Governo começa a liberar emendas, mas não consegue evitar derrota no decreto do IOF
Congresso cobra emendas prioritárias para Hugo Motta e Alcolumbre, que ainda não foram liberadas; clima eleitoral atrapalha agenda
BRASÍLIA — O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) começou a liberar emendas parlamentares em meio à crise com o Congresso Nacional, mas não conseguiu frear o projeto que derruba o decreto que aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Até terça-feira, 24, o governo liberou (empenhou, no jargão técnico) R$ 1,7 bilhão em emendas. A maior parte, um total de R$ 1,575 bilhão, foi no Ministério da Saúde para emendas individuais indicadas por deputados e senadores.
As emendas de comissão, que mais interessam aos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), ainda não foram liberadas. O Congresso cobra o pagamento de emendas de anos anteriores que ainda não foram quitadas e ainda definições sobre as verbas aprovadas em 2025.
Na fase de empenho no Orçamento, o governo garante e reserva o dinheiro para a obra e o município que o parlamentar escolheu, dando o primeiro passo para o pagamento efetivo do recurso, que acontece depois. Quando o critério observado é o pagamento efetivo, o Executivo desembolsou R$ 7,6 bilhões em emendas até terça, sendo que R$ 7,2 bilhões dizem respeito a recursos de anos anteriores.
O presidente da Câmara, Hugo Motta, surpreendeu o governo e deputados da base aliada de Lula e pautou um projeto que derruba o decreto do IOF em plena semana de festas juninas. A Câmara aprovou a proposta por 383 votos a 98 e agora o texto segue para o SEnado. O decreto é defendido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para equilibrar as contas e evitar cortes maiores no Orçamento em 2025.
Motta anunciou a pauta pelo X às 23h35 do dia anterior à votação. Na tarde desta quarta-feira, 25, antes da sessão, ele participou do lançamento da federação Solidariedade/PRD, composta por parlamentares que apoiaram a eleição de Lula em 2022 e que se distanciaram do governo.
"Nós precisamos discutir o que nos queremos para o País a partir de agora, já vislumbrando as eleições do ano que vem", disse Motta na coletiva de imprensa da federação. "O momento é de trabalho, o momento é de entrega, o momento é de tratar os temas que o Brasil precisa."
Boa noite!
Nesta quarta-feira, 25 de junho, a pauta da Câmara dos Deputados incluirá os seguintes temas:
1?? PDL do IOF que susta o decreto que aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras.
2?? MP 1291 que autoriza uso de até R$ 15 bi/ano do Fundo Social para habitação popular…
— Hugo Motta (@HugoMottaPB) June 25, 2025
No Congresso, parlamentares pressionam o governo para liberar mais emendas, que ficaram travadas após o atraso na votações do Orçamento e as cobranças feitas pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator de processos que questionam a transparência e a alocação dos recursos indicados por deputados e senadores no Orçamento.
Nos bastidores, congressistas dizem que o pagamento de recursos do ano passado feito até o momento não é suficiente e cobram uma aceleração das emendas aprovadas em 2025, que somam R$ 50 bilhões, consideradas como "dinheiro novo" para os municípios. Além disso, querem a liberação das emendas de comissão, que correspondem a R$ 11,5 bilhões. Até momento, nenhum centavo dessa parcela foi empenhado.
As emendas de comissão são controladas por Motta e Alcolumbre. São eles que organizam a distribuição internamente e definem quais parlamentares serão contemplados. Formalmente, as comissões da Câmara e do Senado assumem a autoria das indicações e dizem para o governo qual cidade e qual obra vai ser receber a verba. O STF determinou que o governo e o Congresso deem transparência e revelam o nome dos congressistas.
O clima eleitoral e as movimentações do xadrez político de 2026 também atrapalham a agenda do governo. Parlamentares da base governistas falam que há uma "insatisfação geral" com o governo no Congresso, independentemente do conteúdo das medidas. A tendência, no momento, é de derrubada do decreto de Lula.
Governo diz que atraso na votação do Orçamento e nova lei afetaram emendas
O governo argumenta que a liberação de emendas foi afetada pelo atraso na votação do Orçamento de 2025, que só foi aprovado em março, e pela lei complementar que mudou as regras após as primeiras decisões do STF e entrou em vigor em novembro do ano passado.
Na quarta-feira, 24, a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República divulgou uma nota afirmando que, nos 50 dias úteis após a sanção do Orçamento, empenhou 1,78% do total de emendas em 2025, mais do que em anos anteriores (0,61% em 2023 e 0,35% em 2024), nesse critério de comparação.
"Mesmo com a diferença nas datas de sanção e a vigência a Lei Complementar nº 210/2024, o ritmo da execução das emendas está sendo mais rápido em 2025, na comparação com os dois últimos anos - 2023 e 2024?, afirmou a pasta, responsável por fazer a articulação política do Palácio do Planalto.
Sobre as emendas de comissão, integrantes do governo argumentam que o Congresso ainda não encaminhou as indicações dos municípios que receberão os recursos aprovados em 2025. Os parlamentares, por outro lado, dizem que falta acordo com o Executivo para combinar esses pagamentos e que as decisões do STF embaralharam as indicações.
"A execução orçamentária de emendas parlamentares segue o estabelecido pelas leis vigentes. Assim, como prevê a LDO e a Lei Complementar (LC) nº 210/2024, tão logo sejam feitas as indicações dos parlamentares e apresentação das propostas pelos beneficiários, o Executivo procederá às analises técnicas e aos empenhos das referidas emendas, respeitando os prazos legais", disse a SRI ao Estadão nesta quarta.
Um dos impasses é a pressão do Congresso para usar o dinheiro das emendas no pagamento de funcionários de prefeituras na área de saúde, conforme o Estadão revelou. A medida contraria o Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério da Saúde e é proibida pela Constituição, mas levou o Legislativo a aprovar uma resolução permitindo o uso das emendas de comissão e de bancada no pagamento de pessoal.
Na sexta-feira, 27, Motta e Alcolumbre devem comparecer a uma audiência convocada por Flávio Dino para discutir as emendas parlamentares no STF. Além de cobrar a liberação de emendas, líderes do Congresso pedem que o governo corte gastos em vez de investir no aumento de impostos para elevar a arrecadação.
O governo, por outro lado, avisou que, se o decreto do IOF for derrubado, vai ser obrigado a congelar mais recursos do Orçamento deste ano, além dos R$ 31,3 bilhões que já estão em contenção, atingindo inclusive as emendas parlamentares.
"O decreto do IOF corrige uma injustiça: combate a evasão de impostos dos mais ricos para equilibrar as contas públicas e garantir os direitos sociais dos trabalhadores", escreveu o ministro Fernando Haddad, também no X, na manhã de quarta.
O decreto do IOF corrige uma injustiça: combate a evasão de impostos dos mais ricos para equilibrar as contas públicas e garantir os direitos sociais dos trabalhadores.
— Fernando Haddad (@Haddad_Fernando) June 25, 2025
"A derrubada dessa medida exigiria novos bloqueios e contingenciamentos no Orçamento, prejudicando programas sociais e investimentos importantes para o país, afetando inclusive a execução das emendas parlamentares", afirmou a ministra da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência, Gleisi Hoffmann, na mesma rede social.