O que é o 'Orun' no Candomblé? Entenda a crença de Preta Gil sobre a vida após a morte
Desde a morte da cantora Preta Gil, muitos amigos e fãs falam de Orun, entenda o que significa para o Candomblé e o que diz a religião sobre o assunto
A morte de Preta Gil, aos 50 anos, no último domingo (20), mobilizou artistas, fãs e familiares em homenagens emocionadas por todo o país. Muitas dessas mensagens ressaltaram a fé marcante da cantora, que sempre expressou com orgulho sua religiosidade ligada ao Candomblé e sua devoção a Nossa Senhora Aparecida. Francisco Gil, seu único filho, compartilhou um comovente texto de despedida acompanhado de imagens dos últimos dias da mãe: "Estenda-se infinito, mãezinha. A gente que é de axé sabe que a morte não é um fim", escreveu.
Essa percepção espiritual da morte esteve presente em diversas homenagens. O Babalorixá Célio D'Omolu, que orientava Preta em sua caminhada religiosa, fez um tributo carregado de emoção: "Você trouxe tanta alegria para o meu coração e hoje eu choro, já sentindo sua falta… Tenho certeza que você descansa em um bom lugar, no colo de nossa Mãe Oxum." Artistas como Lázaro Ramos, Flávia Oliveira, Erika Hilton e Teresa Cristina também se referiram ao Orun — plano espiritual na cosmologia iorubá — em suas mensagens de adeus.
Oxum, divindade à qual Preta era ligada e cuja imagem ela carregava tatuada no corpo, representa, segundo a tradição iorubá, a energia do amor, da fertilidade e da beleza. "Na cosmologia adotada pelo Candomblé, a existência se divide entre o Ayé, o mundo material, e o Orun, a dimensão espiritual", explica Daniel Pereira, babalorixá e pesquisador. Ele acrescenta que o Orun abriga Olorun, os orixás e os ancestrais, e que não é um único lugar, mas um conjunto de nove camadas espirituais.
No entendimento do Candomblé, a morte é vista como uma passagem, e não como um fim absoluto. "O espírito retorna ao Orun e pode, em certos casos, reencarnar, muitas vezes na mesma linhagem", afirma Daniel. Diferente da visão cristã, não há ruptura na jornada espiritual, mas continuidade. Os ancestrais seguem presentes, orientando os vivos, e é essa visão de eternidade e pertencimento que permeia as homenagens à cantora, cuja espiritualidade foi tão forte quanto sua arte.