Felipe Camargo quer reconstruir carreira de destaque
A trajetória do Dante de Som & Fúria lembra, em alguns traços, o sinuoso caminho percorrido por Felipe Camargo nos últimos 13 anos. Na história, o diretor de teatro surta e some durante sete anos para, depois, correr atrás da mulher amada e da paixão pelo Teatro.
Já o ator, que protagoniza a minissérie ao lado de Andréa Beltrão e Pedro Paulo Rangel, tentou de várias formas reconquistar um espaço na TV, mas só agora sente que tem nas mãos uma oportunidade de se livrar do estigma deixado pelo passado conturbado, que inclui um casamento tumultuado com a atriz Vera Fischer, que atualmente vive a avoada Chiara de Caminho das Índias. "O Dante marca uma mudança que há tempos eu buscava na carreira. Não sei quanto tempo vai durar essa fase, mas vou aproveitá-la ao máximo", comemora.
Motivos para comemorar não faltam para Felipe. O ator está contratado até 2011 pela Globo e é um dos nomes confirmados para a próxima novela das 19 horas da emissora, Bom Dia, Frankenstein. Mesmo assim, Felipe evita criar expectativas e prefere, como diz, "viver um dia de cada vez". Tudo para evitar frustrações.
"Sempre que planejei demais a minha vida, as coisas não saíram como eu esperava. Agora prefiro deixar tudo acontecer", pondera.
O Dante de Som & Fúria some durante sete anos e depois reaparece tentando recuperar o que perdeu ou deixou para trás. Você sente semelhanças com a sua trajetória profissional, já que a minissérie marca seu retorno ao posto de protagonista na Globo?
A história dele tem alguma coisa a ver comigo sim, mas isso acontece com a maior parte dos personagens que a gente pega na TV. O Dante é um resgate meu. Esse trabalho me recoloca na televisão, depois de muito tempo buscando uma oportunidade de um papel mais expressivo e num produto com visibilidade. E essa é, sem dúvida, a minha situação atual.
Dante é um diretor de teatro, função que você sonhava exercer quando iniciou sua carreira. Isso facilitou seu trabalho de composição?
Dirigi três peças e venho de um teatro de grupo, onde os integrantes participavam de todo o processo. No primeiro espetáculo que fizemos, chegamos a lixar o palco da Casa do Estudante Universitário, que foi o primeiro onde pisei. Sempre tive essa noção da base do teatro desde que comecei. Meu primeiro mestre foi o Carlos Wilson Damião, que era diretor, cenógrafo e figurinista, e fazia seus alunos aprenderem tudo. A experiência me ajudou.
A minissérie é exibida na TV, tem um diretor de cinema e fala sobre o teatro. Foi difícil se adaptar a essa mistura?
Tivemos um bom tempo de preparação e, como é uma obra fechada, conhecíamos toda a história antes de gravar. Gravamos Som & Fúria respeitando a história original e buscando fazer um produto o mais elaborado possível. E ela tem o necessário para isso: um bom diretor, um texto bem feito e um elenco afinado. Seria um problema misturar essas características com um grupo que não conseguisse segurar a onda. Mesclar traços do cinema, do teatro e da TV é um dos grandes trunfos da série.
Seu último trabalho como protagonista na Globo foi há 16 anos. Como você reagiu a esse convite?
Confesso que foi inusitado. O mais bacana é que entrei na emissora em Anos Dourados, que era uma minissérie especial e considerada por muitos da empresa como a melhor deles até hoje. E, agora, esse retorno acontece também em um projeto diferenciado, que conta com mais requinte. Foi um presente tão bom que foi até difícil de acreditar. Quando atendi à ligação do Fernando Meirelles, por um instante, achei que fosse trote.
Você chegou a dizer que perguntou para o Fernando Meirelles se era o último da lista para o papel. Por quê?
Todos sabem que tive problemas e que precisei me tratar. Desde que entrei em recuperação, há 13 anos, busquei oportunidades de papéis com mais peso na Globo e nunca acontecia. De repente chega aquilo que você esperava tanto e fica difícil de acreditar. Quando ouvi que eu era o primeiro a ser procurado para o papel, fiquei sem ação. Surpreso. E, é claro, extremamente agradecido.
Antes de receber o convite, você estava de malas prontas para se mudar para os Estados Unidos. Pensava em abandonar a carreira?
De jeito nenhum! Sou apaixonado por Cinema e, na minha opinião, os melhores filmes do mundo são feitos nos Estados Unidos. E vários atores têm o desejo de trabalhar lá. Eu estava nesse abismo, nessa falta de... Não posso dizer que faltou respeito comigo, mas reconhecimento, sim. Aí,pensei: se for para fazer pontas insignificantes aqui, vou tentar fazer lá fora, porque pelo menos recebo em dólar. Mas isso era fruto de um momento infeliz, de uma angústia e de uma vontade de trabalhar.
Há quanto tempo você estava parado?
Depois de Paixões Proibidas, que acabou em 2007, fiquei praticamente um ano sem trabalhar. Até pintaram convites, mas que eu estava meio cansado porque me estereotipavam de uma certa forma... Apareciam participações que eu já tinha resolvido que não ia mais fazer. E hoje vejo o quanto foi importante eu ter recusado, por mais difícil que tenha sido, porque abriu na hora certa uma oportunidade que eu não esperava e que valeu muito a pena.
Sua carreira começou a desandar depois de problemas pessoais e de um casamento tumultuado com Vera Fischer. Como você avalia hoje esse período?
Conheci a Vera quando gravávamos Mandala, há 22 anos, e não guardo qualquer sentimento ruim dessa relação. Ao contrário, tenho um filho lindo de 16 anos que hoje é meu melhor amigo, que mora comigo há 12 anos. Estou hoje em Som & Fúria também por causa de tudo que eu vivi. Gosto da minha vida, me entrego completamente em tudo que eu faço e tenho uma autenticidade da qual me orgulho. Não tiro nada do que eu vivi. Ninguém tira. Toda essa experiência me ajuda. Lembro de tudo com o maior orgulho, não sou hipócrita. Mas acho que já se aproveitaram muito das minhas fraquezas do passado e das consequências delas.
De que jeito?
Um jornal sai um dia e fala sobre você. Tudo bem, normal. Mas aí, de repente, vem outro, e mais outro... Vira um movimento. Entendo que as pessoas precisam trabalhar e não julgo ninguém. Só não sei se essas coisas influenciaram as pessoas do meio artístico. Acho que cada um sabe se pensou duas vezes antes de me chamar para algum trabalho ou não. O que aconteceu é que deixaram de me escolher para papéis de protagonista, com mais peso.
Você chegou a ficar muito tempo sem trabalho?
Na verdade, sempre trabalhei durante esses anos todos. Fiz cinema, teatro e também TV. Participei de um monte de novelas tanto fora quanto dentro da Globo. Por isso não concordo quando dizem que fiquei na geladeira. Eu trabalhei, recebi ofertas de papéis. Mas não tinha uma grande oportunidade há muitos anos.
Você protagoniza Som & Fúria, está com contrato longo com a Globo e vai fazer 50 anos de idade em 2010. Tem receio dessa fase passar e voltar a enfrentar períodos difíceis no futuro?
Não. Já foi tão inesperada essa chance de entrar em Som & Fúria! Aprendi que todas as vezes que eu faço planos, que crio uma expectativa forte em cima de algum projeto, as coisas não acontecem como espero. Então tento viver cada vez mais o dia de hoje. E não tenho mais receio de passar por períodos ruins porque a gente não sabe mesmo o que vem pela frente. Mas, sinceramente, acho que está mesmo na hora de eu voltar a colher bons frutos na televisão.
Altos e baixos
A carreira de Felipe Camargo decolou logo em sua estreia na TV, como o inocente Marcos da minissérie Anos Dourados. Mas a fase de galã iniciada em 1986 só durou fatídicos sete anos, quando o ator terminou de gravar, como o mocinho João Marcos, a novela Despedida de Solteiro.
"Apareci demais no início da carreira e de menos no decorrer dela", brinca Felipe, ao comentar suas aparições limitadas na televisão. Os problemas se intensificaram quando Felipe estava no ar, na novela Pátria Minha.
Depois de ser afastado do elenco da trama, em 1994, e estrelar A Idade da Loba, na Band, o ator decidiu parar tudo e colocar sua vida no lugar. Se desintoxicou, largou seus vícios e tentou, aos poucos, reconstruir a carreira. "Foi no momento certo. Se não tivesse passado por esse processo, talvez não estivesse vivo hoje", desabafa.
Antes de Som & Fúria, Felipe chegou a experimentar o gosto de ser protagonista na TV. Mas interpretar o herói Alberto de Paixões Proibidas, novela co-produzida pela Band e pela portuguesa RTP, não trouxe grande visibilidade para sua carreira. "Foi um trabalho lindo e me orgulho muito por ter participado. Fez sucesso em Portugal, mas aqui quase ninguém viu", lamenta.
Agenda cheia
Depois que Som & Fúria sair do ar, Felipe garante que mal vai ter tempo para sentir as saudades merecidas. Isso porque já em agosto começam as gravações de Bom Dia, Frankenstein, título provisório da próxima novela das sete da Globo. Na história, o ator interpreta um astrônomo. "Tudo ainda está no início, nem decorei os nomes dos personagens", desconversa.
Além disso, estreia também no mês que vem a peça A Invasora, na qual contracena com Cláudia Jimenez. "Vamos começar no Rio e, depois, devemos viajar por algumas capitais", adianta.
Trajetória televisiva
Anos Dourados (Globo, 1986) - Marcos.
Roda de Fogo (Globo, 1986) - Pedro Garcez.
Mandala (Globo, 1987) - Édipo Junqueira.
O Sexo dos Anjos (Globo, 1989) - Adriano.
Despedida de Solteiro (Globo, 1992) - João Marcos.
Pátria Minha (Globo, 1994) - Inácio Fonseca.
A Idade da Loba (Band, 1995) - Otávio.
Corpo Dourado (Globo, 1998) - Tadeu.
Andando Nas Nuvens (Globo, 1999) - Bob Lacerda.
Um Anjo Caiu do Céu (Globo, 2001) - Josué.
A Padroeira (Globo, 2001) - Frei Tomé.
Senhora do Destino (Globo, 2004) - Edmundo Cantareira.
Alma Gêmea (Globo, 2005) - Dr. Julian.
Filhos do Carnaval (HBO, 2006) - Anesinho.
Cobras & Lagartos (Globo, 2006) - Sidney.
Paixões Proibidas (Band, 2006) - Alberto de Miranda.
Som & Fúria (Globo, 2009) - Dante.