Quem decide não tem noção do que a gente vive, diz líder indígena sobre justiça climática

Em entrevista ao Terra, Txai Suruí falou sobre expectativas para esse ano em que o Brasil está no centro do debate climático

29 ago 2025 - 04h59
(atualizado em 1/9/2025 às 09h49)
Txai Surui participou do Encontro Futuro Vivo, que aconteceu na terça-feira, 26
Txai Surui participou do Encontro Futuro Vivo, que aconteceu na terça-feira, 26
Foto: Lu Aith/Terra

Sede da COP30, o Brasil está no centro do debate climático global neste ano. Há muito para ser debatido e tudo com muita urgência. Mas, em meio a tudo isso, o que é prioridade? Para Txai Suruí, líder indígena que tem se destacado como uma voz do ativismo por justiça climática, a questão é ampla: é preciso que as promessas dos países com relação a ações de mitigação sejam cumpridas, assim como os recursos prometidos, de fato, sejam aplicados.

“A gente está na COP da implementação. Tem a questão do balanço ético, para vermos se os países estão realmente fazendo aquilo que prometeram. E ver se isso está sendo suficiente para o que a gente espera”, disse, em entrevista ao Terra durante o Encontro Futuro Vivo, que aconteceu na última terça-feira, 26, e contou com a participação de Txai em uma das palestras. 

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Sobre o financiamento, Txai pontua a importância de que sejam cumpridos os compromissos de direcionamentos de recursos aos países em desenvolvimento. “Para tudo, é preciso recurso”, reforça.

Com relação aos povos originários, ela cita como ponto-chave a demarcação das terras indígenas – tanto por garantia de direitos, como por encarar essa como uma questão primordial para a proteção das florestas. “São os povos indígenas que estão ali como protetores”.

Outro ponto que ela destaca é o da transição energética. No Brasil, o desmatamento -- atrelado à atuação do agronegócio -- é apontado como o principal emissor de gases de efeito estufa. Mas, no mundo, o “grosso” vem da geração de energia vinculada ao uso de combustíveis fósseis. É preciso comprometimento dos países para mudar isso.

Para ela, a articulação para que esses debates não deixem de ocorrer está sendo feita – tanto pelo movimento indígena, como pela sociedade civil como um todo. “Eu vejo um grande esforço dos parentes que estão no nível institucional, nos representados nesses espaços”, destaca. 

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Sobre como o Brasil vai lidar com tudo isso, por hora, ela avalia ser difícil dizer “se vai ser isso, vai ser aquilo” devido ao atual contexto político – não só brasileiro, mas mundial. “[O momento está] extremamente instável. É complexo”. Para Txai, não é apenas a questão climática, mas uma crise humanitária.

Foto: Lu Aith

Representação brasileira

Além de ser ativista indígena pela justiça climática e fundadora e coordenadora do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia, em agosto, Txai foi nomeada como representante brasileira do Grupo Consultivo de Jovens sobre Mudança Climática da Organização das Nações Unidas (ONU). No total, quatorze jovens líderes climáticos do mundo foram escolhidos pelo secretário-geral António Guterres.

Ela contou que, nesse primeiro momento, o grupo está analisando como atuar de forma efetiva e real, bem como refletindo sobre qual é o impacto que querem levar ao secretário-geral da ONU, considerando as múltiplas vozes e contextos que precisam ser reconhecidos.

“Porque é isso: os caras que decidem, eles não têm noção do que a gente está vivendo. Então como que a gente faz essas realidades chegarem neles que estão tomando as decisões? São muitas realidades, e o mundo todo está sofrendo”, destacou.

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Guardiões da floresta

As falas de Txai foram ao encontro do que ela disse no palco do evento Futuro Vivo, ao lado das lideranças Sinéia do Vale e Naywëni Yawanawá, com mediação de Kaká Werá. Juntos, em uma conversa entre gerações e povos, eles falaram sobre a importância da conexão com a ancestralidade em busca de um futuro melhor, em meio à crise climática.

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Os povos originários são reconhecidos como os guardiões da floresta, mas a luta pelo fim de sua destruição não é só deles. Nisso, Txai Suruí reforçou a importância de um diálogo amplo sobre as questões de clima com a sociedade – que, como pontua, tem que entender a importância de cobrar representantes, governos e empresas.  “Se dependesse só da gente, já estaria resolvido”, disse a líder indígena. 

“Ouvir os povos indígenas e garantir seus territórios faz parte da solução” – Txai Suruí

Ela explica que os povos indígenas já sentem a mudança do clima e já falam sobre isso há muito tempo. Cientistas não negam o que está acontecendo com o planeta, e as soluções para mitigar a crise – que giram principalmente em torno da redução das emissões de gases de efeito estufa – já são evidentes. “Então, o que está faltando?”, questionou.

Se o Brasil, que irá sediar a COP30, quer ser líder na pauta de enfrentamento às mudanças climáticas, ainda é preciso garantir direitos que deveriam já estar assegurados, comentou Txai. Como que não se aceite a exploração de petróleo na Amazônia, que haja um combate efetivo ao garimpo ilegal e que, além da demarcação dos territórios indígenas, todos os biomas sejam protegidos.

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Fonte: Futuro Vivo
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