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Coronavírus

Como falar sobre raiva com as crianças e ajudá-las a entender suas emoções

Samantha Snowden, autora do livro 'Vamos Lidar Com a Raiva', recém-lançado pela Sextante, fala ao Estadão sobre como ajudar as crianças durante o isolamento

19 set 2020 - 14h10
(atualizado às 14h13)
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Psicóloga com mestrado em psicologia educacional e corrdenadora internacional de mindfulness do Peak Brain Institute, Samantha Snowden acaba de ter seu livro Vamos Lidar Com a Raiva - 50 Atividades Para Crianças publicado no Brasil pela Sextante, num movimento do mercado editorial de oferecer obras para ajudar as famílias durante a pandemia, e que inclui, ainda, livros de atividades e de passamentos.

Com exercícios práticos, ela ajuda o pequeno leitor a identificar e aprender a controlar a raiva. Um tema oportuno num momento em que muitas famílias continuam respeitando o isolamento social, que as protege, por um lado, mas que produz efeitos nas crianças.

Samantha Snowden respondeu às seguintes perguntas do Estadão por e-mail.

O que a levou a escrever um livro sobre raiva?

Trabalhei com crianças e famílias por mais de 10 anos como coach, auxiliando-as a se tornarem mais atentas ao seu entorno e a controlar as emoções. As dificuldades comportamentais que resultam do mau controle dos impulsos e das frustrações quando as crianças estão raivosas é comum entre meus clientes. Decidi escrever um livro que contemplasse os instrumentos mais úteis que tenho usado para ajudar os jovens que atendo de modo a aprenderem maneiras saudáveis de controlar seu comportamento quando ficam irritados.

Muitas crianças estão descobrindo a raiva nesta quarentena e tentando lidar com ela. Porque elas andam tão irritadas e como ajudá-las?

As crianças, como os adultos, ficam revoltadas e frustradas quando algo importante lhes é tirado. Na situação que estamos vivendo agora, elas estão separadas dos seus amigos e obrigadas a ficar em casa. Isso resulta em sensações complexas que ficam represadas, como inquietação, agitação e decepção, e que dão vazão à raiva. Para ajudar as crianças a lidarem com essas emoções é importante que elas entendam que esses sentimentos são úteis porque nos permitem saber o que é relevante para nós. Por exemplo, quando nos sentimos irritados porque estamos separados dos amigos, então percebemos como as amizades são valiosas e temos de alimentá-las da melhor maneira que pudermos, mesmo à distância. É tentador para os pais tentarem desviar a atenção dos filhos ou tranquilizá-los rapidamente quando demostram raiva. Mas pelo contrário, é importante sintonizar com os sentimentos da criança dizendo algo como "sei que é difícil. É uma sensação complicada". Isso permite às crianças entenderem que é correto sentir raiva às vezes e que não é uma emoção "proibida". Você também pode colaborar ajudando-as a exporem seus sentimentos, especialmente aqueles mais sutis, como decepção e solidão, que talvez elas não identifiquem facilmente. Gosto de fazer uma lista de palavras que se coadunam com esses sentimentos para ser colada na porta do refrigerador de maneira que as famílias criem o hábito de identificar precisamente como elas se sentem.

Seu livro com certeza vai ajudar as crianças e os pais. O que mais diria a eles agora, depois de tudo que temos visto e vivenciado com o coronavírus

Descobri que exercício de autocompaixão, no sentido de ser compreensivo e gentil consigo mesmo, não se culpar e nem se criticar demais, ser generoso consigo mesmo, é muito útil para acalmar a inquietação e a incerteza. É importante que os pais pratiquem o exercício quando lidam com emoções complexas, colocando uma mão sobre o coração, reconhecendo a dificuldade do momento, tomando consciência de que não estão sozinhos nesta experiência, e, finalmente, oferecendo palavras gentis e de amor para si mesmos. Assim eles terão mais energia mental para lidar com os sentimentos dos seus filhos. As crianças respondem bem a essas práticas que envolvem o envio dos melhores votos a um amigo. Você pode usar materiais como bolhas de sabão para enviar seus votos a amigos e entes queridos distantes, pedindo aos filhos que também enviem seus votos. Por exemplo, eles podem pensar num amigo da escola e imaginar algo que o deixará contente e enviar o seu desejo, como "fique feliz" quando soprar uma bolha de sabão no ar. É importante que as crianças saibam que, embora não pareça, a experiência que estamos vivendo é temporária. Lembre-os de alguma vez em que eles também achavam que alguma coisa jamais terminaria e sublinhe que na verdade acabou. O que ajuda também é buscar o lado bom desta situação. Vocês podem estar passando um tempo em família melhor ou aprendendo como usar ferramentas tecnológicas que não sabiam como utilizar antes.

Quais os efeitos deste período de coronavírus sobre as crianças e o que vamos aprender disto?

Sei que as crianças são resilientes. Apesar de a ausência prolongada da escola presencial e a socialização limitada afetarem seu bem estar e sua felicidade no curto prazo, no longo prazo elas se recuperarão com a ajuda de adultos atenciosos e solidários. É importante que os adultos que cuidam das crianças as ajudem a enfrentar o estresse para que ele não se desenvolva em desânimo e aflição. As emoções e os fatores de estresse que emergem durante este tempo oferecem uma oportunidade para aprendermos recursos para controlar o emocional que nos ajudarão a enfrentarmos situações de estresse normais que surgem no decorrer da nossa vida. Podemos superar transições, perdas e decepções que enfrentamos no curso das nossas vidas, adotando um pensamento flexível, aprendendo a ter uma visão geral de uma situação, generosidade, gratidão e compaixão.

A atenção plena pode ser alcançada por qualquer pessoa de qualquer idade?

Sim, temos uma capacidade inata para sermos abertos, curiosos, não fazermos juízos de valor e estarmos presentes. Ela é alimentada e fortalecida com a prática e é acessível em qualquer idade. / Tradução de Terezinha Martino

VAMOS LIDAR COM A RAIVA - 50 ATIVIDADES PARA AS CRIANÇAS

Autora: Samantha Snowden

Ilustrações: Sarah Rebar

Trad.: Beatriz Medina

Editora: Sextante (160 págs.; R$ 49,90)

Estadão
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