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Estados Unidos

Cavaleiros do séc. XXI mantêm vivo esporte medieval de mil anos

2 ago 2012 - 13h34
(atualizado às 13h36)
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<p>As justas, que eram comuns na Idade Média, ainda são praticadas por grupos nos EUA, Canadá e Europa</p>
As justas, que eram comuns na Idade Média, ainda são praticadas por grupos nos EUA, Canadá e Europa
Foto: World Joust Tournaments / Divulgação

Imagine vestir uma armadura de 30 kg, montar em um cavalo, segurar uma lança de 3 metros e cavalgar na direção do adversário com o objetivo de atingi-lo. Era assim que os cavaleiros medievais acertavam suas contas - cena muito comum em filmes de época. Agora, imagine fazer isso em pleno século XXI, mas por esporte. Parece estranho, mas, mais de mil anos depois de ter surgido, tem muita gente que pratica justa (ou "jousting", em inglês), como é chamada a atividade. Alguns apenas encenam, mas outros levam a modalidade mais a sério, organizando torneios entre os amantes do esporte.

Leia também: astro de esporte medieval defende justa nas Olimpíadas

Em países como Reino Unido, França, Alemanha e Polônia, eventos culturais que apresentam como as justas eram disputadas séculos atrás são frequentes. O mesmo acontece na América do Norte. O britânico Dominic Sewell, dono de uma empresa que organiza eventos históricos pelo Reino Unido, explica que existem vários tipos de justas, e que algumas são apenas shows de entretenimento. Mas, assim como Sewell, vários praticantes do esporte sonhavam em competir em "justas de verdade". Um deles é o instrutor americano Jeffrey Hedgecock, que, em 2003, começou a participar de duelos britânicos e decidiu levar a justa competitiva para os EUA e o Canadá.

"Eu vi justas de verdade em Leeds - eles faziam um tipo de justa que me agradou. Isso foi em 2003, e eu pedi para participar de um torneio que eles têm duas vezes ao ano", disse Hedgecock. O americano se refere à justa competitiva, na qual vence o cavaleiro que tiver mais pontos. Atualmente, não existe um órgão que regule o esporte - por isso, as normas mudam de acordo com o grupo e o local da prática. Em geral, dois competidores ficam frente a frente, a cerca de 60 metros um do outro, em uma espécie de pista dividida por uma barreira. "Isso é chamado de 'tilt', geralmente é uma cerca", explica Hedgecock. Na maioria dos torneios, ganha aquele que quebrar a própria lança na armadura do oponente. Em algumas competições, derrubar o adversário conta pontos - às vezes mais do que quebrar a lança.

Mas Hedgecock queria mais: o sonho dele era levar as justas à América do Norte. Em 2007, ele criou a World Joust Tournaments, que organiza torneios em San Diego, na Califórnia, e em Québec, no Canadá. "Estamos tentando fortalecer o esporte na América do Norte e na Europa, trazê-lo de volta às suas raízes originais fazendo um circuito onde os competidores de mais alto nível possam competir, e o público possa ter uma ideia do que a justa pode ser", disse ele. A competição de Québec está marcada para setembro deste ano e a de San Diego, para outubro. "Esperamos ter cerca de seis torneios pelo mundo em três anos", afirmou.

O entusiasmo de Hedgecock com o esporte é tão grande que ele abriu uma escola especializada no ensino da justa. A Knight School, em Ramona, na Califórnia, dedica-se a ensinar a técnica a pessoas que já sabem cavalgar e querem aprender a lutar com lança e armadura. Lá, ele alia a função a seu trabalho principal, de forjador de armaduras históricas. "Além da justa, eu ensino a usar armas a cavalo. Basicamente, é atingir alvos com um dardo ou uma lança, ou cortar alvos com a espada", explicou. Qualquer um pode se matricular na escola, basta saber cavalgar muito bem - já que Hedgecock não é instrutor de cavalgada. Também é preciso ter uma armadura própria. "Se você vai praticar justa de verdade, a armadura precisa ser ajustada para cada pessoa para que funcione", disse.

Mas aprender a lutar em justas requer um longo treinamento. "Eu começo devagar: observo a cavalgada e ponho um pequeno objeto na mão do aluno, como uma pequena lança. E ele se acostuma a segurá-la em uma mão enquanto usa a rédea em outra mão", explica o instrutor. "Então, eu aumento o tamanho dela até que ele se acostume com a de 3,3 metros de comprimento e 2,7 kg. Depois nós adicionamos armadura, mas tiramos a lança de novo", disse ele. O aluno só poderá competir contra um adversário quando conseguir atingir um alvo fixo de forma segura com a lança e usando a armadura. "É uma coisa muito progressiva. Você faz um pouco de cada vez, em pequenos passos", afirmou o instrutor.

Esporte medieval, homens contemporâneos

Quem pratica justa hoje tem em comum a admiração pela Idade Média, um tema que fascina pessoas em vários lugares do mundo. Mas não ao ponto de achar que nasceu na época errada. Para Dominic Sewell e Jeffrey Hedgecock, a "viagem" medieval das justas se limita às armaduras e à prática do esporte - ambos gostam de viver no século XXI. "A época do auge das justas era um tempo difícil, a vida era muito chata. Você provavelmente viveria a vida no mesmo vilarejo, e se visse algo espetacular, eram justas ou batalhas", disse Sewell. Hedgecock trata a justa como um esporte histórico, "não como um esporte medieval". "Nós acreditamos que é impossível separar a história da atividade, porque ela tem suas origens na história. Mas, ao mesmo tempo, é para pessoas modernas, vivendo em um mundo moderno", afirmou.

Como o esporte não forma atletas profissionais, a maioria das pessoas que compete em justas tem outra profissão e pratica paralelamente, como um hobby. Mas Sewell conseguiu aliar a paixão a um negócio próprio - a criação de cavalos. O interesse surgiu ainda menino: ele nasceu em Barnard Castle, uma pequena cidade britânica que cresceu ao redor de um castelo. "Quando fiquei mais velho, comecei a fazer parte de encenações de batalhas", contou. Sewell gostou tanto que começou a treinar cavalgada com armadura. Hoje, ele comanda a Historic Equitation Limited, que presta serviços para o governo e outros clientes organizando eventos históricos que envolvem cavalos - muitos com justas competitivas. "Levei quase 20 anos de treinamento para me tornar um treinador de cavalos, além de proprietário e fornecedor", disse.

Esporte violento?

A imagem que a maioria das pessoas tem desse esporte medieval é de algo brutal e extremo. E os relatos históricos confirmam a fama: não era raro alguém morrer atingido por uma lança. Mas os competidores contemporâneos desse esporte afirmam que ele não é mais violento do que várias outras modalidades praticadas atualmente. Para Hedgecock, boxe, lutas marciais, hóquei e polo podem ser mais perigosos do que justa. Sewell tem uma opinião parecida. Ele diz que é preciso uma "sequência grave de erros" para que algo grave aconteça. "Você pode ficar com alguns hematomas, mas nada sério", afirmou. "Os riscos podem ser evitados se o cavaleiro tiver o equipamento adequado e especialmente tiver treinamento com cavalos", disse Sewell. Hedgecock diz que não há registro de mortes em torneios recentes.

"O que nós tentamos fazer é mostrar a justa como ela era no século XV. Ainda é um esporte, como era naquela época, mas nós tentamos recriar as armaduras, os equipamentos e os tipos de cavalos que se usava no século XV", explica o empresário Dominic Sewell. "Nunca fazemos qualquer roteiro, só contamos quantos pontos cada um faz com o número de lanças que quebrarmos contra a armadura do outro", disse o britânico.

Fonte: Terra
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