Fernanda Nobre sobre relacionamento aberto: 'É um ato político, não porque quero uma vida louca'
A atriz tem um relacionamento de 12 anos com o marido, o diretor José Roberto Jardim, e acaba de lançar a plataforma Manifesto Feminino
Fernanda Nobre reflete sobre não-monogamia como ato político ligado ao feminismo, destaca a criação da plataforma Manifesto Feminino para debater temas como relacionamentos e sexualidade feminina, e compartilha sua jornada de autoconhecimento e empoderamento.
Quando surge um debate sobre não-monogamia e relacionamentos abertos, é comum o pensamento de que a escolha aconteça por mais liberdade e experiências sexuais e amorosas. Pode ser o caso de alguns, mas não foi o de Fernanda Nobre. A atriz tem um relacionamento de 12 anos com o diretor José Roberto Jardim. Em 2020, eles optaram pela não-monogamia, após ela passar anos estudando o feminismo.
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"Comecei a olhar para a monogamia porque olhei para o feminismo. Entendi que criaram a monogamia para nos controlar, para controlar nossa sexualidade e para controlar a reprodução. Não tem nada a ver com amor. É uma estratégia muito sutil e muito inteligente para a gente achar que está fazendo isso por amor. E, não, honestidade é a gente olhar para a nossa sexualidade, olhar para os pactos como eles são e ter uma equidade de gênero e de comportamento. Então, comecei a questionar a monogamia por causa do feminismo. É muito mais um ato político do que porque eu quero viver uma vida muito louca sexualmente", conta Fernanda em entrevista ao Terra.
A atriz analisa que o cenário em torno da não-monogamia já mudou muito nos poucos anos desde que ela passou a falar sobre o assunto publicamente. "Os homens estão usando esse discurso para justificar a vontade deles de não se comprometer em relacionamentos. Aí, as mulheres ficam achando que são caretas porque são monogâmicas, porque têm ciúmes. Não tem nada a ver com isso. Elas podem escolher a monogamia, desde que isso seja uma escolha, não uma imposição. Agora, já está virando outra imposição para o bem-estar masculino."
"O que a gente tá vendo muito são homens dizendo que começariam uma relação com uma mulher, mas só vão topar essa relação se ela for não-monogâmica, se ela for aberta. E dane-se se a mulher está pronta para isso ou não. A não-monogamia é um ato político, não é uma exploração sexual", completa Fernanda.
A artista explica que essa e outras transformações sobre como ela enxerga a própria vida e o mundo começaram há mais de dez anos, quando ela passou a se dedicar sobre o estudo do feminismo. Essa vontade de se aprofundar nos dilemas vividos por mulheres surgiu após se sentir tocada pela #PrimeiroAssédio, quando mulheres, anônimas e famosas, compartilharam relatos das primeiras vezes que foram assediadas nas redes sociais.
"Quando comecei a ler os depoimentos, vi que fui muito assediada e normalizei todos eles. Sou vítima disso. Ali, comecei a entender que o que eu estava vivendo em relacionamentos amorosos e de amizade, que algumas relações eram tóxicas, outras abusivas, e estava normalizando. Foi o meu grande despertar. O feminismo me contaminou completamente. Ele é o que eu sou. Não consigo mais ver o mundo com outros óculos."
Fernanda diz que o feminismo a libertou, lhe deu autoestima e também a fez perceber quais eram seus verdadeiros desejos. Além disso, após anos de estudo, ela concluiu um mestrado com base em teorias feministas. Agora, a artista quer passar esse conhecimento e debater esses assuntos com outras mulheres. Por isso, lançou a plataforma Manifesto Feminino.
"Acredito muito que a teoria pode ser usada para abrir a cabeça e expandir conhecimento", diz Fernanda. Ela explica que a plataforma terá cursos sobre temas como relacionamentos abusivos e tóxicos, pressão estética, amor romântico, monogamia e sexualidade feminina e também promoverá encontros a cada duas semanas, nos quais ela debaterá sobre esses e outros temas com as participantes e se aprofundará nos conteúdos. "Quero trazer o feminismo para o dia a dia. A minha pesquisa é para identificar quais são as estratégias que o patriarcado usa para nos manter funcionais para ele", define.
Além de disseminar conhecimento, Fernanda Nobre também defende a importância de mulheres se reunirem e conversarem sobre os próprios dilemas e vivências. Ela defende que uma mulher pode ajudar a outra e lembra que a escritora Fernanda Young foi uma das pessoas que mais a apoiou.
"Ela faleceu quando a gente estava muito próxima, fazendo um espetáculo juntas. A gente ia estrear em sete dias. Ela foi um divisor de águas para mim. Muita da minha força de falar o que eu já estava estudando, de propagar para o mundo, foi ela que me deu. Fui muito validada por ela, é uma mulher que admiro muito. Ela foi um antes e depois na minha vida", recorda.
Há cinco anos, quando começou a falar sobre assuntos relacionados ao feminismo, à não-monogamia e a se posicionar mais, a atriz lembra que sofreu medo de ser prejudicada profissionalmente. "Fiquei com medo, mas também não queria parar. O feminismo me fez perceber que muito do que eu fui e do que fiz foi para ser aceita, para caber no trabalho, no meu corpo, no amor. Não quero mais caber, quero me libertar disso. Se for também para me atrapalhar, me atrapalhe, mas vai atrapalhar porque eu fiz, não porque eu não fiz. Estava cansada de tentar fazer tudo muito certo."
Mesmo se posicionando, a atriz continuou trabalhando ativamente. No momento, ela está em turnê pelo Brasil com a peça Três Mulheres Altas, se apresentando em uma cidade diferente a cada final de semana, e também não esconde o desejo de voltar para as novelas.
"Comecei a trabalhar com oito anos de idade e nunca parei. São trinta e quatro anos e não teve um ano da minha vida em que eu não estivesse em um set de filmagem ou no palco. Não sei quem eu sou se não for atriz. Não tenho nem lembrança de mim sem ser relacionada a um trabalho. Amo fazer novela. É cansativo para caramba, é um trabalho exaustivo, mas eu amo. Chego em um set e sinto que é o meu lugar. Sinto muita vontade de voltar", diz a atriz, que também pretende continuar com outros trabalhos. "Estou muito feliz de ter encontrado o feminismo e ter encontrado esse lugar de comunicadora. É uma coisa completamente nova para mim e estou sentindo um propósito", conclui.
