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Coronavírus

Crianças pedem que Papai Noel use máscara no Natal em meio à pandemia

Pedidos ao 'bom velhinho' em 2020 variam entre fim do coronavírus e brinquedos; saiba como conversar sobre tema com os filhos

15 dez 2020 - 08h10
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"Desde que eu era pequenininha escrevo cartinha com os presentes que eu quero para o Papai Noel. Eu estou preocupada com ele, porque é muito velhinho, mas pode sair de máscara contra o coronavírus ou os duendes podem fazer a entrega para ele no Natal", afirma Maria Júlia, de seis anos de idade. A mãe dela, Mariane Berquó, conta que a filha acreditava que o Papai Noel não viria este ano por causa da covid-19: "A expectativa é que ele nem viesse, mas ela escreveu a carta e o Papai Noel já buscou".

Ela, o marido e a filha vivem no bairro do Panamby, em São Paulo, e tiveram de lidar com o luto em meio à pandemia. "O coronavírus na vida da Maria Júlia entrou como um vírus maligno. Ela tinha uma aproximação muito grande com a bisavó, que morreu de covid, e ela tem uma preocupação grande com isso", lamenta.

A família sempre comemorou o Natal reunida. "Maria Júlia é uma menina que gosta de estar com outras crianças e o isolamento foi um baque. Para ela, é estranho não ter essa convivência com as pessoas", avalia a mãe. "Acho que o Natal vai ser muito diferente porque a gente não vai poder convidar as pessoas e o coronavírus é muito chato! Mas já já vai acabar essa pandemia e a gente vai poder convidar todo mundo, né?", torce a pequena Maria Júlia.

Na casa de Marcio Chaves e Tais Chaves, no bairro da Vila Olímpia, Natal é sinônimo de família reunida também. Eles são pais de Luiza, de 9 anos, e de Helena, 4. A mais velha tem o hábito de enviar cartinhas ao Papai Noel. "Eu escrevo cartas para o Papai Noel desde os três anos. Acho que agora neste ano ele poderia mandar vídeos para todas as pessoas e também entregar os presentes pelo Correio", sugere a menina. Marcio e a esposa realizam, todos os anos, um evento para famílias em situação de vulnerabilidade. "Sempre fazemos uma festa beneficente na véspera, mas esse ano será um evento reduzido só para crianças", ressalta o empresário.

Luiza leu para nós um trecho da carta que redigiu para o 'bom velhinho': "Querido Papai Noel, tomara que você esteja bem. Já que a vacina do coronavírus está pronta, acho que você deveria ser o primeiro a tomar, porque o Natal está chegando, para dar presentes para todas as crianças e também para aquelas que estão com coronavírus. E tome cuidado por aí! Um beijo, tchau".

A reportagem do Estadão entrevistou, com 'exclusividade', o Papai Noel dos Correios, que garantiu que está tomando todos os cuidados em relação à covid-19. "De acordo com as orientações do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde, pessoas idosas estão entre os indivíduos do grupo de risco. O Papai Noel, figura conhecida há várias gerações, precisa estar atento e tomar todos os cuidados necessários para evitar a contaminação pelo novo coronavírus: uso de máscara, higienização das mãos e distanciamento social são apenas alguns deles. Para continuar entregando presentes às crianças, dependo como nunca de meus ajudantes, entre eles os Correios e os padrinhos e madrinhas que adotarem as cartinhas", explicou.

O 'bom velhinho' lembra que as festas de fim de ano serão diferentes, pois muitas famílias não poderão confraternizar juntas. No entanto, as pessoas continuarão a usar meios digitais para se conectarem nessas comemorações - as chamadas de vídeos são um bom exemplo.

Em 2020, por causa da pandemia, a campanha Papai Noel dos Correios será toda digital. As pessoas que quiserem adotar uma cartinha deverão fazer isso através do blog. Crianças de até 10 anos de idade em situação de vulnerabilidade social podem participar. Os textos devem ser manuscritos e, depois, fotografados ou digitalizados para envio ao blog da campanha. É importante enviar uma imagem nítida para que a mensagem possa ser lida e compreendida pelo Papai Noel.

A assessoria de imprensa dos Correios disponibilizou alguns exemplos de cartinhas que já foram enviadas, de forma digital, pelas crianças. "Esse ano não foi fácil para todos nós com essa pandemia de 'corona', mas graças a Deus que toda minha família está bem. Fiquei triste por ficar longe dos amigos, da escola, professores, mas tenho fé que tudo vai voltar a ser normal. Sinto muito pelas famílias que perderam entes queridos. Eu gostaria muito de ganhar uma bicicleta para ir para a escola, porque minha mãe não tem condições. Mas se não der, pode me dar uma bola de couro. Quero ser jogador de futebol. Obrigada, Papai Noel", escreveu um garoto de dez anos.

Outra cartinha, enviada ao Papai Noel dos Correios por um menino de nove anos de idade, conta como foi difícil o ano por causa da covid-19. Ele gostaria de ganhar uma mochila para ir à escola, já com a esperança de que a vida volte ao normal em breve.

"O ano de 2020 não foi muito bom para mim por causa desse vírus que deixou todo mundo em isolamento social. Mas graças a Deus está terminando e que o ano de 2021 venha tudo normal, as aulas e tudo. Estou ansioso. Queria ganhar do Papai Noel uma mochila para escola. Feliz Natal", encerra o pedido.

Como conversar com as crianças sobre o Natal em meio à pandemia

O Natal de 2020 será diferente por muitos motivos: é possível que a comemoração envolva menos pessoas em função da pandemia, que haja menos recursos financeiros para fazer a ceia e comprar os presentes, tendo em vista a perda de renda de muitas famílias nos últimos meses, que alguém muito amado tenha morrido ao longo do ano e não possa, pela primeira vez, estar presente na comemoração.

É possível também que seja a primeira vez que a criança passe o Natal com os pais separados, considerando os índices atuais de divórcio durante a quarentena. "Por outro lado, pode ser que tudo o que foi vivido no último ano tenha proporcionado o aumento da intimidade dos membros da família ou mesmo que tenha ocorrido uma ampliação de consciência em relação à alteridade e ao coletivo - aspectos que mudam significativamente a forma como o Natal é vivido. Seja como for, neste ano, a grande maioria das crianças terá um Natal diferente dos anos anteriores", avalia a psicoterapeuta infantil Tauane Gehm, doutora em Psicologia do Desenvolvimento.

Com a experiência clínica em meio à pandemia, a psicóloga aponta um crescimento considerável nos índices de depressão e ansiedade entre crianças. "Além disso, uma parcela delas começou a apresentar questões importantes como alterações no padrão de alimentação, sono e/ou humor, regressão da fala, dificuldades no repertório de interação social, dificuldades no acompanhamento das aulas online, uso excessivo de telas", ressalta.

A proximidade do Natal e a figura do Papai Noel podem representar a renovação da esperança, tão necessária para nós, adultos, como para as crianças. "Em geral, as crianças lidam com o Natal como um momento mágico, que envolve uma espera, inclusive uma ansiedade boa. Elas passam semanas imaginando o momento do encontro com o bom velhinho o que, sem dúvida, estimula a criatividade e a fantasia", afirma Tauane Gehm.

A psicoterapeuta enfatiza que a época é importante para estimular coisas importantes para o desenvolvimento, como a capacidade de planejar. É preciso planejamento para escrever carta para o Papai Noel, pensar em como recepcioná-lo na noite de Natal, como presentear os entes queridos e como será a celebração. "Dependendo dos valores e atitudes da família, o Natal também favorece o amor ao próximo e o desenvolvimento de empatia em diferentes níveis. É possível, por exemplo, tematizar com a criança o fato de que nem todas as famílias terão o mesmo Natal e discutir com ela o que fazer diante disso", sugere. O ato de dar um presente é uma excelente oportunidade para refletir sobre o que o outro precisa, do que gosta, o que é importante para que se sinta amado.

Para os pais, a dica é aproveitar o momento para conversar com as crianças sobre valores, afinal, em meio à pandemia, fomos colocados frente a frente com uma série de sentimentos de impotência, ausência, medo, frustração, ansiedade e, em alguns casos, solidariedade e empatia com aqueles que sofreram pela covid-19.

"A conversa sobre o presente, ou a ausência dele, pode ser mais importante do que o objeto em si. É importante lembrar que o que fica na nossa memória é, geralmente, a lembrança do Natal. Um exercício interessante é listar com a criança não apenas o que ela quer ganhar, mas também como gostaria que fosse o Natal. Pode ser interessante também dar modelo para ela do que observar nessa listagem - isso pode ser feito com os pais contando o que era importante para eles nessa época quando crianças e/ou como era o Natal na infância deles", aconselha Tauane Gehm. O exercício pode ser uma forma de criar conexão e dirigir o olhar dos filhos para aquilo que se quer ensinar sobre o Natal.

Por outro lado, embora a data seja associada à fantasia e felicidade, não se deve forçar as crianças a ficarem felizes nessa época, sobretudo se estiverem passando por uma situação de luto pela perda de algo, alguém ou de alguma configuração familiar. Cabe aos pais, nesse caso, dar colo, suporte e abrigo, acolhendo, aceitando e respeitando os sentimentos dos pequeninos.

Estadão
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