Como esperado, os deputados franceses se recusaram, nesta segunda-feira (8), a dar o voto de confiança ao governo do primeiro-ministro François Bayrou, que deve entregar sua renúncia ao presidente Emmanuel Macron na terça-feira (9).
O voto de confiança na Assembleia Nacional francesa é um mecanismo parlamentar pelo qual o governo solicita formalmente o apoio da maioria dos deputados para continuar no cargo ou para aprovar sua política. Dos 577 parlamentares, 364 votaram contra o voto de confiança, enquanto 194 deputados da coalizão governista votaram a favor.
François Bayrou apresentará sua renúncia ao presidente Emmanuel Macron na manhã de terça-feira, de acordo com um de seus colaboradores próximos. Se aceitar a renúncia, Macron terá que nomear um novo primeiro-ministro, o quinto desde sua reeleição em 2022, ou dissolver a Assembleia Nacional novamente, pouco mais de um ano após as eleições legislativas antecipadas que ele convocou após a derrota de seu partido nas eleições europeias.
Desde a antecipação das eleições legislativas de 2024, a França vive uma profunda instabilidade política, sem maiorias parlamentares estáveis, em um contexto de elevada dívida pública: quase 114% do PIB. Nos últimos meses, o premiê tentou, sem sucesso, convencer os deputados a apoiar seu plano orçamentário para 2026, que prevê € 44 bilhões (cerca de R$ 279 bilhões na cotação atual) em cortes.
Em seu último discurso diante da Assembleia, antes do voto que levou à queda de seu governo, o primeiro-ministro alertou que o "superendividamento" representa uma "emergência vital" para a França. Neste contexto, a queda de Bayrou era prevista. "Vocês podem derrubar o governo, mas não podem apagar a realidade", disse aos parlamentares.
O chefe de governo, de 74 anos, que ficou 9 meses no cargo, decidiu pedir o voto de confiança da Assembleia, embora não fosse obrigatório, depois que a oposição - que reúne partidos que vão da extrema direita até a esquerda radical - rejeitou seu programa de cortes no orçamento.
Sacrifício de feriados
Manifestações foram convocadas em várias cidades para celebrar a queda do governo. O anúncio em julho de seu plano de austeridade, que incluía a eliminação de dois feriados, reacendeu o descontentamento social na França. Na quarta-feira (10) está prevista uma jornada de protestos com o lema: "Vamos bloquear tudo".
A pressão recai agora sobre o presidente francês Emmanuel Macron, que informou, logo após o voto na Assembleia, que nomearia um novo primeiro-ministro nos próximos dias. A outra opção era convocar eleições legislativas antecipadas.
Os dois cenários não estão isentos de riscos. Mathieu Gallard, do instituto de pesquisa Ipsos, afirma que a crise poderia continuar mesmo com a convocação de novas eleições legislativas. "Nenhum dos três blocos (esquerda, centro-direita e extrema direita) tem um apoio eleitoral que permita obter uma maioria absoluta na Assembleia Nacional", resume o analista.
A líder da extrema direita Marine Le Pen, em boa posição nas pesquisas, pediu a convocação "ultrarrápida" das eleições - mas ela não poderia se candidatar devido a uma pena de inelegibilidade. Nesta segunda-feira, a Justiça francesa anunciou que o julgamento do recurso de Le Pen acontecerá entre 13 de janeiro e 12 de fevereiro.
Em menos de dois anos, quatro chefes de governo já foram nomeados: Élisabeth Borne, Gabriel Attal, Michel Barnier e Bayrou.
O novo primeiro-ministro enfrentará o desafio de conciliar as reivindicações da oposição. Macron defendeu na semana passada que seu atual governo estenda a mão aos socialistas para buscar a estabilidade. Entre os nomes que circulam para o cargo estão os atuais ministros da Defesa, Sébastien Lecornu; da Economia, Éric Lombard; da Justiça, Gérald Darmanin; e da Saúde, Catherine Vautrin, entre outros.
Classificação da Fitch
Em 2024, Macron demorou quase dois meses para nomear Barnier, mas desta vez a nova nomeação deve ser mais rápida, especialmente quando a incerteza política parece afetar os mercados financeiros.
Na próxima sexta-feira, a agência Fitch deve anunciar sua nova classificação da dívida soberana da França. Em março, a organização advertiu que rebaixaria a nota do país se o governo não conseguisse implementar um "plano confiável" para permitir a redução da dívida a médio prazo.
A queda de um novo governo poderia levar Macron à renúncia, apesar de seu mandato terminar apenas em 2027. Mas o presidente já descartou a possibilidade, desejada por 64% dos franceses, segundo uma recente pesquisa da Odoxa-Backbone, e que a esquerda radical defende.
Os nove meses de governo de Bayrou também foram marcados pelo escândalo sobre supostas agressões físicas e sexuais durante décadas em um colégio católico do sul da França, onde os filhos do primeiro-ministro estudaram. Na época dos fatos, na década de 1990, ele era ministro da Educação. Uma comissão parlamentar apontou sua "falta de atuação" para interromper as agressões.
Com AFP