Vendaval de prejuízos em SP: sem energia, moradores tentam salvar comida da geladeira e trabalhar
Confeiteira da zona oeste não sabe se dará conta de entregar as encomendas por conta da falta de luz na Barra Funda
Na quarta-feira, 10, a Grande São Paulo foi atingida por fortes vendavais que comprometeram o fornecimento de energia. Os ventos, que chegaram a uma velocidade de mais de 98 km/h em algumas partes de São Paulo, são decorrentes da passagem de um ciclone extratropical que se formou no Sul do País e avançou para a região Sudeste.
Mais de 1,5 milhão de casas continuam sem energia elétrica na Grande São Paulo nesta quinta-feira, 11. Em nota, a Enel confirmou que a área de concessão da companhia foi "afetada por um um ciclone extratropical e um vendaval histórico". Trechos inteiros da rede foram danificados, "impactando o fornecimento de energia em diversos pontos". Veja, abaixo, relatos de pessoas afetadas.
"Sem o aparelho, não consigo dormir, estou exausta"
Rita Augusta de Castro, de 74 anos, moradora de um residencial no centro de Cotia, na Grande São Paulo, está há três noites sem dormir porque, desde segunda-feira, 8, quando a cidade foi atingida por um temporal, não consegue ligar o CPAP, um aparelho que controla a apneia do sono. "Não tem energia e ele depende de eletricidade. Sem o aparelho, não consigo dormir, o que tem me deixado exausta", diz.
Ela conta que os problemas começaram quando seguia para uma consulta oncológica na capital, por volta das 15h de segunda, quando foi obrigada a retornar porque a rodovia Raposo Tavares estava alegada. "Cheguei em casa e não tinha energia. À noite voltou, mas na madrugada de terça acabou de novo e meu aparelho desligou. Depois não voltou mais. Desde segunda a Enel vem enrolando, dizendo que vem tal hora e não vem."
Rita conta que teve de jogar no lixo todos os alimentos que estavam na geladeira. "Estes eu já perdi, mas o prejuízo será muito maior se perder as carnes, salmão, peru, lombo, que estão no freezer para a ceia de Natal. Isso se já não perdi. Será lamentável se tiver de jogar tudo fora com tanta gente passando fome", diz.
Para atender a reportagem, Rita Augusta foi a um Poupatempo próximo de sua casa, pois precisava carregar o celular.
"Aqui do meu lado tem outra senhora que saiu da casa dela e veio carregar o celular. E 75% da cidade ainda estão sem luz, inclusive o prefeito, que mora no meu residencial. Liguei umas 15 vezes na Enel e pedem para informar o número do cadastro, mas como, se a conta é digital e não consigo ligar o computador?"
"É horrível, né?"
A empregada doméstica Fátima Silva Pereira, de 49 anos, trabalha em uma casa em Pinheiros que foi atingida por uma árvore. Parte do teto cedeu. A rede elétrica também foi abaixo. O imóvel está sem energia desde 12h17 de quarta-feira. "É horrível, né? Sem luz, não dá para fazer nada. Até as coisas que estão na geladeira estão estragando." Ela estava na cozinha no momento do acidente e achou que a proprietária da residência, que já é idosa, tivesse caído. "Foi um baita susto."
"Difícil é achar quem tenha refrigerador funcionando"
A família do empresário Henrique Piegaia está há 24 horas sem energia no apartamento, em um condomínio na Barra Funda, em São Paulo. "Sou um dos milhões de paulistanos que foram afetados pelo vendaval de ontem (quarta-feira, 10), mas está demorando para normalizar", disse.
Com a geladeira cheia, ele começava a fazer contatos com parentes e conhecidos para ver quem poderia ceder espaço. "A temperatura interna já subiu e preciso transferir para não perder tudo. Difícil é achar quem tem refrigerador funcionando."
O empresário abriu chamado na Enel para tentar o ressarcimento em caso e prejuízo. "Até o momento, o maior problema é que minha esposa trabalha como confeiteira em casa e faz bolos por encomenda. Tinha muitos pedidos para o fim de semana e ela não está conseguindo trabalhar. Vamos perder clientes", diz.
"A preocupação maior era com a escola"
O comerciante Thomas Van Otterloo, 68, que mora no Brooklyn, conta que galhos que caíram durante o vendaval pegaram fogo "durante horas". "A preocupação maior era com a escola, porque é exatamente na esquina onde fica a escola. Por sorte, o galho caiu do lado externo da escola, na rua."
"Está complicado e não tem previsão"
A dentista Mara Louro está sem luz em sua casa no Brooklin desde as 14h30 de quarta. "Está complicado e não tem previsão: você entra no site da Enel e a previsão está para 18h, depois muda para 19h, 20h... Eles vão aumentando de hora em hora. Está tudo parado." Ela teve de levar a comida do congelador para a casa da sobrinha.
"Tive que tomar banho na academia"
Sem energia em seu apartamento em um condomínio na região do Morumbi desde 10h de quarta, o engenheiro de telecomunicações Danilo Gouveia Garcia, de 41 anos, tomou banho na academia onde treina e jantou à luz de lanterna.
"Eu trabalho de casa, ontem até consegui me virar por algumas horas, pois investi em um nobreak para manter minha internet. Tive que ir tomar banho na academia, tentei jantar no shopping Morumbi Town, mas estava lotado, com enormes filas, restaurantes fechados sem cozinha. No final, comprei um lanche e um suco no mercado e jantei à luz de lanterna", diz.
"Moramos em uma rua com fiação subterrânea e mesmo assim os prédios ficaram sem luz. Já há quase 24 horas."
Ele conta que diversos protocolos foram preenchidos e repassados à Enel, tanto por moradores quanto pelo condômino. "A Enel só retorna com previsões furadas e que aumentam quando chega o prazo dado. No meu caso recebi até uma ligação para confirmar se estava realmente sem luz. A resposta do atendente foi que ia mandar uma equipe ao local."
"Perdemos tudo o que estava na geladeira"
A técnica administrativa Andresa Bernardo da Silva Miguel, de 47 anos, que também mora na Celso Ramos, também relata que as luzes ficaram piscando durante quase duas horas até acontecer o blecaute.
"Perdemos tudo o que estava na geladeira. Eu e meu filho estudamos e estamos em época de provas finais na faculdade e não conseguimos estudar e realizar as tarefas." Ela ainda não sabe se algum eletrodoméstico queimou. "Como teve muita oscilação da luz e eu não estava em casa quando começou, por isso não desliguei a chave geral, ainda não sei, só terei ideia dos prejuízos quando a luz retornar."
Voos cancelados
O vendaval histórico de quarta, 10, e a chuva da noite de terça-feira, 9, provocaram um efeito cascada de atrasos e cancelamentos das chegadas e partidas nos aeroportos de Guarulhos e Congonhas, em São Paulo.
Segundo a Climatempo, o aeroporto de Congonhas registrou rajadas de ventos de 96 km por hora na quarta - o maior índice desde o início das medições, em 1963.
Nesta quinta, 11, em Congonhas, apesar do aeroporto operar normalmente para pousos e decolagens, foram canceladas 38 chegadas e 26 partidas. Na quarta, 10, Congonhas 88 chegadas e 93 partidas foram canceladas.
Segundo a administração doAeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, a operação para pousos e decolagens estava normal na manhã desta quarta.