A Justiça de São Paulo tornou o deputado Lucas Bove réu por violência doméstica contra sua ex-esposa, Cíntia Chagas, e aplicou multa de R$ 50 mil por descumprimento de medidas judiciais, mas negou o pedido de prisão preventiva.
A Justiça de São Paulo aceitou a denúncia e tornou réu o deputado estadual Lucas Diez Bove (PL) por violência doméstica, psicológica, ameaça e perseguição contra a ex-esposa Cíntia Chagas.
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A denúncia feita pelo Ministério Público foi enviada ao juízo no último dia 23 e, após análise, o juiz Felipe Pombo Rodriguez negou o pedido de prisão preventiva. De acordo com a decisão ao qual o Terra teve acesso, apesar da gravidade do descumprimento de medidas judiciais estipuladas à ele, elas “limitam-se ao meio digital, sem notícia recente de aproximação física, ameaça direta atual ou risco imediato à integridade física da vítima”.
Por isso, o magistrado determinou que o parlamentar pague R$ 50 mil de multa por violar as ordens do Judiciário impostas ao parlamentar, como mencionar a ex-companheira publicamente.
O juiz cita uma publicação recente, na qual Bove cita a influenciadora, na qual diz que Cíntia ignora uma cautelar que a proíbe de falar sobre o assunto. "Ou seja, a militância feminista que alcançou o poder público deixa claro que, se você for mulher: Não precisa cumprir as regras impostas pela justiça", escreveu o deputado.
A quantia determinada em juízo será revertida em favor da vítima e destinada ao cumprimento das medidas protetivas.
Em nota à reportagem, a defesa de Bove alegou que comprovará que as acusações dirigidas ao seu cliente são falsas e que provará sua inocência (confira a nota na íntegra abaixo).
Já a defesa de Cíntia, representada pela advogada Gabriela Manssur, afirmou que a decisão representa um “recado firme para aqueles que tentam caluniar e descredibilizar não apenas as vítimas, mas também as mulheres que dedicam sua vida a defendê-las e protegê-las”.
Denúncia
O parlamentar bolsonarista e Cíntia foram casados por sete meses, e conforme a denúncia do MP, ele utilizava de agressão física para constrangê-la. Ele também monitorava as roupas dela e pedia fotos em viagem a trabalho para comprovar que estava sozinha.
A Promotoria cita que um relato apontou que o denunciado tinha o hábito de apontar sua arma de fogo para a influenciadora enquanto fumava maconha, como se fosse uma “brincadeira”.
O documento também diz que ele chegou a arremessar uma faca contra a perna da vítima, em uma forma de intimidá-la. O deputado também a ameaçava dizendo que se descobrisse alguma traição “ele a mataria com a arma dele e pediria para o segurança esconder o corpo da vítima”.
As agressões também incluíam puxões e apertões em Cíntia Chagas. A violência psicológica fez com que a vítima passasse a fazer uso de antidepressivo e desenvolvesse Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Ela também relatou queda significativa de cabelo e disse que, por medo, precisou começar a usar veículos blindados, o que restringiu seu direito de ir e vir, já que antes usava veículos de aplicativo.
O que diz a defesa de Lucas Bove
“O Deputado Lucas Diez Bove, através de seus advogados constituídos, esclarece que felizmente o descabido pedido de prisão acabou indeferido, REAFIRMANDO que agora finalmente poderá comprovar a mendacidade das acusações que lhe foram dirigidas, produzindo provas que evidenciem sua inocência, de forma absoluta.
Não se perca de vista que esse mesmo enredo ocorreu quando a intitulada vítima acusou seu ex-companheiro, o qual acabou inocentado e indenizado porque se constatou que as acusações eram falsas.
Essa defesa não cansará de ressaltar e não se conformar com o vazamento contínuo de informações a respeito do processo, que possui segredo e sigilo judicial, bem como que a intitulada pseudo vítima, Cintia Maria Chagas, mesmo havendo expressa ordem, continua a desrespeitar e descumprir as suas decisões restritivas, querendo criar suas falsas narrativas”.
O que diz a defesa de Cíntia Chagas
“O fato de a Justiça acolher as denúncias do Ministério Público e transformar Lucas Bove em réu pelos crimes de crimes de violência psicológica, física, perseguição, ameaça e descumprimento de medidas protetivas contra Cíntia Chagas é um passo fundamental no combate à impunidade e um marco na aplicação da Lei Maria da Penha em sua plenitude, inclusive diante da violência praticada por meios digitais e institucionais.
Depois de um ano e três meses de muito trabalho, estudo e resistência, a Justiça finalmente prevaleceu. Foi um tempo de dor e coragem, em que cada passo exigiu fé e firmeza para enfrentar não apenas as violências sofridas, mas também o peso do silenciamento, da descredibilização, das perseguições, calúnias e ameaças veladas.
Durante todo esse período, houve tentativas claras de manipular a opinião pública contra os direitos das mulheres, de distorcer fatos, inverter papéis e transformar a vítima em ré. Mas o tempo e a Justiça colocam tudo em seu lugar.
Essa decisão também representa um recado firme para aqueles que tentam caluniar e descredibilizar não apenas as vítimas, mas também as mulheres que dedicam sua vida a defendê-las e protegê-las. Porque quando alguém tenta calar uma mulher, atinge todas as que tiveram a coragem de se levantar ao lado dela.
Essa luta é de todas nós; advogadas, profissionais, cidadãs que acreditamos que defender uma mulher é defender todas, independentemente de sua ideologia política, classe social, cor, origem, idade ou religião.
É nesse instante que o Direito deixa de ser apenas técnico e se torna instrumento de proteção, dignidade e transformação social. Seguimos firmes, com serenidade e propósito, porque toda vitória justa é, antes de tudo, um ato de determinação, de amor pelo que se faz e de fé na Justiça, principalmente em se tratando de direitos das mulheres.
Meu reconhecimento à coragem e à determinação de Cíntia Chagas, que, mesmo diante de tanto sofrimento, manteve-se firme e confiante. Agradeço profundamente por acreditar no meu trabalho e seguir (quase sempre) as minhas orientações, permitindo que, juntas, transformássemos dor em justiça, não só por ela, mas por todas as mulheres brasileiras”.