Presidente da GM diz que Brasil pode ser exportador de veículos elétricos
Santiago Chamorro, presidente da General Motors América do Sul, disse que a produção do Chevrolet Spark EUV no Brasil é só o começo do sonho
Em entrevista concedida a jornalistas da mídia automotiva e influenciadores digitais dentro de um barco no Lago Paranoá, em Brasília, Santiago Chamorro, presidente da GM América do Sul, revelou que a produção do Chevrolet Spark EUV começará ainda em 2025. O executivo explicou como será o processo de montagem, falou sobre a estratégia de nacionalização de componentes e destacou a importância do Brasil no plano global da General Motors para veículos elétricos.
“Brasil pode ser um hub exportador de veículos elétricos”
“O Brasil tem escala, tem logística, tem porto, tem proximidade com mercados importantes. Se a indústria se organizar, podemos ser um hub exportador de veículos elétricos na região”, disse Chamorro. Veja abaixo a entrevista completa.
PERGUNTA – Como vai ser a produção do Chevrolet Spark EUV no Ceará?
CHAMORRO – A montagem dos veículos a gente faz com a Comexport. Temos um contrato de montagem e compramos a unidade já terminada por eles no Ceará.
PERGUNTA – Quando começa a montagem?
CHAMORRO – A gente tem que finalizar o ano, começa este ano ainda.
PERGUNTA – Quantas unidades devem ser feitas lá?
GM projeta vender de 6.000 a 8.000 unidades do Spark em 2025
CHAMORRO – A gente deu um volume de vendas, você viu de 100 unidades por semana. [Nota do Editor: 5.200 por ano, mas a GM projeta de 6.000 a 8.000 unidaders/ano] É o que vai dar a capacidade da fábrica, ainda com possibilidade de colocarmos mais volume aí.
PERGUNTA – Tem alguma chance de homologar esse carro para cinco pessoas?
CHAMORRO – Temos o perfil do nosso público, famílias com até dois veículos, nesse momento o produto vai atender muito bem a necessidade que a gente tem, mas sempre atentos às oportunidades.
PERGUNTA – Montagem SKD ou CKD?
CHAMORRO – Assemelha a um SKD, então será uma montagem de componentes que faremos através da Comexport na fábrica do Ceará, mas com o compromisso de ir de forma rápida e ágil avançando no caminho da localização de componentes.
PERGUNTA – Só para confirmar, vai ser na fábrica que era da Troller?
CHAMORRO – Na fábrica que era da Troller.
PERGUNTA – Qual é o estado atual da planta, em que fase está?
CHAMORRO – Para a primeira fase de produção, a gente já fez a recuperação estrutural inteira, já estamos no processo de instalação de equipamentos, e vamos entrar em produção para o ano que vem.
PERGUNTA – O senhor foi muito criticado nos últimos dois anos, muita gente duvidou que isso podia acontecer, e muita gente até falou que a GM ia fechar porque tinha feito uma aposta em EVs, e agora vocês estão falando que vão fabricar carros elétricos no Brasil. O que esperar daqui para frente, considerando que este é um movimento muito importante.
CHAMORRO – Para mim é um sonho, vejo aqui o começo de uma realidade muito bonita que o Brasil merece. A gente sai por aí em outros mercados, falando com outras economias, com outros governos [da América do Sul], e até o conselho que nós damos para eles é de seguirmos no livre câmbio, no mercado aberto, e para a produção desses países faz sentido. A gente fez essas mesmas iniciativas, essa mesma estratégia, na Colômbia e no Equador no ano passado.
Brasil tem minérios para fabricar baterias de EVs no futuro
PERGUNTA – Por que a produção do Chevrolet Spark elétrico no Brasil?
CHAMORRO – Porque o Brasil tem um mercado gigante, uma capacidade de engenharia gigante, de produção já instalada aqui, um mercado gigante em torno da gente. Com a presença de minérios para fabricar essas baterias no futuro, não faz sentido, na nossa opinião, pensar em outra coisa que não seja uma reindustrialização.
PERGUNTA – Quem mais está com a GM nessa visão?
CHAMORRO – Talvez tenha uma novidade aí, junto com a Anfavea, junto com o Sindipeças, pois os produtores de aço têm se mostrado também bastante amigos da iniciativa. Estamos fazendo um estudo de reindustrialização no Brasil. Queremos apresentar para o governo até para poder mudar uma situação que ocorre hoje.
PERGUNTA – Que situação?
CHAMORRO – O Brasil tem um dos minérios de ferro mais produtivos, um dos melhores do mundo inteiro: 65% do minério de ferro importado pela China vem do Brasil. E é lá na China que se transforma magicamente em aço, representando mais ou menos 30% do aço de produção da China. E é lá que se gera indústria, geração tecnológica e demais, e é lá onde depois de uma carga pesadíssima de incentivos tributários, vem para cá convertido em bem, convertido em produto, convertido em componente, e nós perdemos a possibilidade de gerar essa indústria aqui.
PERGUNTA – Mas o mercado brasileiro para carros elétricos é pequeno.
CHAMORRO – A gente pensa que equalizando um pouquinho as cargas, a gente pode apostar em um mercado maior, em exportações maiores, sem que o Brasil perca a arrecadação e ao mesmo tempo fortaleça o nosso aparelho industrial. O sonho começa hoje.
Produção do Spark EUV no Brasil abre espaço para exportação
PERGUNTA – O foco da produção que começa ainda esse ano também é a exportação?
CHAMORRO – Em princípio é o mercado doméstico, mas é evidente que isso aqui abre oportunidades de exportação e isso já está no radar da companhia.
PERGUNTA – Qual é o próximo passo depois desse anúncio?
CHAMORRO – O próximo passo é consolidar o processo industrial, consolidar a linha de montagem, consolidar a cadeia de fornecedores locais. E logo depois disso começar a pensar em outros produtos.
PERGUNTA – Isso inclui outros carros elétricos da GM aqui no Brasil?
CHAMORRO – Sim, claro. A gente tem uma estratégia global que prevê uma família inteira de veículos elétricos. Hoje falamos desse modelo inicial, mas a plataforma Ultium permite uma flexibilidade enorme para trazer diferentes tipos de veículos.
PERGUNTA – Qual é o investimento previsto para essa fase?
CHAMORRO – Não estamos divulgando valores exatos neste momento, mas posso dizer que é um investimento relevante, suficiente para garantir escala, competitividade e qualidade.
PERGUNTA – A Chevrolet vai ter uma linha dedicada só para elétricos ou será integrada com a produção atual?
CHAMORRO – Inicialmente vai ser uma linha dedicada, porque o processo de manufatura de elétricos tem particularidades. Mas a planta tem flexibilidade e pode absorver, no futuro, diferentes tecnologias.
PERGUNTA – Qual é a expectativa de volume nos próximos anos?
CHAMORRO – Estamos começando pequeno, com capacidade para algumas centenas de unidades por semana. Isso é o que a fábrica permite hoje. Mas temos planos de expandir. O potencial é muito maior.
PERGUNTA – E quanto à exportação? Quais mercados estão sendo avaliados?
CHAMORRO – Mercados vizinhos na América do Sul, com foco inicial em países que já têm uma infraestrutura mínima para veículos elétricos. Mas a prioridade, repito, é atender bem o consumidor brasileiro.
PERGUNTA – Como o senhor responde às críticas de que a GM demorou demais para trazer elétricos ao Brasil?
CHAMORRO – A gente prefere fazer no tempo certo, de maneira sólida. Não se trata de ser o primeiro, mas de fazer bem feito. E também tem uma questão de mercado – o consumidor brasileiro está começando a aceitar os elétricos agora.
PERGUNTA – O senhor acredita que o incentivo governamental atual é suficiente?
CHAMORRO – O que vemos é um esforço grande do governo em criar condições para que a indústria floresça. Sempre pode melhorar. Mas o mais importante é a previsibilidade. Precisamos de regras claras e estáveis para planejar a longo prazo.
PERGUNTA – Existe risco de o projeto não avançar?
CHAMORRO – Todo projeto tem risco. Mas estamos confiantes porque temos tecnologia, temos escala global e temos um mercado brasileiro gigantesco. É a combinação perfeita para dar certo.
PERGUNTA – Como está o diálogo com sindicatos e trabalhadores?
CHAMORRO – Muito positivo. Esse projeto gera empregos, movimenta fornecedores, dá perspectiva para os trabalhadores. É um motivo de orgulho para todos os envolvidos.
“Brasil tem desafios, mas também tem enormes vantagens”
PERGUNTA – E a infraestrutura de recarga? Não é um gargalo?
CHAMORRO – Sim, ainda é. Mas está avançando rápido. Já vemos redes privadas investindo, e a GM está aberta a parcerias. O consumidor precisa de confiança para comprar um elétrico, e isso só acontece com uma rede de recarga ampla.
PERGUNTA – O Brasil está preparado para essa transição para elétricos?
CHAMORRO – O Brasil tem desafios, mas também tem enormes vantagens. Temos um mercado interno grande, capacidade de engenharia instalada, e recursos naturais estratégicos como o lítio e o ferro. Se soubermos aproveitar, podemos ser protagonistas nessa transição.
PERGUNTA – A GM vai depender de importações de componentes ou vai nacionalizar?
CHAMORRO – No começo sempre há uma dependência de importação, isso é inevitável. Mas nosso compromisso é de aumentar gradativamente o conteúdo local. Já estamos conversando com fornecedores de aço, de peças, de baterias. Queremos desenvolver essa cadeia no Brasil.
PERGUNTA – Quais são os próximos marcos que o senhor pode adiantar?
CHAMORRO – O primeiro marco é iniciar a montagem ainda este ano. Depois, consolidar a produção e avaliar novos modelos. E também preparar a planta para volumes maiores.
“Que confiem. Que saibam que a GM não veio aqui para brincar”
PERGUNTA – O senhor enxerga o Brasil como exportador de carros elétricos no médio prazo?
CHAMORRO – Sim, é totalmente possível. O Brasil tem escala, tem logística, tem porto, tem proximidade com mercados importantes. Se a indústria se organizar, podemos ser um hub exportador de veículos elétricos na região.
PERGUNTA – O senhor falou em sonho. O que representa pessoalmente para o senhor esse anúncio?
CHAMORRO – Representa um orgulho enorme. Eu sou colombiano, mas me sinto brasileiro de coração. Trabalhei muitos anos aqui, conheço a capacidade da nossa gente. Ver o Brasil finalmente produzindo carros elétricos não é só um marco industrial, é uma vitória de todos que acreditaram.
PERGUNTA – Que mensagem o senhor deixa para o consumidor brasileiro?
CHAMORRO – Que confiem. Que saibam que a GM não veio aqui para brincar. Estamos trazendo tecnologia de ponta, veículos competitivos e a visão de futuro. Queremos que o brasileiro tenha acesso ao que há de mais moderno no mundo automotivo, produzido aqui, por brasileiros.