5 coisas que aprendi com meus pacientes sobre envelhecer com leveza
A passagem do tempo é inevitável, mas há ações para tornar o processo mais suave, ensina geriatra
Certa vez, um amigo querido me disse que o geriatra é, em partes, um bom "fofoqueiro". Enquanto alguns indivíduos excluem a pessoa idosa e não escutam suas histórias, nós fazemos questão de ouvir, prestar atenção aos detalhes e, dessa forma, individualizar o cuidado, respeitando todos os "segredos de confissão".
Ao longo desses anos de escuta, é interessante notar como as vozes se cruzam e tanto dores quanto conquistas muitas vezes são semelhantes. Por exemplo, é quase unanimidade o receio de "dar trabalho" para a família ou de se sentir um "peso" para os outros. Assim, resolvi reunir alguns ensinamentos que aprendi com meus pacientes sobre como podemos envelhecer com mais leveza.
Primeiro, ter propósito na vida é algo maravilhoso. Mesmo aos 70, 80, 90 ou 100 anos há vontades e desejos que nos movem. Pode ser lutar contra alguma opressão, educar filhos e netos, transmitir afetos ou qualquer outro projeto que nos ajude a levantar da cama pela manhã e seguir caminhando, mesmo com as adversidades que possam aparecer. Às vezes, pode ser difícil entender esse propósito, por isso é tão importante olhar para dentro, entendendo valores e a diversidade de existir nesse mundo.
Um segundo ponto importante se refere ao dinheiro. Há claros indícios de que pessoas idosas com melhores condições socioeconômicas apresentam condições mais favoráveis ao envelhecimento com qualidade, e a desigualdade precisa ser combatida para garantirmos justiça social também no envelhecimento.
Entretanto, dinheiro não garante afeto, cuidados e carinho. Já tive casos de filhos que, diante da finitude do pai, me avisaram: "Doutor, pode me pedir para cuidar dele, mas não me peça para amá-lo!".
São casos em que relações não foram criadas ao longo da vida ou problemas pessoais atravessaram as existências. Eles evidenciam que, além de buscar formas para envelhecer com qualidade, precisamos a todo momento lembrar que o nosso capital social - formado por todas aquelas pessoas que podem estar presentes, com afeto e carinho, nos momentos de maior dificuldade - é o que mais garante apoio.
Por isso, pedir desculpas, falar o que sentimos, mostrar sensibilidade e fortalecer relações são tão importantes para uma boa lembrança do passado quanto para uma melhor construção do presente e do futuro.
Nesse contexto, mais um ponto que merece destaque é o da visão. E não faço referência ao órgão do sentido, mas à capacidade de ser realmente visto pelos outros e por nossa sociedade. Não consigo nem imaginar como é cruel para alguém se sentir "escanteado" por uma sociedade idadista, que reduz seu valor e gera a sensação de invisibilidade. Não à toa a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) defende que o primeiro pilar para envelhecermos com saúde é priorizar medidas que alterem a forma como vemos, agimos e sentimos o envelhecimento.
Por fim, algo que também contribui para envelhecermos com leveza se relaciona à família. Existem casos em que ela pode ajudar com respeito, apoio, carinho, afeto e sentido na vida. Porém em outros ela pode até piorar a situação - já acompanhei pacientes cujo filho ou outro familiar era violento psicologicamente, controlador ou negligente.
Mas família é uma palavra com significados muitos amplos. Mais do que uma questão sanguínea, ela é composta por aqueles com quem criamos laços e que escolhemos para estar ao nosso lado.
Respeitar todas as formas de família é garantia de maior leveza no envelhecimento. Basta lembrar daqueles que romperam com seus parentes ou das "famílias interespécies", nome sofisticado para composições em que um membro familiar não é humano, podendo ser um cão, um gato, um pássaro ou um robô, por exemplo.
Envelhecer é inevitável, mas, assim como a fofoca, o que iremos fazer com essa informação é opcional. Construir pontes, mostrar-se sensível, ver e ouvir os outros são opções para quem deseja caminhar para um presente e futuro mais leves.