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Aos 83, Ignácio de Loyola toma posse na Academia Brasileira de Letras

Escritor fez discurso marcado por referências políticas, recordações da infância e menções ao ofício de escrever

19 out 2019 - 02h17
(atualizado às 09h48)
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Com um discurso marcado por referências políticas, recordações da infância e juventude e menções ao ofício de escrever, o escritor e jornalista Ignácio de Loyola Brandão tomou posse na Academia Brasileira de Letras (ABL), no Rio, na noite da última sexta-feira, 18. Na instituição, passa a ocupar a cadeira 11, cujo patrono é Fagundes Varela e que teve como fundador Lucio de Mendonça. Substitui o sociólogo Hélio Jaguaribe, que morreu em 2018. Brandão foi eleito por unanimidade, em 14 de março último.

Ignácio de Loyola Brandão toma posse na Academia Brasileira de Letras.
Ignácio de Loyola Brandão toma posse na Academia Brasileira de Letras.
Foto: Alex Ribeiro / Estadão

Aos 83 anos, o colunista do Estadão também falou, em entrevista, da satisfação de passar a integrar a ABL. A entrada na Academia, porém, é só parte de seus planos. Loyola revelou ter ainda sonhos a realizar - pelo que disse muitos. "O que que um escritor quer? Chegar aqui (à ABL). Mas essa é só uma parte do caminho. Eu tenho metade dos meus projetos, dos meus sonhos, realizados. E vou realizá-los. Alguém diz: 'Ah, mas você tem 83 anos' (e eu respondo:) 'E a vida inteira pela frente, mesmo que sejam sete dias'", afirmou Brandão, após a cerimônia, questionado sobre a emoção de se tornar um 'imortal'.

No discurso, o escritor também relembrou momentos da infância e prestou homenagens aos pais. Disse que seu pai lia muito, "tinha muitos dicionários" e lhe "ensinou a usá-los". "Aprenda as palavras, e sua vida será mais fácil, dizia meu pai", recordou. Contou também que, quando via a mãe catando feijões, para tirar a sujeira e os grãos estragados, o pai lhe dizia: "Veja como ela escolhe os mais perfeitos, os mais bonitos. Lembre-se disso ao escrever".

O novo acadêmico fez várias menções ao momento político brasileiro. Uma delas foi à vereadora do Rio Marielle Franco (PSOL), assassinada a tiros com o motorista Anderson Gomes em março de 2018. Outra foi ao slogan de campanha do presidente Jair Bolsonaro, "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos". Brandão se referiu à frase em tom de brincadeira, aludindo à paixão do mandatário pelas redes sociais, como o Twitter.

"O que é o regime atual? O ex-ministro Delfim Netto definiu como twittercracia. É o primeiro governo à distância do Brasil, orientado dos Estados Unidos", brincou.

Em outro momento do discurso, disse que "para desenvolver o Brasil precisamos de democracia, liberdade, saúde para sobreviver, ensino e trabalho, ausência de fome e miséria, de segurança e acima de tudo ética e verdade. E principalmente (precisamos) nos relacionarmos sem ódio, (sem) indignação, (sem) acirramento".

Após a cerimônia, em entrevista, Brandão falou sobre sua luta contra a censura.

"Sou uma das vozes que lutam pela liberdade, porque tem muita gente aí, ainda. E eu espero que a Academia expanda minha voz, porque a gente vive um momento muito complicado, um momento em que sombras estão se adensando, como disse no discurso (de posse). E cultura, escola, universidade são fundamentais.", afirmou.

Recepção

O discurso de saudação ao novo acadêmico foi proferido pelo acadêmico Antônio Torres. Ele é amigo de Brandão desde os tempos em que trabalharam juntos no jornal "Última Hora" de São Paulo, nos anos 60. Torres afirmou que se recordava de uma "redação agitada e barulhenta, de um jornal vibrante, no Vale do Anhangabaú". Era colega de Brandão havia mais de um ano, mas pouco se falavam. Até que um dia chegou mais cedo para trabalhar.

"Bati o ponto no grande relógio postado um pouco além da porta de entrada da redação bem antes da hora, imaginando ser o primeiro a chegar, fui surpreendido com o tac-tac-tac de uma máquina de escrever, único sinal de vida naquele salão vazio. Ao passar perto de quem, de costas para a entrada, catava feijão nas teclas completamente absorvido pelo seu matraquear, tive outra surpresa: a de um aceno para que me aproximasse. A mão que acenava apontou para uma pilha de páginas que mal cabiam na borda de uma estreita mesa, enquanto uma voz dizia: 'Dá uma olhada nisso'".

Torres contou que foi assim que virou testemunha ocular do nascimento do primeiro livro de Brandão: "Depois do Sol", obra lançada em 1965.

O colar de acadêmico foi entregue a Brandão por Celso Lafer, a espada lhe foi dada por Arnaldo Niskier, e o diploma, por Rosiska Darcy de Oliveira. Terminada a cerimônia, o presidente da ABL, Marco Lucchesi, declarou empossado o novo acadêmico.

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