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Mundo

Biden marca diferenças para Trump em primeiro mês de governo

Do estilo a pautas importantes, democrata fez mudanças profundas

19 fev 2021 - 11h44
(atualizado às 12h02)
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Há um mês, no dia 20 de janeiro, o novo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, tomava posse e pedia união e o fim da polarização que marcou os quatro anos do governo de Donald Trump.

Com postura mais 'tradicional', Biden passou primeiro mês recolocando país em órgãos internacionais e lidando com crises deixadas por Trump
Com postura mais 'tradicional', Biden passou primeiro mês recolocando país em órgãos internacionais e lidando com crises deixadas por Trump
Foto: EPA / Ansa - Brasil

"Eu sou um democrata orgulhoso, mas vou trabalhar como um presidente americano. Vamos acabar com a demonização nos Estados Unidos, acabar com a recusa de democratas e republicanos de trabalhar junto porque isso é uma escolha. E se podemos escolher não cooperar, podemos também escolher cooperar", disse Biden em seu discurso inicial.

De imediato, o democrata já recolocou o país no Acordo de Paris sobre o clima, na Organização Mundial da Saúde (OMS) e em comissões de organismos multilaterais internacionais. Também anunciou um plano nacional e centralizado de combate à pandemia de Covid-19, com a promessa de acelerar a vacinação.

Nos dias seguintes, editou uma série de decretos para reverter medidas de Trump, cobrindo desde energias renováveis até imigração, enquanto o Senado ia aprovando, um a um, um dos gabinetes mais diversificados da história americana, com presença equivalente de mulheres e homens e também representantes de minorias étnicas e sociais.

Mas a primeira mudança visível em relação a Trump foi na postura. "A gente perdeu o caráter de show da presidência, que está muito mais preocupada com o dia a dia", destaca o coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília, Márcio Coimbra, em entrevista à ANSA.

"A gente não vê mais os Estados Unidos na primeira página dos jornais todos os dias por declarações bombásticas do presidente Trump. Nesse sentido, o governo Biden é muito mais conservador porque conservadorismo significa prudência, estabilidade, mudanças graduais. Nós temos mudanças profundas, mas que estão sendo feitas aos poucos e sem muito alarde", acrescenta.

A opinião é compartilhada pelo coordenador da graduação em Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Eduardo Mello, que ressalta que o novo mandatário "fez um esforço grande para marcar várias diferenças".

"O presidente mudou o estilo de comunicação. A gente não tem mais um governo que governa o tempo todo nas redes sociais, mas tem uma agenda mais tradicional, uma postura mais tradicional de não se envolver diretamente em todos os temas do debate político e de não buscar polarizar mais ainda a opinião pública. É uma questão de estilo. Biden não busca a polarização ao contrário de Trump", disse Mello à ANSA.

Meio ambiente, pandemia e imigração - Entre as principais medidas promovidas por Biden em seu primeiro mês de mandato, estão mudanças na gestão ambiental, com a retomada daquilo que foi visto durante o governo de Barack Obama, quando o atual mandatário era o vice.

"Biden já usou os poderes executivos dele para devolver os EUA ao Acordo de Paris, lançou uma série de iniciativas relacionadas à área climática dentro do Executivo, mas também mudando alguns posicionamentos jurídicos que o governo tem frente a casos que estão na Justiça, e enviando o novo projeto de estímulo para combater os efeitos econômicos da pandemia, que leva em conta muito seriamente a questão ambiental", pontua Mello.

Já Coimbra lembra que essa postura mais em prol do meio ambiente "sempre foi uma agenda de Biden" em sua carreira política, seja no Congresso ou na Vice-Presidência, e que isso voltará a colocar os EUA em uma posição de destaque nesse tema no mundo.

"Ele certamente vai colocar essa como uma das prioridades, senão a prioridade do seu mandato. Os americanos devem voltar a todos esses fóruns internacionais e condicionar comércio e relações privilegiadas com os EUA para países que sigam essa agenda também, o que não é uma boa notícia para o Brasil", acrescenta o professor do Mackenzie.

Também é visível a mudança de abordagem na gestão da pandemia, que tem os Estados Unidos como o país mais afetado no mundo em números absolutos, com quase 27,9 milhões casos e 493,1 mil vítimas.

"Trump tinha uma postura midiática, mas ações efetivas muito fracas. Com Biden, é o contrário", diz Coimbra, lembrando que o democrata manteve o infectologista Anthony Fauci à frente do combate à doença e colocou metas bastante claras, como vacinar 1 milhão de pessoas por dia.

Mello também inclui como algo fundamental nesse primeiro mês de mandato as mudanças nas políticas migratórias, como a proteção dos "dreamers" - pessoas que chegaram aos EUA ainda crianças, mas não têm documentação -, o fim da prisão de "pessoas na fronteira, inclusive crianças" e o "fim da construção do muro de Trump".

Relações internacionais -

Mas se as novidades em questões internas foram expressivas, o mesmo não se viu nas relações com a China.

Apesar do fim dos ataques diretos contra Pequim, como era comum com Trump, o clima de tensão continua alto.

"A questão da China veio para ficar. De uma determinada forma, isso é um legado de Trump que continua, pois tanto o Partido Democrata como o Republicano reconhecem que a China é um adversário político, econômico e até mesmo ideológico. Já está havendo uma mudança de tom nessa relação, mas a competição vai continuar", diz Mello.

Na mesma linha, Coimbra pontua que a estratégia vai mudar, mas o objetivo final é o mesmo.

"A relação com a China vai continuar tensa por muito tempo porque são sistemas antagônicos: um é democrático, o outro é ditatorial. O governo Biden será tão combativo quanto o governo Trump em relação à China, mas pode usar outros instrumentos nessa 'guerra', como no governo Obama, que não baixava o tom, mas usava outros instrumentos diplomáticos e de outra ordem para atingir seus objetivos", acrescenta.

Sobre o Irã, que continua a violar algumas cláusulas do acordo nuclear de 2015 com a justificativa de que as sanções americanas seguem em vigor, a questão é tão tensa quanto delicada.

Nesta quinta-feira (18), o primeiro sinal mais claro de Washington sobre o tema foi dado, com a atenuação de algumas regras sobre a circulação de diplomatas em Nova York, onde fica a sede da ONU, e com a promessa que o último pacote de sanções unilaterais firmado por Trump "ficará só no papel".

Além disso, em uma reunião virtual que contou com todos os ministros das Relações Exteriores signatários do Acordo Nuclear de 2015 - Irã, Rússia, China, Alemanha, Reino Unido, França - os EUA manifestaram sua intenção de voltar ao pacto.

Para Coimbra, Biden conseguirá chegar no mesmo ponto em que Obama estava há quatro anos com um "trabalho de reconstrução", mas será necessário "voltar casa por casa naquilo em que Trump retrocedeu".

"Por exemplo, o assassinato de [Qassem] Soleimani, que era um dos homens mais importantes do Irã. Você não senta para conversar com os iranianos no mesmo patamar da época de Obama depois de seu país ter assassinado um dos homens mais importantes do regime, por mais perigoso que ele fosse. Os iranianos precisam ter certeza que os EUA vão seguir nesse mesmo caminho pelos próximos oito anos, no mínimo, e que daqui a quatro anos você não tenha o retorno de Trump, ou uma pessoa da estirpe de Trump", pontua Coimbra.

Mello atenta para outro ponto: a postura de Biden com o Irã deve "evoluir conforme a relação dele no Congresso", já que democratas e republicanos têm posturas bastante divididas sobre o tema.

Já sobre o Brasil, Coimbra afirma que o país - bem como a América Latina em geral - não terá tanto destaque.

"Esse assunto não está na agenda. Eles têm zilhões de prioridades antes de nós, e nós precisamos nos fazer notados para que tenhamos importância. Por exemplo, se o Brasil, com o tamanho da Amazônia, muda sua agenda ambiental, eu não tenho dúvida que os americanos vão se aproximar do Brasil e que o Brasil vai ter outros benefícios a atingir ao estar junto nessa agenda ambiental", destaca. .

Ansa - Brasil   
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