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Sabático remunerado vira investimento de empresas para reter talentos

De um mês a um ano, programas de sabático permitem que profissionais se dediquem a estudos; para especialista, investimento tem custo menor do que contratar novos talentos

20 fev 2022 - 05h15
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O cenário de alta competitividade do mercado e a necessidade cada vez maior de engajar e reter talentos posicionou a cultura de aprendizagem das empresas como peça-chave para aprimorar a experiência dos colaboradores — e, consequentemente, tornar as organizações mais atraentes aos olhos dos profissionais. É o que indica o relatório "Como a força de trabalho aprende" da plataforma de upskilling Degreed, que mapeou 15 pontos fundamentais para ter uma cultura de aprendizagem de sucesso.

De acordo com a pesquisa, feita com mais de 2,4 mil colaboradores em 15 países, os que acreditam que a cultura de aprendizagem da empresa em que trabalham seja positiva têm 199% mais chances de serem promovidos e 235% mais chances de irem para outras áreas da organização. O apoio à aprendizagem e ao desenvolvimento mostra-se, portanto, um braço fundamental para o crescimento das próprias organizações, fazendo com que algumas já apostem inclusive em programas em que o funcionário tira um período sabático, que pode variar de um mês a um ano, para estudar. E isso sem perder o cargo ou o salário. É o que especialistas chamam de sabático de aprendizagem remunerado.

De acordo com Débora Mioranzza, vice-presidente para a América Latina e Caribe da Degreed, esse tipo de programa traz três vantagens para a empresa: desenvolvimento dos profissionais, maior retenção dessa força de trabalho especializada e economia, já que o custo de uma nova contratação é mais alto do que o custo do upskilling.

"Por mês, cerca de 500 mil pessoas pedem demissão no Brasil. Quantas delas não estarão fazendo isso para estudar e se aperfeiçoar? As organizações estão perdendo esses talentos", ela observa. "Líderes que têm essa visão conseguem fazer movimentos internos para investir no desenvolvimento dos profissionais. Porque quem não investe nesse desenvolvimento contínuo não só perde os talentos como não consegue encontrar pessoas internamente para colocar no lugar."

A especialista fala que empresas que já têm uma cultura de aprendizagem positiva estabelecida possuem orçamento específico para a área de desenvolvimento. "A estratégia é transferir o valor investido em contratações externas para essa área", explica. "E aí as empresas têm políticas diferentes sobre como é construída a remuneração de um período sabático de aprendizagem. Quando a duração é de dois meses, por exemplo, elas podem manter o salário integral; já em períodos mais longos, como um ano, algumas oferecem um percentual do salário."

Débora diz ainda que a organização pode não pagar um salário, mas garantir uma ajuda de custo com a manutenção do básico para quem está estudando, como estadia, no caso de cursos em outra cidade ou país, custos com materiais, um benefício mensal pré-determinado, transporte e alimentação. "Certas habilidades as pessoas não vão conseguir desenvolver durante o período de trabalho ouvindo um podcast ou lendo um artigo. Elas precisam de programas mais robustos de aprendizagem, como um MBA", sublinha.

Segundo ela, a Buffer, empresa canadense especializada em mídias sociais, é uma das que já têm um programa de sabático remunerado de aprendizagem sólido. Para que os membros do time possam desenvolver habilidades de acordo com as mudanças e novas necessidades da empresa, é concedido um período de três meses com 50% do salário e supervisão de um gerente direto, que faz check-ins regulares e acompanha a evolução do aprendizado.

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Já a consultoria global McKinsey patrocina programas de MBA full-time a funcionários que já têm um certo número de anos na casa em troca da garantia de que ficarão mais alguns anos após o sabático remunerado. Outras companhias estrangeiras que possuem políticas do tipo são Adobe Systems, Autodesk, VMware, Intel, e Goldman Sachs.

Capacitação remunerada e sabático para novos projetos

No Brasil os casos ainda são raros, mas já há alguns exemplos similares nascendo. Um deles é o da startup Soluti, empresa goiana especializada em identidades e assinaturas digitais. De acordo com a diretora de pessoas Nara Saddi, o projeto começou no ano passado devido à gigantesca necessidade de desenvolvedores capacitados. Batizado de Space Tec, o programa de especialização remunerado dura três meses e é direcionado aos desenvolvedores júnior, que se dedicam exclusivamente aos estudos ao longo do período.

Além dessa iniciativa, a empresa acaba de lançar uma premiação que oferecerá um mês de sabático remunerado de aprendizagem no exterior com foco no desenvolvimento do projeto selecionado e outro mês de home office para que o profissional possa finalizar a ideia. "Como somos uma empresa de tecnologia e o Brasil passa por um apagão desse tipo de mão de obra, ficou mais urgente e clara para nós a importância de ter grandes talentos no time", destaca a executiva. "Essa parceria com os sonhos deles faz com que eles tenham interesse em estar junto. A empresa que apoia o desenvolvimento acaba construindo uma relação de reciprocidade mais saudável, um vínculo mais forte com o colaborador, além de ficar menos aberta a leilões de contratação."

Para o desenvolvedor Gustavo Sousa, de 27 anos, que está cursando a distância o último semestre de ciência da computação pela Universidade Federal de Lavras (MG), a surpresa foi dupla quando recebeu uma proposta da Soluti. "Além de a proposta em si ser muito boa, saber que eu teria três meses remunerados só para estudar foi surpreendente. Eu nunca tinha visto uma empresa dar esse tipo de oportunidade", justifica. "E foi um aporte muito valioso. A evolução que eu tive nesse período, se eu fosse fazer por fora, acredito que equivaleria a um ano de estudo."

No caso da Ineos Styrolution, multinacional da área petroquímica que tem sede nos Estados Unidos e filiais ao redor do mundo, incluindo o Brasil, o programa de aprendizagem remunerado envolve a participação em projetos variados da empresa em outros países. Um colaborador, por exemplo, passou um ano fora pelo programa, participando inclusive de um projeto de reflorestamento em Londres por três meses.

"A iniciativa é para jovens que acabaram de se formar e ingressar na companhia", diz Gilvan Righetti, que gerencia a área de RH no Brasil. "Junto à política de apoio ao MBA, que é aberta a todos e reembolsa o candidato anualmente de acordo com o desempenho, é uma política que atende a duas vertentes: dar oportunidade de desenvolvimento de carreira, porque muitos estão de olho em carreira internacional, e formar mais pessoas tecnicamente", acrescenta. "O segmento (de petroquímica) é de longa duração e, à medida que as pessoas vão se aposentando, precisamos de outras já com formação técnica para cobrir essas vagas."

Estadão
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