STJ nega extensão de patente do Ozempic, e registro vence em março de 2026
Preço do medicamento deve cair com entrada de novos fabricantes do medicamento no mercado. Queda da patente ainda abre espaço para que semaglutida seja incorporada ao SUS
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou, em julgamento nesta terça-feira, 16, o pedido de extensão da patente da semaglutida, princípio ativo do Ozempic, Wegovy e Rybelsus, apresentado pela Novo Nordisk. Com isso, a patente irá expirar em março de 2026 no Brasil, abrindo espaço para a produção e venda de medicamentos com o mesmo princípio ativo por outras farmacêuticas.
A semaglutida é considerada um análogo de GLP-1, ou seja, a substância imita a ação desse hormônio natural produzido no intestino. Basicamente, ela ajuda na produção de insulina, reduz a fome e aumenta a saciedade. Por isso, é usada no tratamento para diabetes tipo 2 e obesidade. Os medicamentos dessa classe são considerados por médicos como "revolucionários", já que levam a resultados expressivos no controle dessas doenças e têm um bom perfil de segurança.
A queda da patente tende a reduzir o preço dos medicamentos em cerca de 30% devido à entrada de outros competidores no mercado, mostram estudos. "Não que vá ser uma medicação de acesso para a população total que precisa, mas a gente aumenta o percentual de pessoas que vão conseguir utilizar, principalmente no setor privado", diz a endocrinologista Maria Edna de Melo, que integra a Comissão de Relações Institucionais e Políticas Públicas da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
A redução do valor também favorece a oferta do tratamento no Sistema Único de Saúde (SUS). Em agosto, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) deu parecer desfavorável à incorporação da semaglutida e liraglutida (dos remédios Saxenda e Victoza), considerando, entre outras razões, o impacto orçamentário de mais de R$ 8 bilhões anuais dos medicamentos referência, antes da queda da patente — o valor representa quase o dobro do orçamento do Farmácia Popular em 2025.
"Com a entrada de novos medicamentos genéricos no mercado e aumento da concorrência, os preços devem cair de forma significativa. Esse é um fator determinante para a análise de sua possível incorporação ao SUS", afirma o Ministério da Saúde.
No Brasil, estima-se que há mais de 40 milhões de pessoas com obesidade. Em agosto, já considerando o fim da exclusividade da patente no próximo ano, o Ministério da Saúde solicitou à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) prioridade no registro de medicamentos com semaglutida e liraglutida. Já existem, inclusive, versões concorrentes em análise pela agência regulatória.
A perspectiva de incorporação do remédio "é extremamente relevante para os pacientes do SUS, porque no sistema público não tem nada (de tratamento para obesidade)", avalia Maria Edna. A médica acredita que o mais provável é que a incorporação aconteça por meio do acordo entre a farmacêutica brasileira EMS e a Fiocruz para a produção nacional de semaglutida.
Mesmo com a incorporação ao sistema público, o preço do medicamento dificilmente cairá a um nível que permita ao governo custear o tratamento de todos os pacientes elegíveis, dado o elevado número de pessoas com obesidade. Por isso, ele deverá ser oferecido, ao menos inicialmente, apenas para casos mais graves de obesidade e diabetes do tipo 2.
Entenda o julgamento
A Novo Nordisk apresentou o pedido de patente do Ozempic ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) em 2006, obtendo o registro em 2019. Como a lei reserva 20 anos de exclusividade de venda para as empresas que patentearam a tecnologia a partir da data em que o pedido foi feito, a patente da caneta expira em 2026.
No entanto, a farmacêutica alega ter perdido 12 anos de exclusividade para explorar a venda da semaglutida devido à demora para aprovação do INPI. Para a empresa, a extensão da patente é uma recomposição do tempo perdido.
A patente não é um requisito sanitário e não faz parte da avaliação do registro na Anvisa, ou seja, não é preciso ter a patente para começar a vender o medicamento. Trata-se de um instrumento de proteção intelectual para impedir que terceiros fabriquem e vendam a invenção, possibilitando que as empresas recuperem os investimentos feitos na pesquisa e desenvolvimento dos produtos. O objetivo é incentivar a inovação e o progresso tecnológico.
O STJ analisou o recurso especial da Novo Nordisk e decidiu, por unanimidade, negar o pedido. Em seu voto, a ministra Maria Isabel Gallotti reconhece a demora injustificada do INPI, mas pondera que não há nenhuma lei que preveja um ajuste pontual no prazo de patente em casos de atraso da administração pública, o que precisaria ser endereçado pelo Legislativo.
"O INPI realmente demorou de forma absolutamente injustificável, até na movimentação do pedido de patente, que demorou quatro anos para dar o despacho inicial em uma das patentes", afirma a relatora.
No entanto, ela lembra que o Supremo Tribunal Federal (STF) já julgou a possibilidade de extensão do prazo. Em 2021, o Supremo declarou como inconstitucional a extensão automática do prazo por entender que isso violava a função social da patente e afetava a concorrência, a saúde pública e a segurança jurídica. Segundo a ministra, essa possibilidade foi afastada mesmo em casos de demora do INPI.
"Eu observo que, na realidade, o que se extrai do acórdão do Supremo (Tribunal Federal) não é que as empresas não tenham sofrido prejuízo, isso me parece inequívoco, mas, poderando os interesses particulares da empresa e os interesses dos consumidores de medicamentos, especificamente do SUS, o Supremo optou por privilegiar os interesses dos consumidores e do próprio Sistema Único de Saúde (SUS), não cabendo ao STF, por mais relevantes que sejam as razões das titulares da patente, descumprir e decidir em disconformidade ao acórdão do STF", conclui a ministra do STJ.