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Avança a adoção da abordagem STEM em colégios do Brasil

Com junção de ciências e tecnologias, movimento leva estudantes a aplicarem teorias aprendidas para resolver problemas que os cercam

19 out 2020 - 05h10
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A abordagem educacional conhecida pelas siglas STEM ou STEAM vem ganhando destaque nos últimos anos nas escolas particulares brasileiras. O nome é acrônimo em inglês para Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, podendo incluir Artes. Com uma forte ênfase no uso de tecnologias, a proposta pedagógica conecta conteúdos escolares de várias disciplinas com problemas da realidade dos estudantes.

Com origem nos Estados Unidos, onde é bem difundido desde o governo de Barack Obama, o movimento não chegou com força na rede pública do Brasil, que concentra 80% das matrículas da educação básica. Embora não haja um modelo único, os programas com base no STEM costumam oferecer atividades práticas - usa-se com frequência o termo em inglês hands on.

Se aplicada de fato sob esses paradigmas, o STEM promove uma educação mais integral, com diálogo entre diferentes áreas do saber, e com o aluno praticando os conceitos e as teorias que aprende. A rede de escolas do Serviço Social da Indústria (Sesi), com 145 unidades e 90 mil estudantes em todo o País, reformou sua matriz curricular em 2014 para favorecer a abordagem Steam. Em quatro horas de atividades por semana, estudantes de todas as séries do fundamental e do médio se engajam em iniciativas sob essa perspectiva. "Com os pequenos, fazemos em geral projetos por quadrimestre. Com os maiores, temos um anual, mais complexo", conta Fabiana Anhas Barbosa Lima, diretora da unidade de São Bernardo do Campo.

Ela vê vantagens claras no desenvolvimento cognitivo e emocional dos alunos. "O estudante passa a enxergar as situações de maneira mais ampla, mais crítica, mais criativa. Como sempre tem de apresentar seu trabalho, melhora ainda sua capacidade de argumentação. Também é muito importante porque percebe seu poder de ação sobre a realidade. É um empoderamento", afirma.

O modelo do Sesi valoriza ainda o trabalho colaborativo em equipes diversas. Alunos fazem grupo não apenas com colegas de classe, mas também com estudantes de outros anos. "Temos uma perspectiva sociointeracional na escola. Isso quer dizer que, na nossa visão, todos aprendemos com o outro, com a troca de experiências. Nem sempre a melhor troca está relacionada a crianças da mesma idade", explica a diretora.

Autonomia

A iniciativa e o interesse que parte dos próprios alunos são peças fundamentais da abordagem STEM no Colégio Magno. Foi assim quando alunos do 9.º ano decidiram construir um equipamento para purificar as águas de um córrego atrás da sede da escola. Com observações, pesquisas, testes, protótipos - e uma antena parabólica velha -, os estudantes conseguiram tratar a água e usá-la em uma horta.

Para que os adolescentes tenham esse protagonismo, o incentivo à autonomia vem desde cedo. "Nas aulas de programação, os professores explicam o passo a passo, mas mostram como cada um pode aprender sozinho, sem precisar mais de orientação", diz a aluna Beatriz Vasconcelos, de 10 anos, que tem aulas de programação e robótica desde o 1.º ano do fundamental. "Tem sempre tanta coisa legal. Você aprende mais fácil, não é cansativo. Gostei quando a gente aprendeu a programar uma máquina que desenhava com canetinhas coloridas."

Alguns sistemas de ensino, como o programa bilíngue da empresa Pearson, também são grandes propagadores das metodologias STEM/STEAM. Atualmente, há 200 escolas no Brasil, com um total de mais de 20 mil alunos que adotam o material. O STEM começou no ensino fundamental, em 2016 no Brasil. Três anos depois, as artes entraram no projeto, que então passou a ser chamado de STEAM. Também foram incluídas as crianças da educação infantil. "Nessa etapa, as experimentações parecem mais brincadeiras, são simples e com elementos caseiros", afirma Marjorie Robles, diretora de inglês da Pearson na América Latina.

Livre

Na proposta da Pearson, as aulas de STEAM ficam sob responsabilidade do professor de inglês, capacitado para trabalhar as disciplinas de forma integrada e em parceria com docentes de outras áreas. "Nossa proposta é integradora, ou seja, vai além da interdisciplinaridade, porque não tem hierarquia, não tem disciplina obrigatória, não cria barreiras. Tudo depende do problema apresentado e da solução pensada pelos alunos."

Os projetos partem sempre de uma questão problematizadora. Os professores são mentores, orientando e instigando, em vez de apresentando respostas. Na parte de STEAM, a ideia é que os estudantes construam algo real, como forma de aplicar teorias. "De que adianta o aluno responder bem em uma prova e não saber qual é a aplicabilidade do que estudou? O STEAM é um sopro de ar fresco na rotina da escola, que promove o desenvolvimento intelectual, mas também as soft skills, como capacidade de organização, liderança, pensamento crítico. Com a experimentação, aprende que é aceitável errar", diz.

Embora seja aceitável errar, os alunos são sim avaliados por seu desempenho, mas de forma mais holística do que nas provas tradicionais. "Temos uma avaliação contínua, em que o professor pode acompanhar o aluno durante a jornada. No fim, os estudantes apresentam um resultado de suas experimentações, que pode ser medido objetivamente", diz Marjorie.

Mão de obra qualificada para empresa de tecnologia

STEM nasceu nos Estados Unidos como solução para falta de profissionais, no início dos anos 2000

A falta de mão de obra qualificada para trabalhar em empresas de tecnologia foi a principal força por trás do nascimento da abordagem STEM na educação dos Estados Unidos, no início dos anos 2000. Para responder ao problema, as escolas americanas passaram a desenvolver projetos que integrassem as quatro áreas deficitárias consideradas essenciais para o novo milênio: Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática - em inglês, Science, Technology, Engineering, and Mathematics (STEM).

O governo do presidente Barack Obama (2009-2017) considerou o STEM uma prioridade nacional e passou a investir pesado. Foram US$ 3 bilhões (cerca de R$ 16,7 bilhões) destinados para o programa de ensino para inovação, que envolveram desde o Departamento do Trabalho até a agência espacial americana (a Nasa, National Aeronautics and Space Administration).

Para alguns críticos, a abordagem educacional se baseia em um mito, pois a falta de trabalhadores qualificados estaria concentrada apenas nas empresas de Tecnologia da Informação (TI), e não faria sentido agrupar essa área com as ciências e engenharias. Dependendo das flutuações anuais, há mais desemprego entre cientistas e engenheiros nos Estados Unidos do que entre dentistas e advogados, por exemplo.

No mundo

Independentemente dos questionamentos, em duas décadas de existência a abordagem foi ganhando o mundo - e também integrando novas letras.

As propostas de uma educação STEM são heterogêneas, pois não há uma linha universalmente definida, ou alguma regulamentação. O mais comum na atualidade é a integração do A, de artes, pois os professores foram percebendo que muitos projetos dos estudantes também precisavam ser desenvolvidos do ponto de vista estético. Mas há variantes que incluem o H, de humanidades, o L, de lógica, ou R de robótica, entre outros.

Estadão
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