Polícia Civil do RN confirma que Igor Cabral afirmou ser autista em depoimento, mas não apresentou laudo; defesa vai pedir exames

Advogado que representa o agressor diz que família do ex-atleta já havia consultado psiquiatra para avaliar características de TEA e TDAH, porém, nenhum teste específico foi aplicado

7 ago 2025 - 09h27
(atualizado às 10h20)
Homem é preso após agredir namorada com 61 socos dentro de elevador em Natal (RN)
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A Secretaria de Comunicação da Polícia Civil do Rio Grande do Norte (SECOMS) confirmou com exclusividade ao blog Vencer Limites que Igor Cabral, ex-atleta indiciado por tentativa de feminicídio após atacar a namorada com mais de 60 socos no rosto, afirmou em depoimento que é autista e, no momento da agressão, passava por uma crise de claustrofobia, mas o órgão esclareceu que, até agora, nenhum laudo que ateste esses diagnósticos foi apresentado.

O crime foi cometido no dia 26/7 dentro do elevador de um prédio na zona sul da capital Natal e registrado por câmeras de vigilância. Um funcionário do condomínio chamou a polícia, que deteve Igor Cabral em flagrante.

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"A Polícia não se responsabiliza pela veracidade de informações médicas ou diagnósticos mencionados pelos envolvidos. No caso em questão, o investigado afirmou inicialmente que sofreu um "surto claustrofóbico" e, de forma informal, mencionou que ele e o filho eram autistas. Essa informação foi registrada como relato dele, sem qualquer comprovação técnica ou documentação apresentada até o momento", declarou a SECOMS.

Igor Cabral, de 29 anos, jogou basquete
Igor Cabral, de 29 anos, jogou basquete
Foto: Reprodução/Redes sociais / Perfil Brasil

A defesa do ex-atleta informou que a família de Igor Cabral, antes do ataque no elevador, já havia consultado um psiquiatra e houve indicação inicial de que o jovem teria características que correspondem ao Transtorno do Espectro Autista (TEA) e também ao Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), mas o ex-jogador não foi submetido a nenhum exame específico porque se recusou a passar por avaliações e não há laudo emitido e assinado por profissional especializado. "Irei pedir judicialmente esses exames", diz o advogado que representa o agressor indiciado. O defensor informou ainda que o rapaz tem um filho de 8 anos de idade, que é autista com diagnóstico confirmado, vive com a mãe da criança e recebe pensão paga pelo pai.

Não há relato de que o rapaz tenha usado as condições objetivamente como justificativa para o ato, embora ele tenha mencionado ser autista no depoimento, apesar de não aceitar fazer os exames que podem confirmar o diagnóstico. A primeira citação ao autismo surgiu na semana passada em entrevista da delegada responsável pelo caso à Inter TV (afiliada da Rede Globo), o que gerou reações da comunidade autista, de pessoas e instituições, nas redes sociais e na imprensa (saiba mais no episódio 202 da coluna Vencer Limites no Jornal Eldorado)

Direitos da pessoa com deficiência - A pedido do blog Vencer Limites, o advogado Emerson Maia Damasceno, autista e pessoa com deficiência física, presidente da Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência da OAB/CE, avalia de que maneira uma eventual confirmação de que Igor Cabral tem TEA e TDAH pode alterar o caso.

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"A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (da ONU) e a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (n° 13.146/2015) estabelecem a dignidade no acesso à Justiça, oferta de acessibilidade durante a audiência e eventual encarceramento em unidade prisional acessível. Há também a Resolução nº 369/2021 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determina procedimentos e diretrizes para a substituição da prisão por medidas alternativas para gestantes, mães, pais e responsáveis por crianças e pessoas com deficiência", detalha o jurista e membro da Comissão Nacional de Defesa da Pessoa com Deficiência do Conselho Federal da OAB.

Também está em vigor no País, a Lei n° 12.764/2012, conhecida por Lei Berenice Piana, que institui a "Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista" e garante atenção integral e prioridade no atendimento em serviços públicos e privados.

"É de interesse de toda a comunidade, de quem luta pelos direitos de pessoas com deficiência, pela inclusão, famílias atípicas, que todos esses tipos de argumentações no âmbito de processos penais sejam vistos com máximo rigor a fim de que uma eventual inimputabilidade - a alegação de que uma pessoa não tem condição de saber que aquele ato cometido seria ilícito, ilegal, criminoso ou a pessoa não teria controle daquilo - só sejam concedidos após perícia oficial, para não ferir conquistas históricas de muita luta pela inclusão e pelos direitos de pessoas com deficiência, inclusive em nível processual, para que isso não seja banalizado de forma alguma. Pessoas com deficiência, historicamente, são vítimas de diversas violências", ressalta Damasceno.

"Agora, o que acontece em questões assim? Você tem um incidente processual, no âmbito de um réu, preso ou não, pessoa em um processo criminal ou reclusa, alegando o chamado 'incidente de sanidade mental', que não teria condição de entender o ato criminoso ou autocontrole no momento. É feita uma perícia oficial - e que seja feita com muito rigor - no âmbito de uma eventual prisão provisória. A pessoa está encarcerada, foi acusada de um determinado crime e está ali por ordem judicial. Se for realmente entendido pelo próprio juiz que a pessoa seria autista, mesmo nível 1 de suporte, ela teria direito a algum tipo de adaptação razoável", pontua o especiaista.

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"Em uma eventual condenação e execução da pena definitiva, a pessoa pode ter algum benefício legal, mas é importante destacar que não podemos, de forma alguma, permitir que esse tipo de direito para pessoas com deficiência seja desvirtuado. Independentemente da imputabilidade ou inimputabilidade da pessoa que alega ter deficiência ou ser autista, é importante dizer que há vítimas reais, que sofreram uma agressão. Então, que haja comprovação de que há realmente uma deficiência", alerta Emerson Maia Damasceno, que é ex-presidente da comissão especial de defesa da pessoa autista da OAB Nacional.

Apuração - Nota divulgada pela Secretaria de Comunicação Social da Polícia Civil do Rio Grande do Norte (SECOMS) detalha a investigação do caso.

"A Polícia Civil do Rio Grande do Norte, por meio da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher da Zona Leste, Oeste e Sul (DEAM/ZLOS), concluiu o inquérito referente à agressão cometida contra uma mulher de 35 anos, no último sábado (26), dentro de um elevador de um condomínio localizado no bairro de Ponta Negra, Zona Sul de Natal. A vítima foi brutalmente espancada pelo então namorado, que desferiu mais de 60 socos, conforme registrado pelas câmeras de segurança do elevador. O agressor foi preso em flagrante pela Polícia Militar do RN.

Assim que o suspeito foi conduzido, a equipe de plantão da Delegacia Especializada de Pronto Atendimento a Grupos em Situação de Vulnerabilidade (DPAGV), iniciou todas as diligências com agilidade e sensibilidade: foi até o hospital para ouvir a vítima, que, impossibilitada de falar, escreveu o que havia acontecido. Com base nos elementos colhidos e demais informações, a equipe representou pela prisão preventiva do autor, que foi deferida pela Justiça.

A partir de então, a DEAM/ZLOS conduziu integralmente o caso, colhendo novos elementos probatórios, ouvindo a vítima novamente e mais quatro testemunhas. Durante o plantão, também foram ouvidos dois policiais militares e o investigado.

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O inquérito foi remetido ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, com o agressor indiciado por tentativa de feminicídio, com base no artigo 121-A, §2º, incisos I e V, c/c artigo 14, inciso II, do Código Penal Brasileiro. No relatório final, a Polícia Civil reforçou a necessidade de manutenção da prisão preventiva, já decretada, diante da gravidade dos fatos, da periculosidade do indiciado e da necessidade de proteção à integridade física e psicológica da vítima.

A instituição reafirma seu compromisso com o enfrentamento à violência contra a mulher e orienta que casos de violência doméstica de qualquer natureza sejam denunciados por meio do Disque 181, com garantia de sigilo".

Pedido de desculpas - A defesa de Igor Cabral apresentou uma carta assinada pelo agressor indiciado. "Eu, Igor Eduardo P. Cabral, venho com profundo respeito, me manifestar diante dos acontecimentos recentes que abalaram tantas pessoas. Reconheço que houve dor, angústia e sofrimento, especialmente para Juliana, sua filha, sua família, bem como para os meus pais e demais entes queridos. Lamento profundamente que minha conduta, influenciada por um contexto de uso de substâncias e instabilidade emocional, tenha contribuído para essa situação. Embora as circunstâncias ainda estejam sendo apuradas, sinto a necessidade sincera de expressar meu pedido de perdão a todos que, de alguma forma, foram afetados. Não tenho intenção de justificar nada, tampouco minimizar o impacto dos fatos. Apenas desejo que Juliana consiga encontrar força para seguir em frente, com serenidade, coragem e paz. A ela, sua filha e sua família, envio minhas orações e meu mais genuíno respeito. Enfrento o momento atual com humildade e esperança de que, com o tempo, todas as partes envolvidas possam encontrar caminhos de cura, reflexão e recomeço. Com arrependimento e respeito, Igor Eduardo P. Cabral".

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