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Rebaixamento afeta mercado e piora situação do Brasil, diz consultoria

10 set 2015 - 12h32
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O rebaixamento da nota de crédito do Brasil por uma das maiores agências de crédito piora a situação econômica do país, segundo uma consultoria britânica.

Presidente Dilma Rousseff tem sofrido com baixos índices de popularidade, economia em recessão e crise política
Presidente Dilma Rousseff tem sofrido com baixos índices de popularidade, economia em recessão e crise política
Foto: Reuters

Com a decisão da Standard & Poor's, o país perdeu o grau de investimento que havia sido dado pela agência em abril de 2008. O movimento já era esperado por analistas, mas a velocidade da decisão surpreendeu.

A agência disse que a crise política e as dificuldades enfrentadas pelo governo da presidente Dilma Rousseff para equilibrar as contas justificavam o corte.

"Não é uma surpresa, mas dificulta as coisas para o país", disse Fiona Mackie, editora-regional para América Latina da consultoria Economist Intelligence Unit. Para ela, a decisão é "problemática", já que pode afastar investidores estrangeiros.

O país foi colocado em perspectiva negativa pela S&P, o que significa que novos rebaixamentos podem ocorrer. O Brasil mantém seu grau de investimento nas duas outras principais agências, Moody's e Fitch.

No dia seguinte ao rebaixamento, o dólar abriu a sessão em alta, ultrapassando R$ 3,90. Mas recuou com intervenção do Banco Central. O real perdeu 30% neste ano e tem o pior desempenho entre as moedas dos principais países emergentes.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista, concedida por telefone, desde Londres.

BBC Brasil - Quais são os impactos desse rebaixamento?

Fiona Mackie - Primeiro, se investidores institucionais forem forçados, por causa de regulações internas, a deixar de investir no Brasil (), pode haver um impacto imediato dramático na moeda. Porque o Brasil ainda tem grau de investimento em outras agências de classificação, como Moody’s e Fitch, não parece que isso vai acontecer imediatamente.

No entanto, é mais um golpe de confiança na economia e sugere que a esta vai continuar em recessão. A gente prevê contração de 2,5% (do PIB) neste ano e de 0,5% em 2016, e devemos rever esse número.

BBC Brasil - Outras agências deverão seguir a S&P e rebaixar o Brasil?

Mackie - Achamos que há um forte risco de isso acontecer. O risco é de o governo não agir agora contra o deficit fiscal e a dívida pública. Se isso não ocorrer, nós certamente veremos um rebaixamento pela Moody’s ou Fitch.

BBC Brasil - Essa decisão da agência não piora uma situação que já é ruim?

Mackie - Acho que é problemático para o Brasil se investidores institucionais tiverem que deixar o país. E, neste sentido, as agências de classificação têm o poder de mudar o mercado.

No entanto, é preciso ter um sistema para regular a emissão de dívida externa, e as pessoas que compram os papéis da dívida do Brasil têm o direito de saber essa informação das agências de classificação.

O Brasil sabe que seus números estão sendo analisados e é tarefa do governo colocar a ordem na casa e nas contas públicas. Eu sei que é problemático, que as agências de classificação podem causar turbulência nos mercados do Brasil, mas esse é o sistema em que nós estamos, e se o Brasil quer emitir dívida no exterior, esse é o sistema que o Brasil tem que aceitar.

BBC Brasil - O governo, então, já esperava isso.

Mackie - Sim, o governo sabia. Todo mundo estava analisando isso e sabia que esse dia chegaria se não agisse. E, claro, Dilma colocou como ministro da Fazenda alguém treinado em Chicago (Joaquim Levy), que está pronto e comprometido a fazer essas reformas.

Ela está, infelizmente, sendo obstruída pelo Congresso, e não mostra capacidade política para tomar as medidas necessárias. Há uma grande crise política que impede o Brasil de ir adiante e melhorar sua economia.

BBC Brasil - E qual o papel dessa crise política nesse rebaixamento?

Mackie - Acho que o problema é esse. Porque o governo é muito impopular, não tem o capital político, e, porque políticos e partidos sentem a fraqueza no governo, não estão mais colaborando com ele. Então, o problema do governo é que não consegue aprovar políticas que vê como necessárias.

O problema é que esse é um círculo vicioso. A menos que o governo consiga aprovar essas reformas, a confiança de empresários não irá se recuperar e, aí, o desemprego vai continuar a subir, o consumo privado não irá se recuperar. E o governo vai se tornar ainda mais impopular – se é que isto é possível.

Então o governo tem que ter a capacidade e a vontade política de implementar estas políticas e informar o público de que esse é um mal necessário.

BBC Brasil - Há cada vez mais protestos e pedidos pelo impeachment ou renúncia de Dilma. Ela é o problema? Se ela sair as coisas melhoram?

Mackie - Ela é parte do problema, no sentido que o seu governo anterior não adotou as reformas estruturais necessárias para colocar a economia em ordem e melhorar a confiança em relação às decisões do governo e no ambiente de negócios. E ela, claramente, não tem o capital político para adotar a redução de gastos necessária.

Num caso sem Dilma, você poderia ver o cenário político se acalmando e políticos apoiando um novo governo e concordando em fazer os cortes fiscais necessários. Você poderia ver isso acontecer, mas isso não significa, necessariamente, que os políticos que iriam substituí-la no curto prazo iriam adotar reformas profundas porque o Congresso continua dividido.

BBC Brasil - É algo a se preocupar?

Mackie - Não vemos que ela sofrerá impeachment ou irá renunciar. Se alguma evidência contra Dilma vier à tona, obviamente, ela ficaria numa posição insustentável. Tudo depende do cálculo político. Porque no momento muitos políticos ficariam felizes se Dilma pagasse o preço político e sofresse para assumir na próxima eleição. Mas isso pode mudar. Políticos podem decidir que eles querem ir adiante e tentar retirá-la do poder.

BBC Brasil - Qual será a situação do Brasil a partir de agora?

Mackie - É complicado. O país deverá ter mais problemas. Continuará em recessão, mas eu acho que a decisão do S&P será um despertar para políticos. E também, fatores externos e a queda do real podem fazer com que as exportações ajudem a economia e sejam os propulsores de qualquer possível recuperação em 2017.

No entanto, o cenário internacional é complicado, com o Banco Central dos Estados Unidos se preparando para aumentar as taxas de juros. E há temores em relação ao tamanho e duração da desaceleração da China e o impacto que isso pode ter nas exportações à China e no preço das commodities, por exemplo. Os próximos 12 meses serão difíceis.

BBC Brasil - Agora que o Brasil perdeu o grau de investimento da S&P, como recuperá-lo?

Mackie - Será difícil reconquistá-lo no curto prazo. O que a gente precisa ver é uma redução renovada na proporção dívida pública-Produto Interno Bruto (PIB), que está em alta, a caminho dos 70%. Precisamos ver isso ser revertido. Eles precisam atacar o deficit fiscal, o superavit primário precisa voltar. A gente também precisa ver reformas estruturais.

BBC Brasil - Não é impossível, no entanto, recuperar o grau de investimento. Indonésia e Islândia são casos recentes.

Mackie - E o Uruguai tinha grau de investimento e perdeu-o em 2003. O que aconteceu lá entre 2003 e 2010 foi um esforço conjunto de diminuir a dívida pública. Havia dúvidas porque era o primeiro governo de esquerda do Uruguai.

E na verdade, implementou-se uma política macroeconômica ortodoxa, centrada numa combinação de investimento social e queda e melhora da estrutura da dívida pública. O deficit fiscal foi reduzido, eles tinham superavit primário, a inflação foi reduzida e a credibilidade do Banco Central aumentava.

Isso é algo que nem discutimos no caso do Brasil. A inflação tem estado acima da meta há tanto tempo, e o Banco Central perdeu credibilidade.

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