Tarifas de Trump estão gerando dinheiro e isso pode dificultar sua revogação
As taxas aplicadas são uma nova e substancial fonte de receita para os Estados Unidos e orçamento pode começar a depender delas
As tarifas implementadas por Donald Trump estão gerando receitas significativas para os Estados Unidos, mas sua dependência pode tornar difícil revogá-las, trazendo impactos regressivos e debates políticos sobre seu futuro.
WASHINGTON - O tarifaço de Donald Trump já começou a gerar uma quantia significativa de dinheiro para o governo dos Estados Unidos. A nova fonte de receita tem serventia para uma nação altamente endividada e, por isso, os formuladores de políticas americanos podem começar a depender deste dinheiro.
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Como parte de sua tentativa de reorganizar o sistema de comércio global, Trump impôs tarifas pesadas aos parceiros comerciais dos Estados Unidos, incluindo o Brasil, sendo que a maior parte delas entrará em vigor em 7 de agosto.
Mesmo antes de entrarem em vigor as tarifas mais recentes, a receita dos impostos cobrados sobre produtos importados já cresceu dramaticamente.
As tarifas alfandegárias, juntamente com alguns impostos sobre consumo, geraram US$ 152 bilhões entre janeiro e julho, quase o dobro dos US$ 78 bilhões arrecadados no mesmo período do ano fiscal passado, de acordo com dados do Tesouro norte-americano.
Trump tem citado rotineiramente a receita tarifária como prova de que sua abordagem comercial, que semeou incertezas e começou a aumentar os preços para os consumidores, é uma vitória para os Estados Unidos.
Membros do seu governo argumentaram que o dinheiro das tarifas ajudaria a tapar o buraco criado pelos amplos cortes de impostos aprovados pelo Congresso no mês passado, que devem custar ao governo pelo menos US$ 3,4 trilhões.
"A boa notícia é que as tarifas estão trazendo bilhões de dólares para os EUA!" disse Trump nas redes sociais logo após um relatório sobre empregos no país mostrar sinais de tensão no mercado de trabalho. Com o passar do tempo, os analistas esperam que as tarifas, se mantidas, gerem mais de US$ 2 trilhões em receita adicional aos Estados Unidos na próxima década.
Os economistas, em sua maioria, esperam que isso não aconteça e que a gestão Trump abandone as novas barreiras comerciais. Mas alguns reconhecem que um fluxo de receita tão substancial pode acabar sendo difícil de abandonar.
"Acho que isso é viciante", diz João Gomes, economista da Wharton School, da Universidade da Pensilvânia. "É muito difícil abandonar uma fonte de receita quando a dívida e o déficit são o que são", afirmou o especialista.
Há muito tempo que Donald Trump pensa em substituir os impostos sobre a renda por tarifas. Ele costuma se referir à política fiscal americana do final do século XIX, quando não havia imposto de renda e o governo dependia de tarifas, como um modelo para o futuro.
E embora o imposto de renda e o imposto sobre a folha de pagamento continuem sendo, de longe, as fontes mais importantes de receita do governo norte-americano, a combinação entre as tarifas de Trump e o último corte de impostos do Partido Republicano na margem faz com que os Estados Unidos deixem de tributar os rendimentos e passem a tributar os bens.
A expectativa é de que essa mudança seja regressiva, o que significa que os americanos ricos se sairão melhor do que os americanos mais pobres com a mudança. Isso se deve ao fato de que a redução dos impostos sobre a renda, em geral, proporciona o maior benefício para os americanos que ganham mais.
O recente corte republicano no imposto de renda e na rede de segurança social talvez seja a peça mais regressiva da legislação norte-americana em décadas. No entanto, a imposição de novos impostos sobre produtos importados deve aumentar o custo dos produtos de uso diário.
Mais uma vez, os americanos de baixa renda saem em desvantagem. Isso porque eles já gastam maior parte dos seus ganhos com esses produtos mais caros, passando assim a pagar na prática mais impostos do que os americanos mais ricos, por conta da proporção entre renda e valor das taxas pagas.
O tarifaço já começou a refletir nos preços ao consumidor, com muitas empresas dizendo que terão de começar a aumentar os preços dos produtos em decorrência dos custos adicionais. Os analistas esperam que as taxas pesem sobre o desempenho da economia em geral, o que, por sua vez, pode reduzir o valor da receita do imposto de renda tradicional que o governo arrecada todos os anos.
"Existe uma maneira melhor de aumentar esse montante de receita? A resposta econômica é: sim, há uma maneira melhor, há maneiras mais eficientes", afirma Ernie Tedeschi, diretor de economia do Yale Budget Lab e ex-funcionário do governo Biden. "Mas é realmente uma questão política."
Tedeschi diz ainda que, futuramente, os próximos próximos líderes em Washington, sejam eles republicanos ou democratas, podem hesitar em reverter as tarifas se isso significar um acréscimo adicional à carga da dívida federal, o que já está causando alarme em Wall Street.
E substituir a receita tarifária por outro tipo de aumento de impostos exigiria a ação do Congresso, enquanto as tarifas seriam uma decisão herdada de um presidente anterior. "O Congresso pode não se entusiasmar com uma votação tão arriscada do ponto de vista político quando, em primeiro lugar, não precisava votar sobre as tarifas", diz Tedeschi.
Algumas pessoas em Washington já estão começando a pensar em como poderiam gastar a receita das tarifas. Trump recentemente expôs a possibilidade de aplicar aos americanos um desconto em dinheiro pelas tarifas. E o senador Josh Hawley, republicano do Missouri, recentemente apresentou um projeto de lei para disponibilizar US$ 600 a boa parte dos americanos.
"Temos tanto dinheiro entrando que estamos pensando em um pequeno desconto, mas o principal que queremos fazer é pagar a dívida", disse Trump no mês passado sobre o tarifaço.
Os democratas, quando voltarem ao poder, poderão enfrentar uma tentação semelhante de usar a receita das tarifas para financiar um novo programa social, especialmente se o aumento de impostos no Congresso for tão desafiador quanto foi no passado.
Do jeito que está, os democratas estão divididos em relação às tarifas. Afinal, manter o status quo pode ser uma opção mais fácil do que mudar a política comercial.
"Trata-se de uma grande quantia de dinheiro", disse Tyson Brody, estrategista democrata, sobre as tarifas. "A maneira como os democratas estão começando a pensar sobre isso não é que 'será impossível retirá-las'. É: 'Vejam só, agora haverá um grande pote de dinheiro para usar e reprogramar'".
É claro que as tarifas podem se tornar impopulares e que futuras autoridades eleitas podem querer tomar medidas para reduzir os preços ao consumidor. Além disso, o valor da receita gerada pelas tarifas pode diminuir com o tempo se as empresas acabarem, de fato, trazendo mais operações para os Estados Unidos, reduzindo o número de produtos que são submetidos ao imposto de importação.
"Essa claramente não é uma maneira eficiente de obter receita", disse Alex Jacquez, ex-funcionário de Biden e chefe de política e defesa da Groundwork Collaborative, um grupo liberal. "E não acho que seria uma prioridade progressiva de longo prazo, como uma forma de simplesmente coletar receita."
Este conteúdo foi traduzido com o auxílio de ferramentas de Inteligência Artificial e revisado por nossa equipe editorial. Saiba mais em nossa Política de IA.
Este artigo foi publicado originalmente no The New York Times.
