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Chefes acham assustador revelar falhas, diz especialista em inteligência emocional; como mudar isso?

Raul Aparici, diretor global de aprendizagem da The School of Life, afirma que é preciso autoconhecimento para um líder saber por que tem medo de assumir fraquezas

7 out 2023 - 17h10
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As lideranças aprenderam nas suas vidas profissionais e pessoais que não podem demonstrar fraqueza. Isso torna a posição de chefe muito solitária. "Não tem ninguém para compartilhar seus medos e suas experiências de falha", afirma Raul Aparici, diretor global de aprendizagem da The School of Life, organização inglesa focada em inteligência emocional.

Em entrevista ao Estadão, o especialista diz que para mudar isso é preciso desenvolver a autoconsciência e descobrir "por que é tão assustador falhar ou ser percebido como um fracasso".

Confira a seguir trechos da entrevista:

O que é inteligência emocional na prática?

A inteligência emocional é a habilidade de entender um pouco melhor nosso mundo interior. No ambiente de trabalho todos nós usamos máscaras. Fingimos que está tudo está ótimo. Mas, na verdade, sabemos que por dentro todos estão lutando de alguma forma.

Podemos estar sentindo inveja de nossos colegas. Podemos estar nos sentindo inseguros, ter perguntas, mas não queremos fazê-las porque não queremos parecer ou nos sentir estúpidos e impostores. Temos todas essas lutas internas e meio que pensamos que somos os únicos com essas lutas.

Como funciona no dia a dia?

O que a inteligência emocional nos permite é, primeiro de tudo, nomear as lutas para nós mesmos, para entender um pouco melhor como funcionamos, e então perceber que os outros também estão lutando.

Isso significa que, quando alguém vem até mim com raiva, posso olhar por baixo da raiva e tentar entender o que mais pode estar acontecendo com essa pessoa, porque se eles estivessem vindo até nós com lágrimas nos olhos, nossa reação seria muito diferente.

A pessoa emocionalmente inteligente é capaz de traduzir de alguma forma o que vê e ser um pouco cético em relação a essas primeiras emoções e pensar no que mais pode estar acontecendo. Então, para mim, a inteligência emocional é sobre consciência, e essa consciência pode nos levar a fazer escolhas diferentes.

Também há o elemento de autorregulação no modelo de inteligência emocional de Daniel Goleman, que é muito importante. Esta ideia de que aprendemos a nos regular, para podermos permanecer presentes em circunstâncias difíceis.

Se você estiver começando a sentir que realmente quer gritar de volta ou algo assim, você encontra uma maneira de se centrar e criar tempo e espaço entre a emoção e a sua resposta.

Como os líderes podem desenvolvê-la?

O autoconhecimento e a autoconsciência são os alicerces da inteligência emocional na qual ancoramos todas as diferentes habilidades emocionais que ensinamos nas organizações. Tudo começa a partir de uma base de autoconhecimento, porque as pessoas nos perdoarão por não sermos perfeitos se estivermos cientes das maneiras pelas quais somos imperfeitos.

Se eu puder explicar aos outros as maneiras pelas quais sou difícil, eles terão mais compaixão, porque eles também têm maneiras pelas quais são difíceis. Mas se eu não estiver consciente de como sou e apenas pensar que sou esse ótimo líder, mas tudo o que estou fazendo é deixar um rastro de destruição para trás de mim, as pessoas terão menos empatia por isso, porque não demonstraremos que estamos cientes de nossas falhas.

Então, é bastante reconfortante estar com alguém que pode ser vulnerável o suficiente para compartilhar também os aspectos difíceis de si.

Lideranças precisam lidar com pressão diariamente. Então, mostrar-se vulnerável é um desafio. O que líderes podem fazer para driblar o medo e a vergonha de falhar em algum momento?

A primeira coisa a fazer é desenvolver a autoconsciência. Pense por que é tão assustador falhar ou ser percebido como um fracasso. Geralmente, essas coisas têm uma longa história durante a criação, onde a falha não era uma opção, onde pensávamos que tínhamos que ser perfeitos para sermos amados.

Aprendemos que admitir a falha não é uma opção, o que então se torna um lugar muito solitário, porque não tem ninguém para compartilhar seus medos e suas experiências de falha. O que significa que também está promovendo uma cultura em que outras pessoas não compartilham suas experiências de falha.

Uma das principais funções da liderança é criar segurança psicológica e uma forma de conter a ansiedade da organização. Então, como posso, enquanto líder, demonstrar vulnerabilidade de uma maneira que apoie o diálogo? Se a liderança não compartilha vulnerabilidade, as pessoas vão achar que ela não sabe o que está fazendo.

Quando o trabalho por propósito/paixão vira um problema?

Falamos sobre propósito, mas muitas vezes isso é meio ambíguo, porque o trabalho é o único lugar onde podemos ampliar nosso senso de propósito. Nos faz sentir que estamos contribuindo de uma forma que talvez em um nível individual não consigamos contribuir.

Às vezes, claro, uma organização pode se apropriar desse espírito que temos e, em seguida, aquilo pelo que éramos realmente apaixonados, se torna algo doloroso. Nós ficamos entediados, não queremos mais fazer porque estamos apenas fazendo isso até cansar.

O que pode ser muito útil é pensar qual é o propósito da organização e, em seguida, qual é o propósito desse indivíduo e como podemos tornar o encontro de uma maneira saudável para que o meu propósito seja amplificado pelo propósito da organização, em vez de sufocado ou de perder a paixão.

Há uma enorme desconexão entre o trabalho que você está fazendo todos os dias e seu usuário final.

Então, pode ser que esteja criando uma solução de software que não vai dar frutos daqui a dois anos, e o principal cliente esteja a milhas de distância. É muito difícil conectar o senso de propósito com o que estou fazendo, porque nunca vejo isso. A organização sempre precisa estar atenta em como lembrar aos outros qual é o propósito mais elevado.

É o oposto do que você estava perguntando de certa forma, porque onde geralmente erramos, é quando perdemos esse propósito. Mas é claro que o lado oposto é quando esse propósito é sequestrado. E então, de certa forma, você sente que perde sua paixão porque é tudo o que você faz.

Em tempos de burnout e níveis extremos de estresse, como lidar com emoções negativas no trabalho?

Na School of Life, não falamos de emoções negativas ou positivas. Falamos de emoções, e todas são válidas. Todas nos dizem alguma coisa. Elas são um sinal de alerta e estão dizendo: 'ei, preste atenção, algo não está funcionando aqui'. Uma vez que nos tornamos curiosos sobre nossas emoções, não é necessário que sejam negativas ou positivas, podem ser neutras.

Se estou zangado no trabalho, em vez de ser consumido pela raiva, posso ficar curioso a respeito disso. O que está impulsionando isso?

Por exemplo, caso esteja trabalhando até tarde. Por que estou trabalhando até tarde? Por causa deste prazo e desta expectativa, certo? Então, você começa a desvendar um pouco e a entender suas emoções. É o primeiro passo, e depois é pensar em como solucionar.

O que eu sugeriria quando se trata de emoções negativas é que muitas vezes o ônus é colocado sobre o indivíduo para resolver. De alguma forma, estamos dizendo que você tem um problema porque não consegue lidar com isso. Então, as organizações precisam assumir um pouco mais da responsabilidade pelas lutas mentais das pessoas.

Estadão
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