelo Brasil.
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A mãe, Maria Soares Araújo, vivia uma gestação gemelar quando deu à luz a ele e ao irmão, aos sete meses. Com quatro dias de vida na incubadora, o irmão faleceu, enquanto Nando sobreviveu. A família percebeu que ele não enxergava aos quatro meses.
“Eu tive excesso de oxigênio na incubadora e aquela luz, que acabou queimando a retina. Tive descolamento da retina dos dois olhos”, conta ao Terra. A retina colou em um dos olhos, mas no outro ele precisou passar por algumas cirurgias. Ele chegou a ter 50% da visão recuperada, mas perdeu 30% nos últimos anos após um inchaço nas córneas.
Tudo começou com um joguinho
Ele começou a se interessar pelo skate quando tinha 4 anos, por causa do jogo de videogame Tony Hawk’s Pro Skater, criado por uma das maiores lendas do esporte. Foi nessa época também que ele passou a acompanhar as competições dos X-Games pela TV. No ano seguinte, ganhou o primeiro ‘carrinho’ de Natal.
“Comecei a andar mas não fazia nenhuma manobra, só brincava mesmo com o skate”, explica. Isso foi até os 10 anos, quando deixei o skate um pouquinho de lado”, explica ao dizer que nunca deixou de acompanhar a modalidade pela TV. Em paralelo, o carioca dedicava seu tempo a outros esportes, como o judô, no qual já estabelecia uma carreira.
Mas, em 2016, tudo mudou. Ele percebia que a luta o desgastava e tomou um passo importante para o que viria a se tornar a sua profissão: voltar a remar sobre as rodinhas. Nando passou a dedicar grande parte do seu tempo a aprender manobras. A primeira delas foi a um ‘Rock and Roll’, no qual o skatista passa o eixo da frente do skate sobre a borda da pista e volta de costas.
“Senti a sensação de que eu consigo fazer tudo que eu quiser”, descreve o momento. O skatista PCD andava com alguma dificuldade ainda, mas tudo mudou quando conheceu Leo Scott, que se tornaria seu treinador. O instrutor desenvolveu o método de utilização da engala guia para o skate e, com ela, o carioca passou a fazer o mapeamento antes de dropar a pista e executar as manobras.
“Antes eu não fazia esse reconhecimento, eu contava os passos, mas a gente percebeu que não estava dando muito certo. E com a bengala, eu consigo sentir as transições e os obstáculos melhor”, afirma.
‘Escape’
Como bem disse, o skatista PCD conta que não achava que se tornaria profissional, mas fica implícito que seu talento e a dedicação no esporte o levou até onde está hoje. Ele roda o Brasil competindo, e já até foi disputar um campeonato na Espanha.
Dentro da modalidade ele encontrou uma válvula de escape, um jeito de extravasar os problemas que enfrentamos na vida. “Quando estou chateado, pego o skate e vou para a pista. Às vezes eu vou sozinho e fico tranquilão, boto uma música e fico lá andando”, descreve.
A paixão que ele tem pelo esporte é o que o motiva a seguir em frente e o mantém disciplinado com os treinos. Todos os dias, ele vai à academia e treina sobre as rodinhas. O skatista também faz acompanhamento com fisioterapia, e quando está próximo das competições, aperta também às vezes que dropa as rampas.
“O skate é uma parada que eu já gostava e queria muito fazer, mas pelo preconceito das pessoas, porque as pessoas falavam que não dava certo, que ia me machucar, que ia ficar inválido numa cama, eu não fazia”, confessa.
Ouvir o seu instinto o levou para o que ele vive hoje e, com a sua história, o carioca busca passar isso para outros colegas deficientes. O que ele quer, além de um dia chegar aos X-Games e aos Jogos Paralímpicos – quando o esporte fizer parte da competição, é continuar incentivando outros deficientes visuais a se jogarem no esporte.
“Se Papai Noel existisse, pediria que mais eficientes visuais viesse para o skate para ver que não é um bicho de sete cabeças, que não é um esporte perigoso como a galera imagina que é”, finaliza.