Lula pode voltar ao País sem atrair chineses para ferrovia bioceânica; Tebet pede decisão em 30 dias
Integrantes da delegação ministerial já indicam que empresas da China tendem a levar mais tempo para avaliar projeto de infraestrutura estratégio na América do Sul
ENVIADO ESPECIAL A PEQUIM - Se nada mudar nas próximas horas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve retornar ao Brasil da viagem a Pequim sem conseguir um de seus principais objetivos: atrair o capital chinês para a obra da ferrovia bioceânica. A delegação brasileira já deu sinais de que essa meta tão perseguida na visita de Estado pode ficar para depois, e pediu que estatais da China deem um sinal verde em 30 dias.
A construção da ferrovia é um dos pontos mais importantes para o plano de integração sul-americana que visa ligar Altântico e Pacífico e criar uma rede integrada de escoamento de produtos brasilerios para a China - e vice-versa - além de outros mercados na Ásia.
O megaprojeto de infraestrutura global financiado e construído pela China ao redor do mundo passa dos US$ 2 trilhões, e entrou na mira dos EUA e de Donald Trump. Após ameaçar tomar o Canal do Panamá, ele conseguiu pressionar o governo de José Raúl Mulino a abandonar a estratégia chinesa.
"O Brasil quer fazer parcerias com todos e não aceita veto de ninguém", disse Rui Costa, ao ser indagado sobre o potencial de retaliação dos americanos. "O Brasil prega o multilateralismo, não funciona na base da ameaça e da tensão de nenhum país."
Um diplomata chinês disse ao Estadão que o Brasil precisa de um plano, e que pode ainda demorar algum tempo, como é tradição, para que as empresas chinesas tomem uma decisão tão vultosa.
Segundo o ministro Rui Costa, os chineses têm alertado também que o Brasil precisa formar uma cadeia de suprimentos para ver as obras deslancharem, com formação de pessoal.
O titular da Casa Civil indicou que as obras da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO), em Goiás, no segundo trecho, podem ser atrativas aos chineses, assim como o terceiro trecho da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), que parte de Ilhéus (BA). Depois, há o desafio da travessia para chegar ao Pacífico, o projeto de engenharia mais desafiador.
"Uma ligação bioceânica não é simples, é um arranjo gigantesco de investimento, com o 'pequeno' detalhe de atravessar a cordilheira dos Andes. Não é trivial", afirmou Costa, sem estimar um prazo para que os chineses decidam. "O que queremos de antemão é chamá-los para participar desse projeto em construção no Brasil."
Rui Costa disse que os chineses tem um processo decisório mais lento e que por isso o governo brasileiro planeja fazer fóruns de apresentação antecipada dos projetos que serão leiolados em infraestrutura (estradas, ferrovias, portos e aeroportos) a fim de que possam de fato aparecer nas concorrências. Os editais, lembrou ele, tem duração de 100 dias.
Já a ministra Simone Tebet pediu uma decisão de investimentos pelos chineses, a respeito da ferrovia do corredor bioceânico, em 30 dias - a tempo da prevista visita de Xi Jinping ao Rio de Janeiro, em julho, para a Cúpula do Brics. Ela apelou aos empresários chineses e autoridades do governo dizendo que o Brasil não tem recursos orçamentários suficientes para tocar o projeto sozinho e depende da parceria. Mesmo os investimentos privados nacionais são insuficientes para as ferrovias, afirmou a ministra.
"Nós temos hoje uma conversa com o governo chinês, especialmente no que se refere à ferrovia, e temos um prazo de, nos próximos 30 dias, estamos vendo a oportunidade de fazermos um projeto ferroviário interligando o Atlântico ao Pacífico, rasgando o Brasil em ferrovia na área considerada o celeiro do Brasil. Nós estamos falando de interligar a Bahia, a região de Matopiba, centro-oeste, o celeiro do Brasil, com o maior investimento chinês na América do Sul, que é o porto de Chancay", disse Tebet.
"Todos os investimentos, rodovias, portos, aeroportos, cabotagem, conectividade, segurança de fronteira, alfândega, nós temos recursos necessários pelo lado do Brasil e no que se refere à América do Sul, nós temos hoje uma carteira que ainda está em aberto de 10 bilhões de dólares para que todos os países possam se financiar e fazer essa integração. O que falta para o Brasil? Nós precisamos de parceria com a China para fazermos aquilo que há de mais caro: ferrovias. Dentro de 30 dias esperamos ter um sinal verde, no sentido brasileiro, no caso da China, vermelho, no sentido de sermos financiados com o projeto executivo daquela ferrovia que apresentamos."
